O novo recorde de casos de covid-19 registado esta quarta-feira fez soar alarmes. Foram 2078 casos, um número a que se esperava que se pudesse chegar esta semana, como o i noticiou, mas apontado mais para o final, quando habitualmente se costumam registar números mais elevados de notificações. A primeira declaração sobre a gravidade da situação que se vive no país foi feita pelo primeiro-ministro antes de ser divulgado o boletim da Direção-Geral da Saúde, que viria a mostrar um recorde de casos na região Norte (1001) e também em Lisboa (802). Nos últimos dias, apesar de já haver um agravamento da situação no Norte, mais marcado na semana passada, a ideia de uma “evolução grave” não tinha sido transmitida pelo Governo ou pela DGS, não obstante diferentes alertas públicos para um agravamento da situação. António Costa anunciou o regresso do país ao estado de calamidade e anunciou as medidas aprovadas em Conselho de Ministros para travar o crescimento de casos, nomeadamente o limite de 50 pessoas em eventos como casamentos e batizados e a intenção de tornar obrigatório o uso de máscara ao ar livre – para já, recomendada – e também da app StayAway Covid, temas que terão de passar pela aprovação do Parlamento.
Na conferência de imprensa, a ministra da Saúde sublinhou também que o momento é preocupante e que os modelos sugerem que a situação irá agravar-se, indicando que se mantém a capacidade de resposta no Serviço Nacional de Saúde, onde existe possibilidade de expandir as camas alocadas à covid-19. Questionada pelos jornalistas, Marta Temido revelou que as projeções do Instituto Ricardo Jorge, que dá apoio técnico ao Governo nesta área, indicam que o país poderá aproximar-se dos 3 mil casos dentro de alguns dias “se não forem tomadas as cautelas necessárias”, disse, sublinhando que os modelos matemáticos não têm ainda em conta as medidas que estão agora a ser adotadas, quer em termos de serviços de saúde quer em termos de políticas globais.
Para os especialistas ouvidos pelo i, as medidas anunciadas são positivas, também por virem reforçar o alerta da população depois de um relaxamento nas últimas semanas, mas não se devem esperar efeitos imediatos, o que sugere que os próximos dias deverão ser mesmo de maior pressão sobre o sistema de saúde e o rastreio de contactos de pessoas infetadas, que na última semana já começou a mostrar dificuldades em acompanhar o ritmo de novos casos.
"É previsível que continue a haver um aumento progressivo de casos. Infelizmente, ocorreu mais cedo do que era esperado, causando uma sobrecarga maior no SNS", afirma Filipe Froes, coordenador do gabinete de crise da Ordem dos Médicos, que na semana passada, em entrevista, defendeu a necessidade de reforçar medidas, considerando que o país estava com duas a três semanas de atraso em relação à situação epidemiológica em Espanha, se tanto. "A meu ver, as medidas pecaram por tardias e os efeitos práticos só se repercurtirão, previsivelmente, dentro de 15 dias", sublinha, antevendo duas semanas de enorme pressão sobre o SNS.
Óscar Felgueiras, matemático especialista em epidemiologia da Universidade do Porto, que no início desta semana alertou para o crescimento sem precedentes dos casos na região Norte e defendeu também a necessidade de reforço de medidas e sensibilização da população, considera que a evolução do número de casos confirma a tendência de agravamento. "Enquanto as medidas não tiverem efeito, não há nada que a vá alterar", explica, considerando positivas as decisões agora tomadas. Se serão suficientes para travar um crescimento que na região Norte classifica como acima de exponencial, diz que é necessário adesão e esperar. "Gostaria que fossem suficientes, não tenho a certeza se serão. Uma semana após as medidas entrarem em vigor vai poder começar-se a avaliar", afirma o investigador, sublinhando que "é difícil parar um comboio em andamento".
O investigador assinala que os dados dos últimos dias mostram que não só o Norte, mas também Lisboa parece estar com uma tendência de maior aumento de casos. "Será de alguma forma natural se tivermos em conta que o país não é estanque. Tal como não há compartimentação por idades, não existe uma compartimentação por regiões. Quando Lisboa teve uma incidência mais elevada, era fator de risco para o resto do país. Neste momento, o Norte torna-se um fator de risco para o resto do país e Lisboa parece também ter uma trajetória de maior subida".
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