Depois daquele golo marcado com a mão, à Inglaterra, durante o Mundial de 1986 e de toda a tranquibérnia que se seguiu, Diego Armando Maradona não perdeu a oportunidade de soltar um ou dois dichotes sobre a Guerra das Falkland (ou das Malvinas), assim à moda de quem acrescenta que para aldrabão, aldrabão e meio. O caso marcou a agenda dos anos 80. Os arquipélagos de Geórgia do Sul e de Sanduíche do Sul, resumidos ao nome de Falkland em inglês e de Malvinas em castelhano, foram reclamados pelo Governo argentino em abril de 1982, e a guerra tornou-se inevitável, acarretando a morte de 649 soldados da Argentina, 255 britânicos e três civis – os inevitáveis danos colaterais, como os senhores dos conflitos gostam de dizer.
A vitória do incomparavelmente superior exército britânico resolveu o assunto no espaço de três meses e a senhora Thatcher alavancou-se para mais uns aninhos no n.o 10 de Downing Street. Hoje, as Falkland vivem numa paz mais ou menos vigiada e os seus habitantes podem dedicar-se à paixão antiquíssima que têm pelo futebol: o primeiro jogo levado a cabo nas ilhas data de 1892 e foi disputado entre a British Defense Force (parece uma maldição) e um alegre grupo de voluntários civis.
Umas coisas conduzem às outras e, neste caso, ao aparecimento de um clube chamado Stanley FC, fundado por Jack McNicholl, um poderoso habitante local. Não há uma data certa que confirme o aparecimento do Stanley FC – aponta-se o início de 1916 –, mas o mais curioso desta matéria é que acabou por se tornar a seleção das Falkland, procurando adversários nas ilhas vizinhas. Hoje, as Falkland têm uma equipa nacional mas, como não estão filiadas na confederação local, a Conmebol (os outros membros da entidade apoiam os interesses da Argentina e não reconhecem a soberania britânica), também não fazem parte da FIFA.
Competição Se há coisa em que os britânicos são bons é na autossuficiência. E as Falkland estão pejadas de britânicos. Rapidamente resolveram o problema da falta de contactos internacionais ao dedicarem-se a desafiar outras dependências do velho império e quejandos como as Western Islands (que ficam ao largo da Escócia), as Orkney (que pertencem à Noruega), as Aland (que pertencem à Islândia), a ilha de Man, a Gronelândia, as Shetland e Guernsey. A sua debilidade competitiva é de tal forma chocante que as derrotas se somam a derrotas, algumas com goleadas aflitivas, como duas vezes por 0-9 frente à ilha de Man e um 1-7 face às Western Islands. Uma vitória sobre as Orkney por 4-1 tornou-se motivo para festa até às tantas na região.
A luta das Falkland pelo acesso ao verdadeiro futebol internacional e sua integração nas confederações parece ser, para já, um caso perdido. O campeonato é de uma pobreza aflitiva, composto por sete clubes e dominado por completo pelas equipas formadas por soldados destacados nas guarnições militares britânicas, como é o caso do Falkland Rangers, do Jim Balfour’s Barmy Army e do Navy and the Falkland Islands Defence Force. Contra estes nomes tão profundamente bélicos, que podem fazer os pobres Malvina House Hotel FC, Teenage Mutant Ninja Turtles e Clos de Pirque? Muito pouco ou nada, como calculam. O arquipélago, que se situa na plataforma continental da Patagónia, com pouco mais de 12 mil quilómetros quadrados, continua a ser um cenário de guerra eventual. E o futebol está sujeito à contingência das armas. Sem um fim pacífico à vista.