Equipa Comunitária. Fazer “a diferença na vida das pessoas em momentos tão difíceis”

Equipa Comunitária. Fazer “a diferença na vida das pessoas em momentos tão difíceis”


A Equipa Comunitária de Suporte em Cuidados Paliativos do ACES Lisboa Ocidental e Oeiras, composta por 14 profissionais de saúde, avalia e acompanha doentes em diferentes contextos. Entre aqueles que se encontram em unidades de saúde, passando por aqueles que estão em casa, a equipa apoia-os, assim como às respetivas famílias.


A Equipa Comunitária de Suporte em Cuidados Paliativos(ECSCP) do ACES Lisboa Ocidental e Oeiras, criada em 2016, desempenha um papel vital no acompanhamento de doentes em situações de doenças graves e terminais e dos seus familiares, cobrindo uma área que inclui cerca de 240 mil habitantes nos concelhos de Oeiras e nos de Lisboa Ocidental.

O dia-a-dia da equipa envolve a avaliação e acompanhamento de doentes em diferentes contextos, desde consultas em unidades de saúde até visitas ao domicílio. Tratam uma variedade de casos, desde crianças até idosos, abrangendo principalmente doenças oncológicas, demências, insuficiências cardíacas e respiratórias.

A abordagem da equipa é multidisciplinar, envolvendo médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e nutricionistas, trabalhando juntos para fornecer cuidados especializados. Destacam “a importância de trabalhar em equipa, partilhando as experiências e as dificuldades enfrentadas”. O impacto emocional dessas situações “é gerido através do apoio mútuo e da compreensão de que, apesar do trabalho desafiador, fazem a diferença na vida das pessoas em momentos tão difíceis”, como indica a psicóloga Ana Reis Campino.

O retorno positivo recebido das famílias atendidas é percebido como uma fonte significativa de satisfação, ajudando a superar os desafios emocionais inerentes ao trabalho em cuidados paliativos. Ressaltam “a importância de poder fazer a diferença, proporcionando conforto e suporte numa fase tão delicada da vida das pessoas”, como observa a médica Rita Cunha Ferreira.

A enfermeira Cláudia Crispim mencionou um aspeto crucial, que é o tempo desde a admissão do doente até à alta. Atualmente, a equipa tem uma média de permanência do doente na equipa de cerca de 30 dias. Esta média é considerada razoável, permitindo à equipa realizar um trabalho significativo quando o doente e a família têm um contacto mais precoce com os cuidados paliativos.

A importância da divulgação e conhecimento sobre os cuidados paliativos é destacada, pois quanto mais cedo as pessoas tiverem contacto com a equipa, mais benefícios poderão obter dos cuidados prestados. O trabalho da equipa é mais eficaz quando têm tempo para intervir e oferecer suporte, ao contrário de situações em que são referenciados apenas nos últimos dias de vida, o que limita a capacidade de intervenção.

A proximidade e envolvimento da equipa na vida das pessoas são ressaltados como elementos fundamentais do seu trabalho. A equipa “entra nas casas, nas histórias das famílias, estabelecendo uma ligação forte que permite uma prestação de cuidados mais personalizada”.

Quanto ao período pós-morte, a equipa mencionou que disponibiliza apoio à família e, se necessário, encaminha os familiares para apoio psicológico. A monitorização do luto é realizada até certo ponto mas, geralmente, as famílias que receberam acompanhamento prévio estão mais capacitadas para lidar com o processo de luto de forma mais saudável.

A disponibilidade da equipa para visitas é destacada, ocorrendo durante o dia e, ocasionalmente, à noite, com a família sendo treinada e capacitada para gerir problemas que possam surgir durante esse período. A equipa valoriza a proximidade, dedicando “tempo e esforço para fornecer um apoio eficaz e compassivo, mesmo nos momentos finais da vida do doente”.

Cláudia Crispim destacou, ao longo da conversa, a importância crucial da comunicação e da construção de relações humanas na prestação de cuidados paliativos. Salientou que, no âmbito desses cuidados, o grande desafio não reside apenas no controlo de sintomas como dor e falta de ar, mas na habilidade de estabelecer uma comunicação efetiva com os doentes e as suas famílias. Enfatizou que, “dada a diversidade das famílias atendidas, é imperativo adaptar a abordagem a cada situação específica”.

A equipa ressaltou a relevância de envolver a família no processo de escolha e planeamento, evitando que as pessoas se sintam perdidas ou sem preparação para enfrentar o momento da morte. Além disso, destacaram a importância de desmistificar mitos, como a ideia equivocada de que os cuidados paliativos aceleram o processo de morte, e esclarecer questões relacionadas ao uso de morfina.

Foram mencionados projetos específicos desenvolvidos pela equipa, como o Projeto Laços, que procura formar profissionais de lares para lidar de forma mais eficaz com situações paliativas. A equipa também participa ativamente em atividades de divulgação, como em mercados e supermercados, para consciencializar a população sobre a importância dos cuidados paliativos.

