1. O povo português é maduro e lida mal com falinhas mansas. A realidade é dura, mas é o que é. Entrámos nas semanas críticas da pandemia e Portugal tem de preparar-se para o embate.
Como tenho dito, estamos em guerra. É uma guerra contra um inimigo comum, invisível e, como tal, cobarde porque nos ataca em silêncio. E, como na guerra, a todos são pedidos sacrifícios excecionais. A uns pede-se que se mantenham nos seus postos de trabalho, onde são necessários ao país e à comunidade; aos outros exige-se que fiquem em casa, no recato dos seus lares, onde o país e a comunidade precisam que estejam.
Esta crise de saúde pública abate-se sobre o país e a Europa quando as nossas democracias já davam sinais de debilidade. Com as restrições aos nossos direitos, liberdade e garantias por tempo indeterminado, com uma crise económica já em marcha e uma crise social a formar-se no horizonte, as democracias ocidentais terão, porventura, o seu maior teste de stress desde a II Guerra Mundial.
É importante que possamos controlar esta pandemia a todo o custo. Mas é ainda mais importante que o possamos fazer respeitando a democracia e as liberdades fundamentais de cada um. Garantir a dignidade na dificuldade. Isto implica que todos os cidadãos percebam que ser livre não é fazer tudo o que se quer. É que a nossa liberdade individual termina onde a liberdade do outro começa. Temos de entender a liberdade sempre na mesma equação da responsabilidade. E nestes tempos novos, o que se nos pede é exatamente isso: um exercício responsável da nossa liberdade.
Neste contexto, liberdade não é aproveitar os preços baixos dos bilhetes de avião para ir de férias; também não é ir para a praia apanhar banhos de sol ou fazer festas temáticas de mau gosto em discotecas. A nossa liberdade responsável, aquela que se exige a cada um de nós para sairmos desta crise, entende o homem como uma parte de um todo maior perante o qual tem direitos e deveres, e exige de nós vigilância para que não haja interferência do Estado na nossa cidadela interior.
A história está recheada de exemplos de grandes impérios que tombaram perante emergências de saúde pública. À nossa geração cabe provar que sabemos fazer melhor do que os nossos antepassados e somos capazes de consolidar emergência e liberdade, democracia e controlo.
2. Como um famoso doutrinador comunista dizia: há décadas em que nada acontece e há semanas em que acontecem décadas. Estamos no domínio das segundas. Os nossos dias, dos decisores locais ou nacionais, têm 18 horas. É preciso fazer tudo o que está ao nosso alcance para proteger os cidadãos que nos elegeram. Tenho tido o privilégio de, com os meus colegas presidentes de Câmara, da AML, do Porto e do país inteiro, somarmos uma força que eu nunca visto no poder local. Essa força dá-me confiança para o futuro.
Porque a situação é mutável, em Cascais não passa um dia em que não ponhamos em prática conjuntos de medidas robustas no combate ao coronavírus. Queremos sempre estar um passo à frente. Em todas as áreas.
Aqui ficam algumas delas para tranquilizar os nossos cidadãos e dizer, a todos os autarcas que precisem de apoio ou ajuda, que Cascais também saberá dizer presente.
Saúde: teremos, no Centro de Congressos do Estoril e na Cercica (em Rana), centros de testes gratuitos ao covid-19 com os laboratórios Germano de Sousa e Joaquim Chaves; com Rui Moreira, presidente da Câmara do Porto, a quem agradeço, Cascais fez uma encomenda conjunta de ventiladores que chegarão aos nossos dois concelhos dentro de dias; encomendamos mais de 300 mil mascaras e reforçámos com mais um milhão, 1500 fatos especiais de proteção e 10000 luvas; mobilizamos mil e trezentas camas para quarentena em instalações desportivas, municipais e no setor social; hotéis e alojamentos locais estão a preparar-se para acolher os profissionais do SNS que não querem voltar para casa; e ontem mesmo lançamos uma linha de apoio aos seniores, para que nada lhes falta em casa durante o isolamento.
Espaço público: encerramos o Aeródromo (deixando as operações mínimas previstas na Lei) e a Marina de Cascais; fechamos todos os equipamentos municipais (espaços de recreio, museus, bibliotecas, parques fitness); suspendemos todas as obras da câmara em espaço publico; interditámos as praias e fechámos parques de estacionamento.
Educação: Cascais está a distribuir desde ontem 270 refeições por dia às crianças de Jardim Infância e 1º Ciclo, gratuitamente para o escalão A e com um custo reduzido para o B; criámos escolas de retaguarda para acolherem os filhos dos profissionais de serviços especiais.
Mobilidade: ordenámos todas as entradas pelas portas traseiras, cortámos a ocupação em 30%, desinfetamos os autocarros, paragens e estações e defendemos os motoristas; estendemos a gratuitidade dos transportes até fim de maio e a isenção de pagamento de parquímetros por tempo indeterminado; suspendemos as Bicas.
Estímulo económico: isentamos de taxas, por um semestre, os operadores económicos; criámos um fundo de emergência superior a cinco milhões de euros para fazer face às medidas de contingência adotadas e a adotar e que será reforçado sempre que necessário.
Recursos humanos: esmagadora maioria da câmara, mais de dois terços estão em casa, mas a trabalhar continuando a receber 100% do ordenado e 100% do subsídio de refeição, para não agravar problemas sociais; reforço das condições de segurança dos funcionários municipais e aumento de 150% do atendimento online e telefónico.
Turismo: cancelamento de todos os eventos até (pelo menos) dia 15 de abril, mas que provavelmente se irá estender.
Termino este texto como comecei: o povo português é maduro. E, acrescentaria, sábio. Por isso, apelo a que todos os leitores deste meu texto respeitem as recomendações das autoridades. Em Cascais e no país temos todos demonstrado um enorme espírito cívico.
Trate de si, dos seus e dos outros. Vamos vencer porque maior que sejam as dificuldades, a nossa determinação e garra consegue superar. Vamos ganhar porque juntos somos mais fortes.
Presidente da Câmara Municipal de Cascais
Escreve à quarta-feira