As opiniões são como as conversas e as conversas são como as cerejas: puxamos por uma e vêm logo mais duas ou três agarradas à primeira. Talvez por isso, com o seu humor luciferino, Guimarães Rosa costumasse dizer: “Pãos ou pães é uma questão de opiniães”. Que um campeonato não se resolve à terceira jornada não é uma opinião, é um axioma. E, portanto, manda dizer a mesma verdade com que Alexandre Herculano afirmou que Afonso Henriques venceu os cinco reis mouros na Batalha de Ourique que amanhã, no final do encontro que irá opor FC Porto e Sporting no velho bairro das Antas, tudo continuará em aberto para ambos no que às ambições dizem respeito.
Aceite-se, no entanto, uma pequena fragilidade, a meu ver mais psicológica do que outra coisa, que afeta neste momento os adeptos leoninos – sentiram, e bem, o baque da venda de Matheus Nunes, o menino de ouro do conjunto de Rúben Amorim. Ora, era inevitável. Por tudo o que tem feito nos últimos dois anos (tendo mesmo ganho os galões de internacional pela seleção de Portugal), Nunes era um dos jogadores que “estava a mais” no campeonato nacional. A sua saída era, mais dia menos dia, inevitável, e já neste período de mercado que ainda está para durar uns bons doze dias.
Tinha, no conjunto do Sporting, uma importância fundamental? Sem dúvida. Mas não me parece que Rúben Amorim não estivesse a contar com esta baixa, se bem que talvez a tivesse previsto para depois do jogo no Porto. Seja como for, e por aquilo que lhe conhecemos, não apenas não irá utilizá-la como desculpa no caso de uma derrota como também se servirá dela para acicatar o orgulho e a gana do jogador que terá a responsabilidade de ocupar o posto do agora recruta do Wolverhampton, mesmo que seja de colocar a possibilidade de, perante a lacuna aberta, resolver alterar de alguma forma o estilo do conjunto até porque não há ninguém no plantel (nem na maior parte dos plantéis) uma peça com aquelas características. Estranharia muito, portanto, que este revés, se assim lhe quiserem chamar, vá mexer com a cabeça do treinador e dos jogadores do Sporting de maneira a entrarem no relvado das Antas amarrados a qualquer tipo de complexo. Os últimos confrontos entre dragões e leões, salvo outras “opiniães”, como diria Guimarães Rosa, foram marcados por um equilíbrio muito grande e não consigo imaginar que este vá fugir ao padrão.
Fraquezas Já tive a oportunidade de escrever aqui que todos os três grandes estão, em termos de jogadores, mais fracos do que na época passada. Saídas de gente como Mbemba, Vitinha e Fábio Vieira (Luiz Diaz já tinha ido antes), de Sarabia, Palhinha ou Matheus Nunes, de Darwin, não são facilmente compensáveis por muito que os responsáveis pelas tesourarias esfreguem as mãos de contentes. Por isso, tenho para mim que esta época vai exigir ainda mais dos treinadores de FC Porto, Sporting e Benfica, deixando este de fora por agora porque não é tido nem achado no confronto de amanhã.
Se Sérgio Conceição continua a fazer da dinâmica, da força física e do volume ofensivo do FC Porto a base para um futebol cada vez mais direto, obviando assim a ausência de alguma criatividade no meio-campo, Rúben Amorim não muda a sua ideia de controlo seguro da zona defensiva e de uma maior povoação da secção intermédia de forma a permitir maior descanso nas fases de recuperação aos homens da frente. Aprendi em todos estes anos atrás do futebol, e já lá vão cerca de quarenta, a nunca desprezar a questão psicológica. Poder-se-ia dizer que, nesse aspeto, os portistas estão mais seguros: afinal são os campeões, despacharam os adversários das duas primeiras jornadas com maior ou menor dificuldade, assentam a sua filosofia numa ideia muito antiga de que “todo o mundo quer impedi-los de ganhar” e usam-na para se superarem. Depois de ter demonstrado em Braga, na primeira jornada, uma série de erros individuais e coletivos, sobretudo na zona recuada, na sua maior parte fruto de muitas faltas de concentração pouco habituais nas épocas recentes, o Sporting parece ter dado um passo em frente, mesmo que seja preciso descontar a excessiva permeabilidade de um Rio Ave que, a continuar assim, vai ser um sério candidato à descida. Pode oferecer-se ao FC Porto o favoritismo? Pode. Mas não é novidade que, jogando em casa, seja sempre favorito.