Podia começar este artigo floreando a questão, mas não vale a pena fazê-lo. Na semana em que o Executivo apresentou o Orçamento do Estado para 2021 tornou-se oficial a demonstração de que António Costa não tem qualquer estratégia para o país que não passe por apostar na sorte, esperar que chegue a bazuca europeia e, quanto ao resto, logo se vê.
De resto, já escrevi sobre esta matéria há pouco tempo o que, portanto, assinala a coerência do juízo político programático deste (des)Governo. E antevendo já, porque todas as semanas assim acontece, que vão aparecer meia dúzia de patetas que nos comentários deste artigo escreverão tudo e mais alguma coisa, todos os disparates e mais alguns, o que por si só, note-se, não me chateia e me diverte, aconselho a que leiam antes, pelos menos no que tiverem acesso, este Orçamento.
Verão, se forem intelectualmente honestos, que todo ele representa, apenas e só, um catálogo de intenções, um contínuo anúncio de que se fará ou irá fazer tudo e mais alguma coisa mas sem explicar como, quando, porquê, em detrimento de que outras hipóteses estratégicas ou ao abrigo de que paradigma político capaz de alavancar o país para as próximas décadas. Mas, mais que isso, vejo com extrema preocupação que António Costa continua a parecer querer alimentar um país composto em si mesmo por dois países distintos.
Se verificarmos as rubricas do Orçamento do Estado conseguiremos perceber (uma vez mais, se formos intelectualmente honestos, não tivermos palas nos olhos ou pura e simplesmente não formos burros ou socialistas) que o primeiro-ministro que já deu a entender que a fartura tinha acabado e que vêm aí anos muitíssimo complicados é o mesmo primeiro-ministro que, neste Orçamento, não apresenta quaisquer reduções concretas de impostos para as famílias e para as empresas, ao mesmo tempo que, em contrapartida, orçamenta um aumento generalizado de encargos gerais da máquina estatal ou ainda um aumento de verbas para a administração local num valor expetável de 7,1%, o que apenas se entende como brinde pelas eleições autárquicas que se avizinham e que António Costa, naturalmente, quererá ganhar.
Esta é a verdade. E por amor de Deus não gozem com as pessoas, não mintam às pessoas, não tratem as pessoas como perfeitos anormais, porque não são. É certo que nem todos os portugueses percebem de finanças públicas, economia ou direito fiscal. Não perceberem é o maior sucesso de vida destes políticos miseráveis que pelo burgo se continuam a arrastar. Mas vamos lá com calma. Vir o ministro das Finanças ou António Costa afirmar que esta engenharia manhosa que agora criaram em torno da redução na retenção na fonte é uma redução real nos impostos que o Estado tributará é qualquer coisa só aceitável no domínio da falta de caráter político e da desonestidade governativa. É uma palhaçada. Portanto, vejo com imensa preocupação um Orçamento que não representa para Portugal qualquer garantia, por pouca que pudesse ser, de que com a sua aplicação se conseguisse pelo menos travar a desgraça em que a breve trecho estaremos novamente mergulhados.
Já no que diz respeito à Assembleia da República e aos partidos que terão de votar este Orçamento, a novela adensa-se, mas já todos estamos a ver como acaba. O Bloco de Esquerda e o Partido Comunista andam agora a fazer-se passar por virgens ofendidas quando, na verdade, são estrelas deste bordel. Mas, como se costuma dizer, lágrimas de meretriz quando chegam ao chão vão secas, o que significa que não só não se podem esconder das responsabilidades que têm no estado em que estamos porque aprovaram todos os Orçamentos anteriores do Partido Socialista como, aprovando este, nunca mais poderão dizer o que quer que seja sobre qualquer coisa que venha a passar-se no futuro.