O Secretário de Estado dos Estados Unidos Antony Blinken fez em poucos dias um autêntico périplo diplomático por todo o Médio Oriente, visitando nove países e a Autoridade Palestiniana. Deixou de fora naturalmente todo o eixo geopolítico Iraniano. É já a quarta visita que efetua aos países da região desde o início do conflito. Olhando para a complexidade do cenário internacional, com a ascensão meteórica da China a potência global, a par da estratégia expansionista territorial da Rússia, parece relevante poder salientar-se o equilíbrio da política diplomática e da ação geopolítica dos EUA e da atual administração de Joe Biden neste conflito.
No entanto os ventos da democracia não correm de feição na política interna norte-americana e reforçam a possibilidade de regresso do ex-presidente Donald Trump nas próximas eleições. A questão da Ucrânia é só por si um fator de elevado risco na política externa dos EUA, com implicações diretas no apoio de muitos dos eleitores americanos. A guerra no Médio Oriente veio acrescentar complexidade a todo este processo. O alargamento deste conflito na região e a dramática situação humanitária em Gaza, podem vir a condicionar igualmente a disputa eleitoral à Casa Branca.
Os Estados Unidos assumiram desde o primeiro dia o apoio incondicional a Israel. Nem podia ter sido de outro modo. Primeiro pelo que Israel representa para os EUA desde a sua criação como Estado independente, mas essencialmente como resposta ao hediondo massacre levado a cabo pelo Hamas em 7 de outubro, a que se seguiu a tomada de reféns maioritariamente civis, crianças, mulheres e idosos.
Não deixaram em nenhum momento de apoiar Israel, inclusive de forma direta e imediata no esforço de guerra, quer na parte de logística e reabastecimento de munições, equipamentos e armamento, quer na parte de ajuda financeira.
Garantiram também e desde logo, o posicionamento em alerta máximo das suas forças na região, deslocando ainda porta-aviões para esta zona e assumindo a defesa do espaço aéreo no mar e em terra nas áreas contíguas a Israel. Asseguraram desta forma o controlo possível da segurança regional em toda a zona do Médio Oriente, através de uma clara demonstração de força.
Inserem-se neste contexto internacional, os ataques levados a cabo na madrugada de 12 de janeiro por meios aero-navais dos EUA e do Reino Unido, com apoio de outros aliados, contra os Houthis no Iémen, face aos constantes atos de pirataria, provocação e terrorismo, executados por este grupo fortemente armado e apoiado pelo Irão, contra o tráfego marítimo internacional na zona.
Em termos geopolíticos demonstraram também nesta fase que continuam a ser a potência dominante na região. A China e a Rússia afastaram-se na prática de qualquer ação relevante durante este período e a União Europeia desdobrou-se em ações e declarações de retórica contraditórias.
No entanto os Estados Unidos mantiveram uma permanente ação política e diplomática sobre o governo de Israel, na sua conduta de guerra em Gaza e nos seus efeitos, nomeadamente nas questões humanitárias, na abertura de corredores de segurança e de apoio alimentar e sanitário, e nos efeitos colaterais da ofensiva militar. Exigindo também que as retaliações sobre a população da Cisjordânia fossem contidas, nomeadamente as atividades levadas a cabo por colonos extremistas. Foram também determinantes no estabelecimento de contactos, que permitiram aos estados intermediários em especial o Catar e o Egito, negociar as pausas de guerra e a troca de vários reféns por prisioneiros palestinianos.
Mantiveram junto das Organizações Internacionais, em especial na ONU, uma posição de apoio a Israel, mas onde predominou por norma a moderação diplomática.
Conseguiram quase sempre manter com a grande maioria dos Estados árabes da região, uma posição de grande consenso e equilíbrio, muito em especial com a Arábia Saudita, o Egito e os países do Golfo. E foram sempre afirmando que a solução de dois estados pode ser um compromisso viável, contando com a Autoridade Palestiniana como ator privilegiado, ainda que nesta altura muito enfraquecido, para protagonizar este complexo desafio.
Os EUA sabem que resolver Gaza é neste momento a grande prioridade.
Mas Gaza tem três problemas a serem dirimidos separadamente, mas que se interligam: o problema humanitário; o problema militar e o problema político.
A solução encontrada para Gaza será o elemento-chave e vetor absolutamente decisivo para qualquer outro desenvolvimento da questão palestiniana. Se houver sucesso no pós-guerra, nas componentes militares, humanitárias e políticas neste território, poderemos estar mais perto da criação de um estado palestiniano. Caso contrário, esperam-se décadas e mais décadas de conflitos, instabilidade, ódios e vinganças na região.
A questão que se arrasta há décadas da criação de um Estado palestiniano, não pode ficar nas mãos ou ser tomada de assalto, como o tem sido ao longo do tempo, pelo Irão e os seus aliados radicais do Hezbollah e do Hamas, e até mesmo pelos próprios partidos de extrema-direita e ultraortodoxos em Israel. É altura dos Estados árabes moderados, em conjunto com os EUA e as próprias entidades autónomas palestinianas – «nova autoridade palestiniana»! garantirem uma solução efetiva para um futuro estado, num cenário que possa privilegiar a paz e não a guerra, e que garanta de forma inequívoca a segurança do Estado de Israel e de toda a região. No fundo uma solução aceitável e duradoira para ambas as partes.
Coronel e especialista em geopolítica
Eduardo Caetano de Sousa | LinkedIn