Cascais assinala esta semana 657 anos de território com existência livre e independente. Para além de constituir uma oportunidade para celebrar a história e a identidade de um povo com um caráter único em Portugal e no mundo – é admirável o espírito tolerante e solidário dos cascalenses cá nascidos, ou que, cá não tendo nascido, nos escolheram para ser a sua casa –, este é o tempo certo para, em conjunto, refletir sobre os desafios das cidades no pós pandemia.
A tarefa não é apenas de recauchutagem do nosso modelo económico e social. É, como dizem os anglófonos, uma empreitada mais ambiciosa. “Build back better” é o que se exige de todos nós. Temos de encontrar novos modelos e novos paradigmas de desenvolvimento que acomodem os choques tectónicos que vivemos, simultaneamente provocados pela pandemia, pela revolução digital e pela rotação do centro de poder das sociedades ocidentais para as orientais.
Os temas ambientais e a agenda da sustentabilidade são hoje um tópico inescapável. São-no por duas razões. Em primeiro lugar, a ameaça das alterações climáticas, uma pandemia de maiores proporções do que a covid-19. Bill Gates estima que o impacto dos fenómenos meteorológicos extremos seja, em termos anuais, tão mortal como o coronavírus em 2060 e cinco vezes mais letal em 2100. Uma agenda para a sustentabilidade é, por esta via, uma exigência científica, moral e humanista.
Em segundo lugar, os cidadãos são mais exigentes nos padrões de qualidade de vida que adotam. Ao decisor político cabe equilibrar o crescimento orgânico da cidade – as cidades não são estáticas, são organismos vivos, mudam e crescem, adaptam-se – com o planeamento sustentável e o desenvolvimento económico solidário gerador de prosperidade para o maior número. Uma agenda de sustentabilidade é um imperativo de cidadania, do moderno planeamento urbano e também de uma nova economia mais solidária.
Nos seus viçosos 657 anos, Cascais dá um novo impulso à sua agenda de modernidade e transformação. Há uma revolução verde em marcha. E ela é muito notória nestes dias em que celebramos o aniversário do território. Escrevo enquanto estou a um par de horas de abrir ao público dois novos bosques urbanos – na Ribeira dos Mochos e no Outeiros dos Cucos – que correspondem à revitalização de zonas arbóreas agora tornadas usufruíveis ao público e potenciadas em termos de biodiversidade. Nos próximos meses, serão inauguradas novas zonas verdes na Abóboda e no Bairro Alice Cruz – mais espaços naturais qualificam zonas socialmente mais deprimidas e anulam assimetrias territoriais – e um extraordinário parque urbano na Quinta da Carreira, em São João do Estoril, a poucas centenas de metros do mar.
Muito em breve daremos início aos trabalhos que criarão, na antiga Bataria da Parede (Regimento de Artilharia de Costa), um dos mais belos parques verdes da Área Metropolitana de Lisboa e iniciaremos a recuperação da Ribeira de Sassoeiros, criando um magnífico espaço de usufruto público que serpenteará dezenas de ruas e bairros. E isto é apenas e só o que falta para os próximos meses. Porque se olharmos para os últimos três anos, muito antes de a pandemia ter forçado as pessoas a redescobrir o prazer dos espaços verdes, aumentámos drasticamente as áreas naturais dentro dos perímetros urbanos.
Criámos como nunca zonas de estadia, de convívio social e o verde passou a ser a nota dominante em muitos bairros e ruas. Levámos a revolução verde a todas as freguesias: requalificámos a Ribeira das Vinhas (em Cascais e Alcabideche); criámos o novo Parque do Penedo (S. Domingos de Rana), o novo Jardim e Parque do Bairro das Caixas (Parede), o novo Parque do Outeiro da Vela (num dos locais mais disputados para a construção em Cascais); devolvemos à população o Bosque 25 de Abril (em Carcavelos) e muitos outros pequenos jardins de proximidade e hortas comunitárias. Assim, estamos mais perto de cumprir o nosso ambicioso plano: todos os cidadãos de Cascais terem pelo menos um espaço verde a 500 metros de suas casas.
Mas “Verde” não é apenas sinónimo de qualidade de vida para os cascalenses. É atratividade para os que estão fora. Sábado passado, em pleno Parque Natural Sintra Cascais, inaugurámos a “Rota do Ocidente”, um extraordinário projeto municipal que une de forma simbiótica o Oceano Atlântico à Serra, num pacote turístico de grande qualidade. Pela primeira vez, há uma oferta turística que permite aos visitantes dormir no Parque Natural e, ao mesmo tempo, fazer caminhadas e passeios com vistas de tirar o fôlego, andar a cavalo, tosquiar ovelhas ou fazer uma degustação dos melhores produtos oriundos da Quinta do Pisão.
A revolução verde, por fim, também é filosofia materializada em política. É por isso, com muito orgulho, que Cascais foi o primeiro município nacional a aderir aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas – o que nos valeu, até, uma carta do Secretário-Geral, António Guterres. Como somos exigentes, como lideramos pelo exemplo, aproveitámos as comemorações dos 657 anos de Cascais para implementar o “VISTO ODS”. Isto é: a partir de agora, todas as propostas submetidas a Reunião de Câmara estão em conformidade com os ODS. Assim, as deliberações camarárias estarão em linha com a implementação dos objetivos. O nosso compromisso com a sustentabilidade e a audácia no combate às alterações climáticas não passa despercebido à ONU que acaba de convidar Cascais para apresentar o seu roteiro de implementação dos ODS em Nova Iorque em 2022.
É sob a égide da moldura dos ODS – tão universal quanto consensual – que Cascais continuará a trilhar o caminho da revolução verde. Ela é visível em muitos domínios da vida económica e social. Seja na mobilidade sustentável – uma rede de transportes públicos gratuita e com autocarros de última geração, incluindo dois movidos a hidrogénio; seja na redução dos resíduos em aterro, com um inovador projeto de reciclagem (o iREC) que já desviou 200 mil garrafas de plástico das lixeiras; seja nos ecocentros móveis que criaram novos circuitos dedicados de reciclagem para 24 toneladas de eletrodomésticos, livros, discos e outros em apenas dez meses; seja nas três piscinas municipais que, com sistemas mais inteligentes, poupam 10 mil metros cúbicos de água por ano.
Em Cascais o caminho faz-se caminhando. Com ambição e coragem. A nossa revolução verde não será travada. A democratização da qualidade de vida é inegociável. Porque todos os cidadãos são parte deste projeto que tem como objetivo fazer de Cascais o melhor lugar para viver um dia, uma semana ou uma vida inteira.
Presidente da Câmara Municipal de Cascais
Escreve à quarta-feira