CDS quer voltar a ser o partido de quadros

CDS quer voltar a ser o partido de quadros


Monteiro e Portas foram o primeiro passo. Nuno Melo quer mostrar ao país que o CDS ainda tem capacidade para ser conhecido no país como sempre foi: ‘Um partido de quadros’.


por Joana Mourão Carvalho e Raquel Abecasis

O almoço desta semana que juntou à mesma mesa Manuel Monteiro e Paulo Portas, ao fim de vinte e cinco anos de desavença, foi um marco com que o CDS quis assinalar uma nova era no partido.

Consciente de que os próximos meses serão vitais para garantir a sobrevivência do partido na cena política portuguesa, Nuno Melo apostou tudo na unidade dos centristas e o primeiro passo não poderia deixar de ser colocar lado a lado os dois ex-líderes que melhores resultados deram ao partido, numa ação que pudesse entusiasmar os quadros com que o partido sempre se afirmou. Apesar de fechado à comunicação social, o Nascer do SOL sabe que ao almoço no IDL compareceram muitas caras do passado mais longínquo e mais recente do partido. Caras que há muito não participavam em atividades do partido, mas que desta vez consideraram que era o momento para voltarem a dar a cara. Portas falou  aos comensais da globalização e da era digital, mas à mesa falou-se e muito de como fazer renascer o partido. Nalguns pontos houve unanimidade: «É preciso fazer notar a falta que o CDS faz no Parlamento, sobretudo numa altura em que as polémicas se sucedem na Assembleia» e «a nossa diferença tem que ser, como sempre foi a oferta de um partido de quadros».

Conseguido o objetivo de mostrar o partido unido e mobilizado, a máquina centrista já tem definidos os próximos passos. O conselho estratégico do partido está a trabalhar a todo o vapor, com um conjunto de nomes que aposta tudo no renascimento do CDS. Este é um órgão estatutário do partido a que se juntaram recentemente nomes independentes, como José Theotónio (CEO do Grupo Pestana), João Pedro Tavares (Presidente da ACEGE), Alexandre Lucena e Vale (ex-administrador do BPI),  ou o médico João Queiroz e Melo. São alguns nomes que decidiram recentemente juntar-se a outros, militantes do partido, por considerarem que «é fundamental não deixar morrer o CDS».

No calendário próximo dos centristas está também a apresentação de um novo programa do partido. É uma tarefa que está entregue a António Lobo Xavier e que está já numa fase avançada. A ideia é atualizar o programa do partido à luz dos tempos e das exigências modernas.

Nuno Melo quer o trabalho de casa feito até ao final do Verão. É que as eleições na Madeira são um momento ideal para uma primeira prova de vida do partido, que concorre coligado com o PSD_e espera alcançar uma maioria absoluta no Governo Regional, garantindo uma posição de destaque na administração da região autónoma. Depois disso, o partido quer estar preparado para todas as eventualidades, mas claramente começa a encarar um cenário de eleições antecipadas.

Um congresso refundador do CDS deverá ocorrer entre as eleições da Madeira e o final do ano e a direção centrista espera que esse seja o momento de arranque para um rumo novo. A aposta, ao que apurámos, é mostrar ao país um partido revigorado, unido e com a marca de sempre: «partido de quadros».

 

De companheiros a rivais

De costas voltadas há mais de duas décadas, Manuel Monteiro e Paulo Portas deram sinais de querer colocar uma pedra sobre as divergências passadas e deixar para trás o que está para trás em nome da sobrevivência do partido. A rutura, política e pessoal, aconteceu no congresso de 1998, do qual Paulo Portas saiu presidente do CDS-PP. Mas antes das ambições pessoais ditarem o seu afastamento, em tempos, os dois homens estiveram juntos e juntos lutaram pelo mesmo projeto político para o partido.

