A eleição presidencial nos Estados Unidos é sempre um relevante acontecimento político que obriga a novos alinhamentos na cena internacional e perspetiva novas fases do comércio mundial.
Desta vez, só mesmo a eleição presidencial no colosso americano poderia levar à retirada, por alguns dias, da abertura do Covid19 do “prime-time” dos nossos meios de comunicação.
O apelo noticioso proveniente das vicissitudes eleitorais naquele país superou a tragédia pandémica, mostrando que a preocupação com o futuro do capitalismo nos Estados Unidos e no mundo, foi capaz de superar as preocupações sanitárias.
Por umas horas neste fim de semana, temáticas estranhas ao futuro de Trump e à sua queda, desapareceram do espaço noticioso, querendo significar que todos éramos mais ou menos americanos, como todos somos “Je suis quelque chose …” conforme o andar do mundo.
Neste caso, o que é estranho é entre nós a circunstância da súbita atenção pelo santuário do capitalismo, proveniente de um país governado pela concertação com a extrema-esquerda que se identifica e saúda o governo de ditaduras anti-capitalistas na Bielorrússia, Caracas ou Cuba.
Estranhíssimo caso este de vermos os extremistas e totalitários deste mundo, saudar quem representa e defende o oposto das suas propostas para a sociedade, a economia, as relações sociais e laborais.
Aliás, com cenas curiosas de protagonistas rendidos ao socialismo, à prevalência do Estado sobre o mercado, liberdade económica sujeita ao planeamento centralizado, empresas dependentes do subsídio do secretário de Estado, do regulador nomeado e dependente do ministro, do conselho económico e social reverente ao primeiro-ministro, tudo simbolizando o contrário do que existe nos Estados Unidos.
Cada eleição presidencial americana assim festejada, é uma nova e grande vitória de afirmação do capitalismo e do mercado, sobre cuja extinção os opostos fazem estrutural afirmação programática.
Viveram-se por estes dias momentos de felicidade mundial pela eleição de um novo chefe do país onde prevalece o capital, como homenagem confessada que o vício presta à virtude.
Certo é que fica a sensação que deste evento o mundo dos contrários bate palmas aos resultados eleitorais sem saber bem porquê…
À efetiva diminuição de impostos de Trump ou ao aumento anunciado por Biden?
À saúde paga por incentivos fiscais ou solicitando a rubrica do Orçamento do Estado e o desperdício astronómico?
Bate palmas aos produtos chineses com taxas alfandegárias ou livre entrada de produtos?
Saúda a emigração sob controle ou o “entrai entrai até termos que sair nós, os nativos”?
Reconhece a tolerância perante uma Europa indiferente aos custos da NATO, filosofando apesar disso sobre a defesa de um mundo livre?
Congratula-se com o fazer a paz pelo mundo terminando como nos últimos quatro anos declarações de guerra ou continuando e reforçando as frentes de batalha?
Permitindo aos teocratas do Irão brincar e subestimar os USA e o Ocidente ou aceitando conversações mesmo sendo difícil negociar com ayatollahs ?
E por aí fora …
Afinal quem quer saber do que caracteriza a maior potência mundial do “grande capital”, das “multinacionais”, dos “predadores mercadejos” e do liberalismo “selvagem”?
Ocorreu-me então que a América por estes dias parece-se bastante com o santuário de Meca em peregrinação digital e mediática, onde se presta homenagem ao profeta eleito e se esquece o cessante.
Felizmente que a entrada na Meca americana não é proibida a peregrinos que não sejam capitalistas, como na verdadeira Meca só tem acesso quem seja muçulmano.
Na visão destes dias e do mundo, todos parecem ser primos americanos.
Vamos ver quanto tempo durará a romaria.
Jurista