Portugal entrou no início da semana na segunda fase de desconfinamento e com ela as regras foram-se tornando menos apertadas. Mas não para todos. Os postos de combustíveis continuam a estar proibidos de vender bebidas alcoólicas.
O i sabe que esta inibição está a cair mal junto dos empresários do setor ao considerarem que estão a ser “esquecidos pelo Governo”, uma vez que esta restrição afeta as contas das empresas. Contactado pelo i, o Ministério da Economia disse apenas que “o Governo acompanha atentamente a evolução da situação sanitária e tem adaptado o plano de desconfinamento com base nessa evolução”.
No entanto, são argumentos que não convencem o setor. “Os restaurantes podem estar abertos até às 2h da manhã, os bares também e até às discotecas desde que tenham os clientes sentados podem ter as portas abertas. Não faz sentido os postos de abastecimentos após vários meses continuarem a não poder vender bebidas alcoólicas”, confidencia ao i, um empresário.
O mesmo admite que até aqui percebia essa inibição para evitar ajuntamentos perto das gasolineiras, mas agora com as outras atividades abertas garante que deixou de fazer sentido. “Claro que todos estamos recordados dos ajuntamentos, principalmente em Lisboa, de jovens que se reuniam nas bombas de gasolina para consumirem álcool, mas nessa altura, restaurantes e bares estavam encerrados. Agora não, os jovens que se querem divertir vão para esses locais e todos vimos o que se passa diariamente, por exemplo, nas ruas do Bairro Alto”, diz um outro empresário que pediu anonimato.
É certo que estes alertas não são novos, mas que ganham outros contornos com a passagem do país de estado de emergência para calamidade. Em maio, a Associação Nacional de Revendedores de Combustíveis (Anarec) tinha alertado ao i que que “a proibição de bebidas implica que outros produtos não sejam vendidos”.
A associação deixou exemplos concretos. Muitos estabelecimentos deixaram de vender, por exemplo, uma sandes de presunto porque não podiam vender a cerveja para acompanhar.
E até os tradicionais tremoços ou amendoins, que são normalmente acompanhados por uma cerveja, deixaram de se vender. A Anarec não tem dúvidas: “O pensamento do cliente é ‘simples’: não vai às bombas almoçar ou lanchar porque não pode beber álcool”.
Com base em testemunhos dos postos de combustível, a associação diz que o facto de os clientes se deslocarem às chamadas ‘bombas’ para comprar uma cerveja, acaba por impulsionar a aquisição de outros produtos e serviços, como é o caso da lavagem automóvel. No entanto, esse ciclo deixou de acontecer com esta proibição do Governo e, neste momento, “registam-se quebras elevadíssimas ao nível da venda de produtos de loja em geral. Além da quebra de faturação da venda de bebidas alcoólicas existe, pois, um volume considerável de perdas indiretas”.
Já, nessa altura, a associação que representa o setor falava em “medida desproporcional, discriminatória e sem qualquer fundamento”.
Recorde-se que esta proibição foi publicada em Diário da República, em setembro, onde se pode ler que “é proibida a venda de bebidas alcoólicas em áreas de serviço ou em postos de abastecimento de combustíveis […]”, justificando a decisão com a “adoção de medidas mais restritivas do que aquelas que têm vindo a ser tomadas nas últimas semanas.
O crescimento de novos casos diários de contágio da doença aliado ao início do ano letivo escolar e o aumento expectável de pessoas em circulação, designadamente em transportes públicos em áreas com elevada densidade populacional deixam prever que, na falta de adoção de medidas mais restritivas, os casos de contágio irão aumentar de forma exponencial nos próximos meses”.
Impacto nas estruturas Com a proibição de venda de bebidas alcoólicas, os postos de combustível registaram quebras de vendas entre os 15% e os 100%. “Antes da proibição da venda de bebidas alcoólicas, num mês um associado fazia vendas mensais de 5000 euros ou mais. Atualmente, só com muito esforço conseguem chegar aos 1000 euros”, disse, na altura, a Anarec.
E menor negócio também significa impacto nas estruturas. Um dos empresários contactados pelo i admite que há empresas que estão a desinvestir nos turnos da noite e com isso estão a reduzir trabalhadores. “Sei de postos de abastecimento que deixaram de funcionar à noite e, com isso, deixaram de precisar de tantos funcionários. Mesmo aqueles que continuam abertos não necessitam de tantos colaboradores porque o negócio caiu muito. Geralmente quem pára numa gasolineira à noite é porque precisa mesma de abastecer porque sabe que praticamente não pode comprar mais nada”.
Um cenário que já tinha sido admitido pela Anarec. “Outro problema é que a rentabilidade dos postos de abastecimento “advém maioritariamente dos produtos adquiridos em loja, e não tanto da venda de combustíveis, pelo que a quebra de vendas em loja tem um grande impacto na solvabilidade das empresas”, disse, na altura, ao i.
Ginásios também dizem que foram “ignorados”
Para a associação que representa os ginásios não há dúvidas: esta atividade “foi ignorada na segunda fase de desconfinamento” como também viram as medidas aplicadas ao setor agravadas por uma orientação da DGS. De acordo com a AGAP, no dia 17 de agosto, a DGS emitiu uma revisão da sua Orientação Nº030/ 2020 e em cima da mesa estão “considerações impossíveis de compreender e implementar”.
Um desses casos diz respeito à higienização dos balneários, onde a DGS recomenda que, após cada utilização, os cacifos, cabides, chuveiros/cabines de duche e instalações sanitárias devem ser limpos e desinfetados. “Além do que representaria em termos logísticos, é de muito difícil justificar uma diretriz desta natureza. Nenhum setor vive com restrições desse calibre”, refere.
José Carlos Reis, presidente da AGAP, considera que o setor está esquecido mas é parte da solução. “Estamos incrédulos com a ausência do setor do fitness e saúde na antecipação da fase 2 de desconfinamento. O país avança, e bem, a um excelente ritmo na vacinação, os diferentes setores alcançam o tão esperado alívio das medidas restritivas e nós, que somos parte da solução desde sempre, fomos simplesmente esquecidos”, diz.
A AGAP entende que “urge entender, de uma vez por todas, os benefícios da prática de exercício físico” e lembra que os ginásios foram dos setores que mais tiveram de investir para se adaptarem às medidas especiais provocadas pela pandemia.
E dá como exemplo, os EPI (equipamentos de proteção individual), a reconfiguração de espaços ou software de gestão de sócios, lembrando que o setor registou perdas de 40% num ano.