Beatbombers. Bicampeões do mundo nos pratos e nas agulhas

Beatbombers. Bicampeões do mundo nos pratos e nas agulhas


DJ Ride e Stereossauro confessam que nunca tinham trabalhado tanto para um campeonato de DJ. O resultado está à vista nas paredes lá de casa: o segundo título mundial para os Beatbombers, conquistado na Polónia.


DJ Ride e Stereossauro não são DJ que se contentam com pouco. Foi em 2011 que venceram, pela primeira vez, o título no Campeonato do Mundo da Internacional DJ Association, em Cracóvia, na Polónia. “Habitualmente, a malta ganha uma vez e no ano seguinte é convidada para ser júri. Mas nós não quisemos: fomos logo à bruta para tentar ganhar outra vez”, ri-se Oliveiros Tomás Oliveira, mais conhecido por DJ Ride. “Queremos sempre evoluir e ganhar mais!” Ora, quando no passado dia 3 de dezembro, no regresso à Polónia, a dupla Beatbombers voltou a levantar os títulos de campeões do mundo de scratch/turntablism – que agora ostentam orgulhosamente nas paredes lá de casa –, atingiram um objetivo que procuravam há muito e que lhes andava a escapar por pouco: em 2012 ficaram no segundo posto e em 2014 no terceiro. “É importante não esquecer que se trata de uma competição em que a avaliação é subjetiva. O que para nós pode ter um grande som e uma enorme qualidade técnica, para um membro do júri pode ser visto de outra forma”, explica Stereossauro, sublinhando que nestes concursos nem costuma haver unanimidade nas decisões, algo compreensível. Há tanto para analisar, a começar pela técnica, passando pela seleção musical, até ao impacto festivo que a apresentação tem na plateia.

Dez anos de amizade 

Tomás e Tiago Norte andam a arranhar discos juntos há quase uma década, nas Caldas da Rainha. Nesta cidade, na ideia de Stereossauro, já seria estranho haver uma pessoa a fazer scratch, quanto mais duas. “Eu andava na faculdade, na ESAD [Escola Superior de Artes e Design de Caldas da Rainha], e tínhamos um amigo em comum, que sabia que eu estava a começar a mexer nos gira-discos, que me disse que havia um miúdo nas Caldas que também fazia scratch. Eu estranhei aquilo: alguém que faz scratch nas Caldas e não sou eu?” Foi depois de um concerto de Ride na escola secundária que trocaram contactos, e nem a diferença de sete anos de idade entre um rapaz da universidade e um miúdo da secundária atrapalhou a relação de amizade que se prolonga há já tantos anos e que é uma das grandes “culpadas” pelos dois títulos de campeão do mundo. “Muitas vezes, já sei quais são os nossos pontos fortes e já sei pegar numa batida e prever o que é que o Ride vai fazer, qual é a resposta que vai dar ao que eu lhe dou, como é que ele, com o skill dele e naquele bpm [batida por minuto] específico, vai dar a volta e criar algo porreiro. E vice-versa, claro.”

Nos últimos anos, DJ Ride tem circulado com maior frequência pela A8 para fazer a ligação entre as Caldas da Rainha e a casa que tem em Lisboa. E é neste pequeno apartamento no bairro das Olaias que encontramos a dupla de campeões do mundo. Olhamos em volta e nas estantes misturam-se discos com livros – assim de repente descortinamos, com olho gordo, uma caixa de “Donuts” de J Dilla, que celebra, em 2016, dez anos; “Música Para Camaleões”, de Truman Capote, ou ainda “How Music Works”, de David Byrne, e “The Rap Year Book”, de Shea Serrano, com ilustrações de Arturo Torres. Nas paredes pintadas de bordeaux, onde estão posters de “Star Wars” e de Madvillain, a dupla formada por MF DOOM & Madlib, estão também os dois títulos já conquistados pela dupla. “Eu também tenho o meu lá em casa”, sublinha o “kota Stereo”, como lhe chama DJ Ride, que pendurou os seus quadros mesmo em frente ao local onde tem instalada toda a parafernália de equipamento: computadores, mesas de mistura, gira–discos e pads com luzes – um cenário meio “nerd”, confessam os músicos.

Por enquanto, a parede de lá de casa ainda é grande e tem espaço para acolher muitos mais títulos. Um dos objetivos que não saem da cabeça dos Beatbombers é juntar o título do DMC World DJ Championships ao IDA. “São campeonatos muito semelhantes, ainda que com outras regras. O DMC é mais antigo [funciona desde 1985]. O do IDA é algo mais independente, que funciona num formato mais aberto”, explica Ride. Este ano, a dupla começou por tentar chegar ao título DMC, tendo ficado, em junho, a três pontos dos franceses DJ Fly + DJ Netik. Isso acabou por ser o rastilho que levou os Beatbombers a trabalhar ainda mais para o mundial na Polónia. “Houve uma preparação muito maior. Começámos a produzir o set três meses antes, no estúdio do Stereossauro nas Caldas [da Rainha]. Precisávamos de mais espaço, porque também queríamos usar mais equipamento: dois pratos [gira-discos] cada um, duas mesas de mistura, ele com um sampler e eu com mais um teclado”, especifica DJ Ride. Quando acabaram de produzir os seis minutos foi altura de entrar em estágio: “Foi um mês só a treinar sem editar nada! Foi a primeira vez que aconteceu (risos). Noutros anos chegámos a estar a preparar coisas uma semana antes!” Afinal de contas, a experiência também é um posto. “Tínhamos alguns receios dos franceses. Mas estivemos ao nível da seleção nacional e mandámos carga neles!” (risos)

Disco no horizonte 

O ano de 2017 vai ser dedicado a um novo momento na carreira da dupla: “Vai haver álbum de Beatbombers”, revela Stereossauro. É uma estreia que buscam há já algum tempo – até hoje lançaram apenas um disco de instrumentais, “Tuga Breakz” –; só que, com a participação em campeonatos, a agulha das prioridades acabou sempre por ser mudada. “Já temos bastante trabalho adiantado. E ainda temos uma mixtape que queremos ver se conseguimos acabar para lançar no início do ano.”

Claro que também haverá competições, sempre irresistíveis para Ride e Stereossauro. Só que no próximo ano, em vez de estarem atrás dos pratos, podem passar para o outro lado: o de júri. “Temos algumas propostas e, se calhar, no próximo ano vamos aproveitar. Pelo menos no IDA”, diz Tiago Norte. Ainda assim, há mais dois campeonatos para tentar ganhar: o DMC e o Red Bull Thre3style. “Também é bastante prestigiante ser júri de um campeonato internacional! É uma forma de ir lá, mas sem pressão. Já dá para treinar só uma semana e, claro, para ver a paisagem. Nestes anos todos, quase que nem dá para sair do hotel!”