À hora a que se escreve esta crónica, ainda se desconhece como ficará o resultado das eleições locais. A campanha oscilou entre a pura afirmação de recandidatos cuja campanha permanente coincidiu com o próprio mandato, até titulares que completaram os três mandatos e vão sair, deixando a porta aberta para novas afirmações uninominais.
De caminho, um ou outro eleito ensaiou a sua afirmação local, com base no trabalho e na obra feita de muitos anos.
O grande destaque desta campanha, foi a transformação destas eleições locais num plebiscito à ação do Governo, por decisão do primeiro-ministro (PM). O comício diário que percorreu o país, mostrando o “sucesso” do Governo na captação e “venda” do PRR como panaceia de milhões, não permite outra ilação.
Portugal vive um momento em que a sociedade precisa de reformas e em alguns setores já com muito atraso, mas António Costa veio oferecer uma quermesse de dinheiro e mais dinheiro. Tornou assim a “recuperação e resiliência”, em vulgares termos de vocabulário tecnocrata e de novo brocado socialista de ocasião.
Ora, manda a verdade dizer, que colocadas as coisas neste plano, se a “nacionalização” destas eleições é facto assente, e se os resultados significarem um sinal negativo para o Governo, então torna-se inescapável a retirada de consequências políticas a outro nível.
É que a introdução do tema do PRR nestas eleições, para o cidadão médio, significa que é fundamental um novo impulso governativo, uma nova matriz de ministros em pastas-chave, que permita reganhar na economia e na dinâmica económica o que temos vindo a perder nos últimos anos.
Com efeito, não convence e não basta a manipulação discursiva e propagandística à volta das consequências da pandemia, como suficiência justificativa para os efeitos económicos e sociais junto da população.
A infeliz afirmação de um Secretário de Estado sobre a bondade e até oportunidade da epidemia, na medida em que permitiu mostrar a capacidade e, segundo ele, a boa “performance” do nosso país, não passa disso mesmo, uma “infeliz afirmação”, mas tendo como fonte um pensamento desastroso que subjaz à afirmação.
Revela, outrossim, a superficialidade desvalorizante que se atribui à destruição de riqueza nos últimos dois anos e, ao mesmo tempo, a pouca atenção à perda de competitividade da nossa economia e o cada vez maior atraso no ranking dos últimos da Europa.
É certo que este quadro de alterações no dia seguinte está dependente da nova composição da direita, já que à esquerda, ninguém imagina o PCP/BE a decomporem o caldo de cultura que os introduziu no “sistema” imaginado pelo PS, derrubando o Governo.
No PSD, mesmo que os ganhos atingissem o insólito, o que não parece ir acontecer, – salvo Coimbra ou uma outra Câmara ocasional – não há votos que compensem a ausência de um movimento de adesão do eleitorado ao atual líder, para chegar ao governo do país.
Por outro lado, a entrada pela primeira vez nestas eleições de novos partidos que concorrem no eleitorado de centro e direita, é uma incógnita.
O mais certo é que do rescaldo destas eleições, se transfira para dentro do PSD, nova turbulência decantadora, visto que a calma neste partido ou sempre coincidiu com a estada no poder ou, quando na oposição, antecipava as tempestades de renovada clarificação interna e de nova liderança, seguido de um combate acrescido pelo poder no governo.
A história da democracia portuguesa sempre colocou as eleições locais com uma leitura possível para clarificações na política nacional.
Vamos saber em breve, o que estas eleições significaram.
Jurista