Nas acções dirigidas nos tribunais nacionais contra os Estados surgem identificados direitos fundamentais ameaçados pela inacção ou pela acção desadequada dos poderes públicos para mitigação das consequências das alterações climáticas. O desenho dos direitos reivindicados inclui os que têm assento nos diversos textos constitucionais (direito à vida e, nas constituições “aggiornate”, o direito ao ambiente) mas também na matriz internacional, com destaque para a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e que, não protegendo directamente o o ambiente como bem jurídico, desenvolveu, pela exegese do respectivo Tribunal, uma protecção mediata por via da tutela da vida familiar e da reserva da vida privada. Os tribunais superiores de diversos Estados têm recorrido ao consenso científico publicado em matéria de consequências das alterações climáticas, considerando-se competentes para sindicar as metas quantificadas de mitigação das políticas públicas, recorrendo à trilogia do princípio da proporcionalidade, concretizando juízos de necessidade, adequação proporcionalidade em sentido estrito (Holanda em 2019, Irlanda em 2020, Alemanha em 2021).
A 29 de Março a Assembleia Geral da ONU aprovou uma resolução em que requer ao Tribunal Internacional de Justiça um Parecer Consultivo que identifique as obrigações dos Estados em matéria de alterações climáticas. A resolução foi aprovada sem votação para evitar o “beauty contest” entre os promotores da resolução (pequenos Estados insulares, União Europeia, todos os PALOP’s e Timor, vários Estados em vias de desenvolvimento, liderados por Vanuatu, um Estado ameaçado pela subida do nível dos oceanos) e os que não a votariam (os suspeitos do costume: China, EUA, Rússia, Índia, Israel,…) abstendo-se, ausentando-se da sala ou até votando contra.
Nos considerandos da resolução são identificados os instrumentos de direito internacional que poderão permitir a construção de uma ponte entre os catálogos de direitos fundamentais e as consequências das alterações climáticas: Carta da ONU, Pactos dos Direitos Civis e Políticos e dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais, a Convenção dos Direitos da Criança, a Convenção de Montego Bay, a Convenção de Viena para protecção da Camada de Ozono e o Protocolo de Montreal, as Convenções da Biodiversidade e da Desertificação. No apelo ao TIJ são também referidas as obrigações relevantes que resultem do costume internacional.
A identificação das obrigações dos Estados é norteada, no que respeita à execução do Acordo de Paris, pela “equidade e pelas responsabilidades comuns mas diferenciadas e respectivas capacidades, à luz das diferentes circunstâncias nacionais.” O “name and shame” é dirigido aos países desenvolvidos por via do défice de concretização no financiamento dos prometidos 100 000 milhões de dólares anuais para a mitigação.
Ao TIJ foram dirigidas duas perguntas:
-quais são as obrigações que incumbem aos Estados na protecção das actuais e futuras gerações contra os efeitos das emissões antropogénicas de gases com efeito de estufa?;
-quais são as consequências jurídicas das acções e omissões dos Estados que tenham causado danos significativos a outros Estados, povos e indivíduos das gerações presentes e futuras?
Os Pareceres do TIJ não são vinculativos mas o Tribunal tem querido manter um paralelismo com a sua competência em sede contenciosa, concedendo a todos os Estados e organizações Internacionais que possam reivindicar um interesse legítimo um direito de pronúncia e procurando responder às questões colocadas com argumentos convincentes. O conteúdo dos Pareceres acaba por ser acolhido nas futuras decisões do TIJ em sede contenciosa.