No que diz respeito ao processo de admissão, a equipa explicou que as referências provêm de equipas intra-hospitalares, médicos de família e, em alguns casos, familiares que procuram informações online. Foi discutida a existência de uma lista de espera e a necessidade de gerir os recursos disponíveis para oferecer um atendimento eficaz.

Cláudia Crispim e Rita Cunha Ferreira reforçaram a ideia fundamental de que “todas as pessoas têm o direito a uma morte digna, ao lado das pessoas que lhes são significativas”. Sublinharam que as equipas de cuidados paliativos desempenham um papel crucial em auxiliar as famílias, garantindo uma melhor qualidade de vida até ao momento final, e encorajaram a população a exigir cada vez mais a importância desses cuidados.

A equipa ressaltou a dificuldade em definir um padrão fixo para as visitas, uma vez que são programadas de acordo com a necessidade específica de cada doente. Frisaram a importância do contacto da família em caso de alterações no estado do doente entre as visitas, reforçando “o compromisso da equipa com um atendimento personalizado e sensível às necessidades individuais de cada pessoa acompanhada”.

Contudo, apesar dos esforços das equipas comunitárias e intra-hospitalares, assim como das unidades de cuidados paliativos, a verdade é que o panorama é alarmante. Já no fim de 2019, a Associação Portuguesa de Cuidados Paliativos divulgou que, apesar de cerca de 90 mil doentes anualmente necessitarem de cuidados paliativos, apenas 25 mil conseguem beneficiar desse serviço. Tal foi revelado por um estudo do Observatório Português de Cuidados Paliativos, que apontou uma redução do tempo dedicado por profissionais, especialmente médicos e enfermeiros, a essa área entre 2017 e 2018.

O estudo destaca assimetrias profundas na rede de cuidados paliativos em Portugal, que ainda está longe de oferecer uma resposta universal à população. Existem carências tanto em camas quanto em equipas comunitárias, então ausentes em sete distritos do país. O Observatório sugeria uma remodelação no planeamento estratégico, enfatizando a necessidade de estimativas rigorosas de recursos e tempo alocado. Naquela altura, a resposta era fornecida por 66 médicos em tempo integral (quando deveriam ser 496), 243 enfermeiros (em vez dos necessários 2384), 17 psicólogos (em vez de 195) e 22 assistentes sociais (quando o ideal seriam 195).

A então secretária de Estado Adjunta e da Saúde, Jamila Madeira, anunciou investimentos nesta área naquele que seria o próximo Orçamento do Estado. No entanto, em dezembro de 2019, o Ministério da Saúde não divulgou detalhes sobre esses investimentos, remetendo mais informações para a proposta de Orçamento do Estado a ser entregue dali a dias. O PSD solicitou uma audição parlamentar com o Observatório e a Associação de Cuidados Paliativos, bem como com a coordenadora da rede.

Em janeiro de 2020, noticiava-se que dos 102 mil doentes que cumpririam os critérios para receber cuidados paliativos em 2018, apenas um quarto teve acesso a esse tipo de assistência, destinada a aliviar o sofrimento físico e psicológico em situações de doença incurável, avançada e progressiva. As crianças enfrentam lacunas ainda maiores, com apenas 90 entre oito mil menores com doenças incuráveis tendo acesso a cuidados paliativos – uma percentagem de 0,01%. Essas estimativas foram apresentadas pelo Observatório Português de Cuidados Paliativos, do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica.

O relatório, divulgado como parte do Relatório de Outono de 2019 do observatório, destaca a falta de profissionais na área. Segundo a primeira parte do relatório, seriam necessários 430 médicos, 2114 enfermeiros, 178 psicólogos e 173 assistentes sociais para suprir essa carência. A análise então apresentada incidia sobre a atividade assistencial, revelando que, diante da sobrecarga, o tempo dedicado aos doentes é limitado. Os médicos dedicavam uma média de 44,5 minutos por semana a cada doente (nove minutos por dia), os enfermeiros 82,5 minutos, os assistentes sociais 10 minutos, e os psicólogos apenas 8,8 minutos – o que equivale a menos de dois minutos por dia.

Mas, apesar das dificuldades, o panorama tem vindo a melhorar. No início de 2014, apenas 10% dos doentes terminais em Portugal tinham acesso a cuidados paliativos, como alertou a Associação Portuguesa desta área, destacando a falta de regulamentação da lei de bases como um dos principais obstáculos. O então presidente da associação, Manuel Luís Capelas, enfatizou que a burocracia na referência de doentes era um problema persistente, e a falta de regulamentação da lei de bases impedia que a rede nacional de cuidados paliativos funcionasse eficazmente. Apelou à regulamentação da lei de 2012 para agilizar a referenciação e melhorar o acesso a esses cuidados.