Belmiro de Azevedo era um dos homens mais ricos de Portugal, deixando uma fortuna avaliada em dois mil milhões de dólares (cerca de 1,6 mil milhões de euros). Foi um nome constante na lista dos mais ricos da “Forbes”, lista essa publicada anualmente. Foi o rosto responsável por ter criado um verdadeiro império, do retalho às telecomunicações, passando pelo imobiliário. Ao ponto de o universo Sonae se confundir com o seu próprio percurso.
Mas ao contrário do que se possa pensar, nem sempre teve sucesso em todos os projetos em que apostava e era o primeiro a reconhecer isso. “Diz–se que sou demasiado perfecionista, que a Sonae ganha em tudo o que se mete. Não é assim.” Mas também deu uma explicação: “Somos um grupo muito diversificado e, ao diversificar, necessariamente corremos riscos.”
Entrou para a Sonae no final da década de 1960 e assumiu o controlo da empresa em 1974 – uma empresa de pequenas dimensões e com dificuldades económicas e financeiras que fabricava laminados decorativos. A sua primeira tarefa, como recordou nos 50 anos da Sonae, foi destruir o que estava feito para voltar a construir. E foi aí que tudo começou.
O maior crescimento veio a ocorrer no pós-25 de Abril, com várias aquisições. É o caso da Siaf e da Paivopan, em Portugal, e da Spanboard, na Irlanda do Norte, já nos anos 80. As compras continuaram. Nos anos 90 veio a aquisição da espanhola Tafisa e da alemã Glunz.
Também o negócio foi ganhando novas dimensões com as apostas no mercado português. Em 1985 abriu o primeiro Continente em Matosinhos, o que veio revolucionar o mercado de retalho como até aqui existia. O primeiro hipermercado do país fechou as portas no dia de estreia, à meia-noite, com as prateleiras vazias.
E os números falam por si. As cinco mil pessoas que visitavam o hipermercado gastavam em média 10 contos (50 euros) e, diariamente, a loja de Matosinhos vendia mais de 300 aparelhos de vídeo e 500 bicicletas, mas, ao fim de semana, o açúcar (com a venda de 36 toneladas) e as garrafas de Martini (duas mil caixas de garrafas) eram os produtos mais procurados.
Maior grupo empresarial Belmiro não quis ficar por aqui. Hoje em dia, a marca conta com mais de 200 lojas e há uma aposta forte no mercado internacional, com destaque para a joint venture com a francesa Premodès. Feitas as contas, a área de retalho representa mais de metade do volume de negócios do grupo.
Em 1988 lançou uma empresa para as tecnologias da informação, a que se seguiu a Sonae Imobiliária no ano seguinte e o jornal “Público”, já em 1990. Foram os primeiros passos de um percurso que permite à Sonae apresentar-se como “o maior grupo empresarial e o maior empregador privado português”.
O império criado por Belmiro de Azevedo está em 90 países e inclui várias empresas, entre as quais a Sonae MC, que detém as atividades de retalho alimentar, saúde e bem-estar, áreas onde opera através do Continente e da Well’s, por exemplo.
A ramificação dos negócios da Sonae, detidos a 100% pelo grupo, estende-se também à Sonae Sports & Fashion – onde detém insígnias como Sport Zone, Zippy e Salva –, à Worten e à Sonae RP, que detém os ativos de imobiliário de retalho.
As telecomunicações também foram uma aposta forte do grupo, que deu os primeiros passos nesta área em 1998 com o lançamento da Optimus, um projeto que contou com a liderança do seu filho Paulo Azevedo. Agora é a NOS (ver texto ao lado).
Derrotas
O percurso do homem forte da Sonae não é conhecido apenas pelos sucessos. A par da derrota da OPA à Portugal Telecom, também no seu currículo ficou a presença fracassada no Brasil. A entrada no mercado de distribuição brasileiro arrancou em 1989 com a compra de parte da CRD (da qual viria a assumir o controlo) e vendida mais tarde, em 2005, parte ao Carrefour e o maior número de lojas à Wal- mart, gigantes deste setor, por mais de 600 milhões de euros. Acabou mais tarde por apostar novamente neste país, detendo alguns centros comerciais e investindo no setor tecnológico.
Também perdeu a Portucel. Apesar de ter ganhado dinheiro com o negócio, acabou por ficar sem a empresa que considerava complementar da sua atividade industrial. A Sonae detinha 25% da Portucel quando esta foi alienada e vendeu a sua posição acima do preço a que o Estado alienou. Não concorreu à privatização porque considerava o modelo “hostil” aos seus interesses. Ganhou Pedro Queiroz Pereira e, anos mais tarde, Paulo Azevedo chegou a admitir que a Portucel, “felizmente, não ficou mal entregue”.
Banca sem sucesso
A banca foi dos poucos setores onde Belmiro não conseguiu entrar. O primeiro obstáculo surgiu em 1989, no Totta & Açores, quando a aliança entre José Roquette e Mário Conde impediu o empresário de conquistar uma posição relevante. Vendeu a posição que tinha no capital da instituição financeira e, ainda assim, obteve mais–valias no valor de 15 milhões de euros.
Mais tarde, o episódio repetiu-se no Banco Português do Atlântico. O homem da Sonae tinha acordado um entendimento com outros empresários para garantir um “núcleo duro” na instituição financeira, mas que se desfez após a alienação das ações na segunda oferta pública de aquisição lançada pelo BCP.