A fronteira enquanto expressão da soberania de um Estado sobre o respectivo território é um tema sensível. O bom senso recomenda respeitar a posse historicamente exercida por um Estado (uti possidetis) nos casos em que surja um novo Estado, quer por desagregação de um Estado previamente existente, caso frequente na dissolução de Estados complexos (URRS, Jugoslávia, Checoslováquia…), quer no surgimento de novos Estados a partir dos impérios coloniais (Biafra, Katanga, Cabinda,…).
O velho continente tem uma história muito sofrida em matéria de redesenho de fronteiras e de (re)criação mais ou menos infeliz de Estados. O pesado fardo das guerras ocorridas no século XX tinha dado aos europeus a esperança de que o desenho de fronteiras não desencadearia novos conflitos. Sabemos hoje da continuidade do recurso à fronteira como casus belli,
As fronteiras marítimas têm também potencial para gerar conflitos, embora menor porque a maioria das fronteiras marítimas não está ainda delimitada. A não delimitação decorre em grande medida da ignorância na medida em que a maioria dos Estados não tem meios para investigar os recursos que existem no mar, quer na coluna de água, quer na plataforma continental. Nesta circunstância é mais prudente não avançar para uma negociação com os vizinhos para delimitar as fronteiras marítimas.
No extremo oposto da cautela política encontram-se aqueles Estados que promovem reivindicações maximalistas à custa da compressão das fronteiras marítimas dos vizinhos. Estas reivindicações podem dar origem a conflitos armados e a história dos últimos dois séculos abunda em exemplos.
Uma alternativa à negociação e ao conflito passa pelo recurso à justiça internacional para delimitação de fronteiras marítimas. Tal implica uma acordo expresso dos Estados em litígio escolhendo um determinado tribunal ou a utilização de convenções internacionais que reconheçam a jurisdição do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ) ou do Tribunal do Mar estabelecido pela Convenção das Nações Unidas sobre Direito do Mar (conhecida como Convenção de Montego Bay, CMB). A CMB adoptou como critério de delimitação de fronteiras marítima o da equidade, mandando a atender a todos os factores relevantes e não apenas à lógica do prolongamento das fronteiras terrestres e do princípio da equidistância entre Estados como acontecia nas Convenções de Genebra que antecederam a CMB.
Entre os factores a ponderar na delimitação de fronteiras marítimas de forma equitativa estão as ilhas (que geram zona económica exclusiva e plataforma continental) e os rochedos (que não obrigam a uma alteração do traçado da fronteira no que respeita à ZEE e plataforma continental).
O recurso ao TIJ para delimitação de fronteiras marítimas tem sido frequente e assiste-se actualmente ao aumento significativo de pedidos. No passado dia 13 de Julho o TIJ decidiu de um pedido formulado pela Nicarágua contra a Colômbia e pelo qual reivindicava uma plataforma continental com uma extensão superior a 200 milhas marítimas, tendo como base uma decisão do TIJ, de 2012, em que se fixava a fronteira marítima entre os dois Estados. A originalidade do pedido da Nicarágua assentava não no prolongar da plataforma continental para lá das 200 milhas (o que a CMB permite e vários Estados, como Portugal, têm feito) mas em fazê-lo não em direcção ao alto mar mas em detrimento das 200 milhas da plataforma continental colombiana. O TIJ, numa votação de 13-4 e com uma argumentação válida, não deu razão à Nicarágua.