Greta Thunberg. Discurso  da jovem ativista não gera consenso

Greta Thunberg. Discurso da jovem ativista não gera consenso


Opiniões dividem-se em relação ao apelo feito pela ativista sueca de 16 anos em torno da redução do consumo. Há quem aplauda e quem aponte para uma verdadeira crise.


O discurso de Greta Thunberg na ONU causou polémica. O crescimento económico e o capitalismo foram alvo de fortes críticas da ativista sueca de 16 anos. “Estamos no início de uma extinção em massa e tudo o que vocês falam é sobre dinheiro e contos de fadas do eterno crescimento económico. Como se atrevem a fazê-lo”, questiona.

Mas não agrada a todos. Ao i, João Duque censura o conteúdo de Greta Thunberg e garante que uma redução drástica do consumo provocaria “um cataclismo económico que traria sérios problemas”. Ainda assim, admite que é necessário levar a cabo algumas alterações em certos padrões mas, de forma sustentada, tranquila e equilibrada. “Todos queremos ter um bom rendimento e qualidade de vida. Ninguém aceitaria de um dia para o outro deixar de ter esse rendimento, mesmo que seja em nome do ambiente”, acrescenta.

O que é certo é que os números falam por si. Os dados revelados ontem pela Pordata revelam que, em 2018, foi batido um recorde em termos de consumo. O consumo privado, que mede os gastos das famílias e das instituições sem fim lucrativo, superou os 129 mil milhões de euros, atingindo o nível mais elevado desde 1960. E a entidade explica que este aumento de gastos vão “desde as contas da casa à compra de um novo automóvel”.

O economista chama ainda a atenção para o risco que existe nos discursos em antecipar a quebra da disponibilidade de determinados artigos de consumo. “Todos temos em mente o que aconteceu em abril com a greve dos motoristas de matérias perigosas. Não só houve uma corrida aos combustíveis como também aos supermercados. Imagine a catástrofe que seria se esse risco existisse em todo o mundo e para todos os produtos”, refere ao i.

E os exemplos não ficam por aqui. João Duque garante ainda que se deixassem de existir voos comerciais provocaria uma enorme quebra dos turistas e uma crise económica nos países. Portugal não escapa ileso. “Só a taxa de desemprego disparava. Passaríamos a ter um milhão de portugueses desempregados. Aí sim não haveria consumo para essas pessoas”.

Recorde-se que a mãe da ativista revelou no livro Scenes from her Heart que Greta Thunberg tinha 11 anos quando começou a interessar-se pelas questões relacionadas com as alterações climáticas tendo sofrido uma depressão que “arrastou toda a família para uma crise”, mas que foi superada depois de ter levado a cabo várias mudanças no estilo de vida: alimentação vegetariana e deixou de fazer viagens de avião.

João Duque também põe em causa o seu discurso em matéria de alimentação. “Temos de produzir alimentos para oito biliões de pessoas. Não sei o que faria pior se deixar de produzir coisas que fazem um pouco mal à saúde ou deixar de usar químicos e pesticidas?, questiona. Mas o economista responde: “É preferível usar pesticidas do que vir aí uma peste e matar 1 bilião de pessoas, como acontecia antigamente”, diz ao i.

Alterações climáticas prejudicam crescimento económico Mas nem todos tem a mesma opinião. O investigador Filipe Duarte Santos não tem dúvidas: “As alterações climáticas já estão a prejudicar o crescimento económico”, diz ao i. E, para justificar, dá vários exemplos direcionados a Portugal. “O custo dos incêndios florestais, o custo do combate aos incêndios florestais, a perda de floresta que temos todos os anos e a perda de vidas humanas em 2017: tudo isto são custos económicos elevados”, explicou. No que aos incêndios diz respeito, o investigador dá destaque ainda aos custos no aluguer de aviões de combate a incêndios. “Não havendo aviões suficientes para combater os fogos no nosso território, têm de ser alugados a outros países. E é caríssimo alugar aviões destes”, refere.

Mas as preocupações de Filipe Duarte Santos não ficam por aqui, até porque não são só os custos dos incêndios a prejudicar o crescimento económico. “As secas são caras ao país porque a produtividade agrícola diminui”, explica ao i. Até porque “mesmo as exportações de produtos agrícolas que se façam e não estejam afetadas pela seca, diminuem”.

Outro fator climático que, no seu entender, pesa à economia portuguesa são os recursos hídricos: “Sempre foram relativamente escassos, sobretudo no sul do país. Mas agora, com as secas mais frequentes, são ainda mais escassos”, defende. “Muitas vezes as povoações têm de ser abastecidas por autotanques e aí está outro custo”.

No caso das zonas costeiras, o principal problema apontado por Filipe Duarte Santos é a erosão, uma vez que “aquilo que se gasta em defesa da nossa costa por ano é um valor muito considerável”.

E estas são as principais alterações climáticas que no entender do investigador pesam no crescimento económico português, destacando que, em locais como os Estados Unidos, os custos são maiores. “Pensemos nos ciclones tropicais que assolam os Estados Unidos e os últimos têm sido particularmente intensos. Esses ciclones tropicais causam prejuízos tremendos nos países, com custos financeiros elevadíssimos”, defende.

Para o investigador, a ideia de que descredibilizar a economia vai desacelerar o crescimento económico “não é verdade porque cria empregos e novas infraestruturas”. E acrescenta: “O que acontece é que se nós não descredibilizarmos a economia a nível mundial, vamos ter impactos nas alterações climáticas cada vez mais gravosos e esses impactos vão prejudicar o crescimento económico, muito e cada vez mais. É isto que as companhias petrolíferas, de combustíveis fósseis, não querem reconhecer”.

E esta não é a primeira vez que o assunto é abordado por ambientalistas portugueses. Ao i, Carlos Antunes, investigador do Departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, garantiu que “se viajássemos metade, comêssemos metade, consumíssemos metade, implicaria decrescimento económico, que os políticos querem a todo o custo evitar”.

“Parece uma rapariga muito feliz com um brilhante e maravilhoso futuro pela frente. Que bom de se ver!”