Francisco Paupério
Livre
A UE deve preparar-se para uma eventual guerra na Europa, nomeadamente através da constituição de um exército europeu?
O LIVRE defende que a UE deve ter uma Política de Segurança Comum, e que a eventual constituição de um exército europeu é um elemento de uma potencial Política nesse sentido. O próximo mandato do Parlamento Europeu é o período certo para discutir qual a orgânica e objetivos desta política comum, de forma a definir políticas conjuntas, nomeadamente na compra conjunta de equipamento de defesa. Somente quando definido o que a União quer de uma Política de Defesa Comum poderemos discutir como a concretizar, designadamente a formação de um exército europeu. Entretanto, a curto trecho existem questões relevantes a resolver antes desse passo. Por exemplo, as dificuldades de interoperabilidade de material de defesa dos vários Estados Membros e a ausência de investimento conjunto nesta área, o que coloca obstruções práticas e imediatas.Tendo presente estes problemas, os Verdes Europeus votaram a favor do regulamento do EDIRPA, um instrumento para a contratação pública coletiva para na indústria de defesa, um passo na construção da Política Comum.
O Almirante Gouveia e Melo defendeu que a tropa portuguesa se deve preparar para combater num eventual conflito europeu. Pertencendo Portugal à NATO não acha que isso é inevitável?
Os atuais desafios geopolíticos, como a guerra na Europa iniciada pela Rússia, colocam-nos questões que julgávamos ultrapassadas. O LIVRE é um partido pacifista e humanista que defende a prevenção dos conflitos armados e o total respeito pelo Direito Internacional. Estamos, contudo, perante um ataque de grande escala e multi-sectorial à democracia europeia e à paz no nosso continente. Apelamos, junto do Governo Português, da UE e da ONU, ao fomento de um cessar-fogo imediato, a retirada das tropas russas da Ucrânia e o resumo de negociações diplomáticas quando e como a Ucrânia entender. Não consideramos o envio de tropas portuguesas para a Ucrânia, decisão que pode contribuir para a escalada do conflito. Orgulhamo-nos do papel que as forças armadas portuguesas têm nas várias missões de paz em que participam e defendemos a sua valorização e o reforço da disponibilização dos recursos necessários ao cumprimento do seu papel.
Qual acha que deve ser a posição da Europa em relação a Israel? Pensa que Portugal deve respeitar a decisão do TPI em relação aos ‘atores políticos’ considerados responsáveis por crimes de guerra?
O LIVRE apela ao cessar-fogo imediato sobre a Palestina. Defendemos o direito à autodeterminação do povo palestiniano e à solução de dois estados – Israel e Palestina – de acordo com as fronteiras definidas em 1967 pelas Nações Unidas. O LIVRE defende que Portugal se devia juntar a outros países, incluindo europeus, no reconhecimento da Palestina enquanto estado independente. Apelamos ao fim da política de colonatos que persiste na Cisjordânia e à investigação do TPI sobre o desrespeito pelo direito internacional humanitário e pelos Direitos Humanos do povo palestiniano em Gaza.
É possível defender realmente os interesses de um país pequeno como Portugal perante gigantes como a França e a Alemanha?
Sim. A união Europeia não é uma soma de Estados mas um projecto de cooperação, solidariedade, progresso e paz. A ideia de que a Europa é feita de grandes e pequenos países não corresponde à evolução do projeto europeu onde a livre circulação de pessoas, bens e serviços dilui fronteiras e alarga as economias nacionais a um conjunto europeu. Contudo, sabemos que existem assimetrias significativas e uma influência maior do centro da europa em relação, sobretudo, aos países periféricos do sul e leste da União. Neste sentido, o LIVRE defende a revisão das regras orçamentais, à luz do que aconteceu durante a pandemia. A coesão entre países da UE não pode estar em causa pelos critérios de Maastricht, que põem as economias do sul e leste da Europa sob constantes ameaças de procedimentos por défice excessivo.
A burocracia de Bruxelas não pode ser exasperante?
Penso claramente que sim. Primeiro, o facto de as políticas da UE, nomeadamente a nível legal, exigirem o consenso e a coordenação entre várias instituições, muitas vezes em desacordo (ex. Parlamento Europeu vs Conselho Europeu). Além disso, o Parlamento Europeu, o Conselho Europeu, a Comissão Europeia têm organizações, requisitos e métodos de trabalho diferentes, o que complica ainda mais um funcionamento eficiente e harmonioso. Adicionalmente, o facto de muitas matérias exigirem unanimidade, ou maiorias exigentes, torna-se um trabalho pesado face a Estados-Membros que, muitas vezes, se encontram desviados ou contra questões-base da UE (ex. caso da Hungria). Isto leva a rondas de negociação muito, muito longas, e trabalhos redobrados.
Sente que há muito desperdício de dinheiro em Bruxelas?
São de facto onerosas, de forma desnecessária, as deslocações do Parlamento Europeu a Estrasburgo, por exemplo. Toda a complexidade institucional também eleva os custos – o exemplo maior disso é a sobreposição de algumas comissões em relação a certos tópicos. E levantam-se também dúvidas sobre a necessidade/proporcionalidade de muitas ajudas de custo face ao que é necessário. No entanto, também é verdade que a União Europeia alberga 27 Estados-Membros e precisa de ter todos os países devidamente representados, quando simultaneamente precisa de ter uma estrutura alargada de pessoal para várias áreas e objetivos da União. A eficiência do uso do dinheiro deve passar pela fiscalização da aplicação desse mesmo dinheiro: se os valores são ajustados; se o dinheiro é realmente alocado aos setores previstos; as respetivas fontes do dinheiro; etc. E, poderemos, sim, apostar em: simplificação das estruturas da União, para tornar os gastos mais eficientes; mecanismos de controlo e transparência mais reforçados; avaliação mais rigorosa de projetos da UE; e, acima de tudo, também de um ponto de vista ambiental, reduzir os deslocamentos desnecessários ao máximo.
Com que regularidade pensa viajar para Portugal?
O mandato no Parlamento Europeu exigirá muito trabalho em Portugal, ou seja, conto estar no país com frequência e de modo compatível com o desenvolvimento do trabalho do LIVRE e dos verdes europeus no Parlamento Europeu.
Quais foram, no seu entender, os maiores erros cometidos pela UE no último mandato? E quais as maiores conquistas?
O Pacto da Migração e Asilo foi um dos maiores erros cometidos pela União no último mandato. O LIVRE defende a revisão do actual Pacto da Migração e Asilo e lutaremos pela criação de um Sistema Comum de Asilo humanista, assim como, a revisão alargada das políticas de migração e asilo da UE para o respeito integral dos direitos humanos. Defendemos que a UE deve garantir canais humanitários seguros e legais para as pessoas migrantes e refugiadas. As fronteiras da União não devem ser externalizadas, tornando-nos dependentes de regimes autocráticos e colocando um preço na vida humana. Também a integração de pessoas migrantes e refugiadas não tem sido uma prioridade da UE. O poder local deve ser valorizado na gestão, acolhimento e integração das pessoas que chegam aos Estados-Membros à procura de uma vida melhor. A UE deve criar linhas de apoio para garantir a criação de condições dignas de vida, trabalho e desenvolvimento pessoal e comunitário. Por fim, como não somos indiferentes às mortes no mediterrâneo e ao papel das redes de tráfico na exploração de pessoas e de canais ilegais de emigração, defendemos a descriminalização das missões de salvamento no Mediterrâneo. A Europa não é uma fortaleza, é um espaço de paz, solidariedade e cooperação.
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