MUNIQUE – Não podia esperar e eis-me na rota que deveria ter sido portuguesa, à beira de me sentar na bancada de imprensa da grande Arena onde costumam jogar o Bayern e a seleção alemã que, ainda há bem pouco, nos deu, aqui mesmo, uma sova de futebol à moda antiga como quem dá dois pares de chapadas a um fedelho atrevido. Mas Portugal perdeu-se na noite quente de Sevilha, naquele estádio abominável de La Cartuja, vetado ao abandono, elefante branco que os políticos andaluzes não sabem como usar, ora numa final da Copa do Rei, ora num jogo da seleção espanhola, ora como desta vez, a servir de muleta para a realização do Campeonato da Europa, sobretudo a partir do dia em que Bilbau, outra das cidades que deveria receber jogos, disse um rotundo NÃO!, impondo restrições sanitárias que, definitivamente, não cabem em competições deste género.
Infelizmente, o Euro-2020 (que passou a Euro-2021) ficará guardado nas gavetas da nossa memória por via da total discrepância de atitudes de país para país. A Alemanha acaba de nos colocar na zona vermelha, algo que obriga os portugueses a entrar em quarentena mal cruzem a fronteira, a menos que transportem consigo uma declaração de Isenção de Quarentena passada pela UEFA sob supervisão das autoridades sanitárias alemãs.
É preciso esbracejar para se ir a um estádio, pelo menos naqueles em que estive. Com exceção para o Puskás Arena de Budapeste onde se respira um ar não tão opressivo, talvez porque as fardas fossem em menor número.
Troca.
Se era por Portugal que esperávamos em Munique bem podemos esperar sentados, pedindo umas canecas de weissbier e uns “schweinmedallionen mit kartofel”. “Tu ne viendras pas çe soir”, cantaria o Salvatore Adamo, ainda que estejamos muito longe de ter neve, embora a chuva já tivesse caído sobre Munique na passada semana como se alguém distraído, tivesse deixado abertas as torneiras do céu. “Tu ne viendras pas ce soir/Me crie mon désespoir…” Talvez já tenha chegado mais do que tempo de dizer adeus à tristeza, como sugeria o meu querido Fernando Tordo, com o qual, por sms, essa maravilha da técnica moderna, trocamos diárias ideias sobre o que se vai passando neste Campeonato da Europa em que Portugal foi obrigado a despojar-se dos galões de campeão por uma Bélgica que pode ter menos talento individual do que nós, mas cujos jogadores fantásticos que possui – De Bruyne, Eden Hazard, Lukaku, Maertens – se dedicam à construção de um bloco coletivo que passa a vida em movimento, ora ofensivo, ora defensivo, mas sem abrir brechas inesperadas na forma como controla o adversário, até mesmo quando lhe dá a bola e sussurra, num tom quase escarninho: “Vá, anda, vem daí…” E, depois, quem vai sujeita-se à rapidez daquele desdobramento que parece uma onda do mar a subir pela areia no tempo das marés-vivas.
Bélgica-Itália é, sem dúvida, um jogo que dá vontade de ver. Sobretudo porque coloca frente a uma equipa belga a caminho da reforma, tendo atingido provavelmente uma qualidade que nenhuma outra seleção do país das batatas fritas conseguira até agora, e uma Itália rejuvenescida pelo toque de Mancini, um daqueles treinadores que gosta de futebol de ataque e não reduz as suas equipas à sua metade do campo. Duas equipas com o registo de 100% de vitórias – Bélgica (3-0 à Rússia; 2-1 à Dinamarca; 2-0 à Finlândia; 1-0 a Portugal) e Itália (Turquia, 3-0; Suíça, 3-0; País de Gales, 1-0; e Áustria, 2-1 após prolongamento). Agora, um terá de perder…
Com um meio-campo de muita qualidade, onde entram Verratti, Jorginho, Locatelli e Barella, no apoio a uma linha ofensiva com Insigne, Immobile (que não é grande nome para um ponta-de-lança), Berardi e Chiesa, os italianos têm mostrado um futebol inventivo e interessante, mesmo do ponto de vista tático. Amanhã, no relvado do Arena de Munique, já ninguém se lembrará de nós. Os perdedores caem no poço do olvido. E Portugal nem deixou sequer futebol com suficiente qualidade para sentirmos saudades dele.