O ninho da águia. Recordações de uma pequena vizinha de Hitler


A águia fez o ninho nos Alpes acima de Berchtesgaden, cidade bávara onde a pequena Irmgard vivia com os pais. Isabel Pedrome leu o livro onde ela fala com candura de como foi passar a guerra na vizinhança da cúpula nazi  Em 2014 completam-se 75 anos sobre o início da Segunda Guerra Mundial, o que…


A águia fez o ninho nos Alpes acima de Berchtesgaden, cidade bávara onde a pequena Irmgard vivia com os pais. Isabel Pedrome leu o livro onde ela fala com candura de como foi passar a guerra na vizinhança da cúpula nazi 

Em 2014 completam-se 75 anos sobre o início da Segunda Guerra Mundial, o que significa que as pessoas ainda vivas que conheceram os acontecimentos em primeira mão já podem falar do que viram invocando descomprometimento. É o que torna tão interessante este livro de memórias.

Irmgard A. Hunt nasceu no extremo sul da Alemanha, em Berchtesgaden, a cidade mais próxima do famoso Ninho de Águia, o mais conhecido dos abrigos de Hitler e da cúpula nazi durante a guerra e nos anos imediatamente anteriores. A pequena cidade fica junto da Áustria, praticamente sobre a fronteira que Hitler haveria de suprimir por meia dúzia de anos, entre outras coisas facilitando os contactos entre familiares separados por obstáculos administrativos transformados em distância afectiva. É também desses pormenores não documentados da vida diária que se fala “Na Montanha de Hitler”.

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De acordo com vários testemunhos de peso do gabinete de Churchill, o Ninho da Águia só não foi bombardeado porque os Aliados preferiam que Hitler não fosse substituído por alguém realmente competente.

Verdade ou não, Irmgard beneficia de um ponto de observação relativamente tranquilo para quem viveu os anos mais críticos da guerra tão perto do poder. Apesar da recordação dos alertas de bombardeamento, as ruínas vislumbradas ao longo das viagens atribuladas de comboio para visitar os avós surpreendem- -na como coisa desconhecida no refúgio idílico do chefe adorado.

Depois da infância na Alemanha nazi, Irmgard acabou por se instalar nos Estados Unidos, onde estudou e viveu a vida adulta. Haverá presente mais desculpabilizante e que melhor explique o tom franco da criança que fala do seu sinistro passado nazi? Afinal não teve as vantagens de uma educação americana privilegiada, o que talvez explique tudo: até que tenha sido membro do Kindergruppe, o sinistro prelúdio à Juventude Hitleriana, para crianças menores de dez anos. Enfim, não passava de uma pobre alemã, filha de pais pouco iluminados.

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A nós interessa-nos tudo isto, mas interessam-nos sobretudo os pormenores do dia-a-dia numa cidadezinha que seria típica se tal coisa existisse em tempo de guerra: as bichas para comprar peixe, carne, pão, a hostilidade do Partido Nazi tanto à Igreja Católica como à Igreja Luterana, a personalidade do pequeno Albert Speer, filho do arquitecto e ministro do Führer, um rapaz modesto que ia para a escola de Mercedes como motorista e andou na mesma turma que Irmgard, ou a maneira como as crianças se entretinham nos abrigos durante os ataques aéreos.

Uma perspectiva invulgar no mercado já saturado das memórias de guerra.