A Organização Mundial da Saúde deverá decidir hoje se declara o novo coronavírus chinês uma emergência internacional, mas os receios de uma epidemia de muito maior escala que a do SARS, há 17 anos, vírus da mesma família que vitimou perto de 800 pessoas, começam a ganhar forma.
Um mês depois de a China ter informado a OMS sobre o surto de uma nova forma de pneumonia em Wuhan, o número de doentes infetados na China continental superou ontem o número de casos registados durante a epidemia que começou em novembro de 2002, na província de Guangdong, e levou cerca de sete meses a ser controlada, alastrando a 37 países. Ontem, ao final do dia, estavam confirmados 5970 casos na China continental, a maioria concentrados na província de Hubei, onde fica Wuhan. Em maio de 2003, o balanço final da OMS apontou para 5327 casos no sul da China. O vírus viria também a atingir de forma dramática Hong Kong, que na altura registou 1755 casos e 299 mortes.
Desta vez, o território decretou a proibição de entrada de pessoas de Hubei e, até ao momento, confirmou oito casos importados. Aliás, foram peritos de Hong Kong que manifestaram durante a última semana a maior preocupação com as proporções que a epidemia poderia assumir e pediram medidas “draconianas”. Yi Guan, da Universidade de Hong Kong, disse numa entrevista após regressar de Wuhan que a epidemia poderia ser dez vezes maior que a do SARS. Já Gabriel Leung, da mesma instituição, admitiu o potencial para uma pandemia.
Ao todo, 18 países já confirmaram também casos importados – na Europa, a Finlândia tornou-se ontem o terceiro país a diagnosticar o vírus. Os casos fora da China são quase todos de pessoas que tinham estado na região afetada. Só foram confirmadas transmissões locais, limitadas, no Vietname e Alemanha, onde quatro pessoas foram infetadas no local de trabalho por uma colega chinesa. A diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, admitiu esta semana ao i que ainda existe alguma incerteza sobre o modo de transmissão do vírus. Parece propagar-se com maior rapidez do que o SARS, mas com menor letalidade. Até ontem estavam confirmadas 132 mortes num total de 6057 casos a nível global, o que aponta para uma mortalidade de 2%. Há 17 anos, o SARS vitimou 10% dos doentes infetados.
Na semana passada, o comité de emergência da OMS reuniu-se duas vezes, mas os peritos estavam divididos sobre o risco de emergência internacional, que pode levar a novas recomendações por parte da OMS e restrições de viagens para a China, onde o surto já está a ter fortes repercussões económicas e sociais. Wuhan completa hoje uma semana de quarentena, mas há outras 15 cidades isoladas. Na quinta-feira, quando os peritos se reuniram pela segunda vez, estavam confirmados 644 casos, e o número é agora quase dez vezes superior. Vários países já determinaram restrições à entrada de cidadãos de Hubei e as companhias aéreas estão a suspender os voos para a China. A primeira a anunciá-lo foi a British Airways. No país de origem do surto, muitas empresas encerraram e o regresso às aulas após as férias de ano novo foi adiado. Ontem, o diretor-geral da OMS reconheceu que o potencial para uma propagação global do vírus levou a convocar a reunião. A evolução do surto suscita uma “preocupação séria”, disse Mike Ryan, responsável pelo programa de emergências da organização.
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