Nascidos no mesmo ano (1962) e separados apenas por cinco meses, os seus caminhos cruzaram-se pela primeira vez no curso de Direito da Universidade Católica Portuguesa, quando já respiravam os ares da militância partidária. Paulo Portas deu os seus primeiros passos na vida política aos 13 anos, quando se inscreveu na Juventude Social-Democrata (JSD), em 1975. Anos mais tarde, em 1979, chegou mesmo a aderir ao PSD e ainda disputou a liderança da Comissão Política Distrital de Lisboa da JSD, mas acabou por abandonar as duas estruturas em 1982. Já Manuel Monteiro, iniciou-se na política quando ainda estudava no Liceu Passos Manuel, em Lisboa, altura em que aderiu à então denominada Juventude Centrista – o nome Juventude Popular (JP) só foi adotado em 1998, sob a presidência de Pedro Mota Soares –, estrutura onde chegou a presidente em 1986.

Com apenas 29 anos, Monteiro assumiu-se como protagonista de uma linha de rutura e de renovação no CDS, após, em 1991, o partido ter tido o seu pior resultado de sempre até àquela data, ficando conhecido como o ‘partido do táxi’ nas legislativas que deram a segunda maioria absoluta ao PSD de Cavaco Silva. É então, em março de 1992, apoiado por Adriano Moreira e Nuno Krus Abecasis, que se apresenta como rosto do projeto de refundação do partido que ganhou o congresso realizado em Lisboa e no qual derrotou Basílio Horta, candidato da ala de Freitas do Amaral e que representava uma linha de continuidade num partido que estava em vias de desaparecer, com apenas quatro deputados na Assembleia da República e quatro por cento dos votos.

Com Monteiro estavam vários elementos que tinham feito com ele um percurso comum na Juventude Centrista, como Jorge Ferreira, Gonçalo Ribeiro da Costa, Luís Nobre Guedes e Luís Queiró, que ficaram conhecidos como ‘o grupo do Altis’, numa referência ao nome do hotel da capital onde se realizou o congresso desse ano.

No entanto, havia um sexto elemento que ainda nem sequer era militante do partido, mas que esteve presente no momento em que Monteiro ascendeu a líder: Paulo Portas, que ficou para esta história como o grande ideólogo e estratega do novo CDS, ao qual, em 1993, é aposto o PP, de Partido Popular, apesar de muitos atribuírem a sigla às iniciais de Paulo Portas. Na altura, era um dos estrategas mais próximos da liderança de Manuel Monteiro, apoiando-o na revisão da orientação política do CDS e dirigia O Independente, semanário que tinha como acionista maioritário Nobre Guedes e que levava o partido ao colo atacando o cavaquismo.

Só em 1995, quando Monteiro já levava três anos de liderança, é que Portas abandona a direção d’O Independente, pondo fim ao jornalismo e abraçando a carreira política. É nas legislativas desse ano que sai da sombra e é incluído nas listas do CDS-PP como cabeça de lista pelo círculo de Aveiro, sendo eleito deputado à Assembleia da República num grupo parlamentar que triplicava a anterior bancada, depois dos esforços para revigorar o partido que o cavaquismo reduzira quase à insignificância.

Contudo, é em 1996 que tudo parece começar a ruir. Nessa ano, Portas candidata-se internamente a líder da bancada parlamentar centrista. Eram 15 deputados no total e fizeram votação secreta no gabinete. O resultado? Uma divisão clara: 7 votos a favor de Portas, 7 em branco (da ala de Monteiro) e uma abstenção. O momento ficou eternizado com a imagem de Monteiro de caneta na mão, mesmo depois de, como se sabia, ter votado em branco. Portas dá então uma conferência de imprensa onde acusa o presidente do partido de ter dado o «golpe da caneta» – a verdade é que nessa conferência de imprensa estavam oito deputados (incluindo Portas) e ele só conseguira sete votos.

 A não eleição como líder parlamentar devido ao peso dos votos em branco levou a que saíssem do Parlamento o próprio Portas, Nobre Guedes, Moura Guedes, Lobo Xavier e Manuel Carvalho da Silva. Meses depois, o CDS-PP tem uma derrota eleitoral com apenas cinco por cento de votos nas autárquicas, o que precipita uma crise de liderança. Portas e Nobre Guedes indicam a porta de saída a Monteiro, que acabaria por se demitir em 1997, dada a tensão interna. Portas viria a ser eleito presidente do partido em 1998, no congresso de Braga, derrotando Maria José Nogueira Pinto e a linha monteirista e abrindo um conflito que só agora parece começar a ficar sanado.