Eleições.Um queijo suíço chamado União Europeia

Eleições.Um queijo suíço chamado União Europeia


Portugal vai a votos no próximo domingo para eleger 21 eurodeputados. Mas o que fazem e de que maneira podem defender os interesses nacionais? E quais são os grandes desafios que ameaçam a unidade da UE?


Burocratas talvez seja a designação, injusta ou justamente, mais comum para os eurodeputados. Quem não se lembra das famosas deliberações que obrigavam os países a terem todos a mesma medida de preservativo; que as receitas tradicionais tinham de se sujeitar às novas regras higiénicas, quando muitos deles assobiavam para o ar no que dizia respeito às deles; até às famosas proibições de se fumar ou não em locais ao ar livre.

Mas talvez a reunião mensal em Estrasburgo, onde está sediado o Parlamento Europeu, seja a cereja em cima do bolo para os detratores dos trabalhos dos eurodeputados: por ano, gastam-se mais de 100 milhões de euros só a transportar caixotes de Bruxelas para Estrasburgo, e muitos deles nem sequer são abertos. “Os caixotes são carregados nos camiões e levados de Bruxelas para Estrasburgo. Isso são factos”, confirmou recentemente em entrevista ao Nascer do SOL o antigo eurodeputado irlandês Pat Cox, presidente do Parlamento Europeu entre 2002 e 2004. “No exterior de cada gabinete é colocado um caixote onde cada um põe os documentos que quer levar”. “Quando eu era eurodeputado, sentava-me com as pessoas que trabalhavam comigo e víamos do que é que íamos precisar”, continua Cox. “Depois disso não tínhamos de nos preocupar mais porque era tudo reunido e entregue à porta do gabinete em Estrasburgo. Assim que chegávamos a Estrasburgo – com todas as ineficiências e perdas de tempo provocadas pela mudança de um sítio para o outro – esvaziávamos a caixa e tínhamos tudo o que precisávamos para trabalhar”, disse ainda (Págs. 14-15).

80 por cento das leis são de Bruxelas

Folclore à parte, o trabalho dos deputados eleitos por cada país tem muita influência no dia-a-dia dos seus cidadãos, já que 80% da legislação nacional tem origem no Parlamento Europeu. “É verdade que nem todas são por via direta, já que a lei europeia indica que pode ser por via de regulamento ou por via de diretiva. A diferença é que se for através de regulamento entra automaticamente em vigor e é igual para todos os países, já a diretiva obriga a um ato de transposição, ou seja, à adaptação à realidade nacional. Muitas pessoas conhecem a transposição da diretiva e não a diretiva inicial, mas a verdade é que aquele ato legislativo só existe porque houve uma diretiva. Isto dá uma ideia da importância do Parlamento Europeu e do Conselho Europeu”, como revela ao i Carlos Coelho, eurodeputado do PSD.

Numa altura em que a União Europeia tem mais 10 países a bater à porta para entrarem, os desafios dos novos eurodeputados serão mais do que muitos. No campo militar a grande discussão será a criação de um exército europeu, pois se a Rússia ganhar a guerra na Ucrânia e se Donald Trump for eleito, de novo, Presidente dos Estados Unidos da América, a Europa ficará cada vez mais entregue a si mesma.

O mesmo se passa com o problema da imigração. Sendo um continente envelhecido e a necessitar de mão-de-obra urgentemente, a questão que se coloca é se se deve abrir as portas a todos – provocando o caos nalgumas cidades ou países – ou quem quer uma imigração controlada, havendo mesmo países que querem o regresso das fronteiras para ‘travar’ uma imigração descontrolada, com muitos migrantes a não se integrarem de uma forma plena, querendo impor a sua cultura islâmica aos europeus.

Meloni a nova líder da direita

E é à direita e à extrema-direita que o fenómeno da imigração dá mais votos, notando-se agora uma divisão entre os aliados de Meloni, a primeira-ministra italiana, e os partidários dos alemães do AfD. Muito do que irá ser resolvido em Bruxelas, e em Estrasburgo, passará pelas ‘guerras’ entre estas duas famílias, já divididas pela invasão russa da Ucrânia. Enquanto Meloni se coloca ao lado de Zelensky, a ala mais radical quer o fim do envio de material militar para a Ucrânia e nem quer ouvir falar de tropas europeias em solo ucraniano. Também o conflito no Médio_Oriente promete fazer correr muita tinta e muita vozearia no Parlamento Europeu.

Já se percebeu que o equilíbrio familiar nem sempre é fácil e a questão do ambiente é outra matéria que divide, e muito, a rapaziada com assento na União Europeia. Portugal, apesar de ser um pequeno país, tem tido representantes em altos cargos comunitários, destacando-se, obviamente, Durão Barroso que foi presidente da Comissão Europeia durante 10 anos. Agora fala-se em António_Costa para altos cargos em Bruxelas…

Mas o que vão conseguir fazer os 21 eurodeputados portugueses a bem de Portugal, quando estão em famílias tão distintas e com interesses tão diversos? “Neste momento não me sento ao lado dos portugueses, sento-me por ordem alfabética ao lado dos outros deputados da minha família política. Num lado tenho uma francesa, no outro uma irlandesa. Qual é a nossa intenção? Tentar que o interesse da minha família política, ou pelo menos grande parte das delegações nacionais da minha família política, concordem com uma matéria que seja importante para Portugal, e em última instância tenho de negociar. Isto é, se houver uma coisa que só interesse para Portugal e não tem interesse para os outros, tenho de negociar e dizer que vou votar a favor de uma coisa que lhes interessa em troca do apoio deles a uma matéria que para mim é relevante”, explica Carlos Coelho. E são estes os desafios que Sebastião Bugalho e Marta Temido, entre outros, irão enfrentar. Certo é que voltarão a Portugal com uma carteira mais recheada e com muitas experiências que serão proveitosas no futuro.

E quem não sabe falar outra língua que não a portuguesa? Não tem problema, não faltam intérpretes que os ajudarão a ultrapassar as barreiras linguísticas. Afinal, a mais fácil de todas, não fossem os portugueses um povo desenrascado.