1. Palavras para quê? António Costa é o verdadeiro artista português. A entrevista do líder do PS geringonçado ao Expresso é uma caricatura perfeita do pântano em que Portugal está atolado. Primeiro, antes de prosseguirmos, convém recordarmos o descaramento absoluto do Expresso em publicar esta entrevista, que mais não é do que uma iniciativa de propaganda adicional do semanário do grupo de Balsemão em prol do PS. É público e notório – e nunca desmentido pelos interessados – que o Expresso está (muitíssimo) empenhado na vitória de António Costa com maioria absoluta em Outubro. Os leitores mais atentos das minhas prosas, aqui no i e no SOL, estão recordados da minha indagação, em tom satírico, de quando seria publicada a entrevista de Verão do Expresso a Costa do presente ano. Mal sabia que o descaramento já é tão ilimitado que a referida publicação iria mesmo reeditar a já clássica entrevista de Verão de Costa…em pleno ciclo eleitoral! De facto, é um facto inédito na nossa democracia que um jornal – como o Expresso está fazendo com António Costa – aceite ser o veículo de propaganda do primeiro-ministro em funções, submetendo-se ao ridículo papel de publicar uma conversa em família… em três Verões consecutivos!
2. Recordemos para memória futura: em 2017, António Costa aproveitou a entrevista de Verão, sempre no Expresso, para lançar a sua campanha paras as autárquicas, insinuando que queria que, após outubro (mês das autárquicas) se iniciasse um novo ciclo político, marcado por consensos com o PSD. Ou seja: António Costa queria substituir Passos Coelho por Rui Rio: uma oposição fraca permitiria a Costa levar o PS para o centro novamente, pelo menos, em termos comunicacionais. E os jornalistas perceberam o toque a rebate, alimentando uma campanha anti-Passos até outubro (inventando até a narrativa do “diabo”). Depois, em 2018, António Costa aproveitou a entrevista de Verão ao Expresso para lançar as traves mestras do programa eleitoral do PS, do Orçamento de Estado para 2019 e a ideia que era apresentada (por Pedro Santos Guerreiro, como se provou, mais um fanático costista na direção do Expresso) como a mais genial do século: uma borla fiscal para os emigrantes que pretendessem regressar ao país (ideia que, para além de ser materialmente inconstitucional, revelou-se completamente ineficaz: mais uma inutilidade à la António Costa…). Finalmente, este Verão, em mais uma entrevista de Verão ao Expresso, António Costa aproveitou para antecipar o seu discurso de campanha eleitoral. É uma vergonha que o jornalismo português – mais concretamente um jornal histórico como o Expresso – se submeta a este papel de mera agência de propaganda do PS!
3. Alguém é capaz – sem incorrer em flagrante desonestidade intelectual – de afirmar que o Expresso não é a nova Acção Socialista, mecanismo privilegiado de propaganda do PS, dominado pelos interesses especiais, de Costa? A crise transformou o Expresso, jornal ligado à fundação da democracia em Portugal, em jornal privilegiado do sistema corrupto em que vivemos. Infelizmente, hoje, comprar o Expresso é contribuir com quase cinco euros para a campanha do PS de António Costa. Caríssimos(as) leitores(as): conhecem algum jornal, que se assuma como independente e imparcial, no mundo desenvolvido – que publique, em três verões consecutivos, uma entrevista, encomendada pela máquina de propaganda do PS, ao primeiro-ministro em funções, negando tal “privilégio” ao líder da oposição e demais líderes partidários? Conhecem algum caso, por esse mundo fora, em que o primeiro-ministro (entrevistado) invoque o exemplo do seu irmão – diretor do jornal entrevistador – para brincar com uma pergunta formulada? Pois não! Só mesmo neste Portugal geringonçado, em que a promiscuidade entre o poder socialista e os interesses instalados é tenebrosamente gritante. Há quem afirme que a comunhão de interesses entre António Costa e o grupo do Expresso tem que ver com o papel do Governo socialista na inviabilização da compra da TVI pela Altice: o prolongamento da indefinição acionista da citada estação de televisão conduziu à sua fragilização financeira e à consequente criação de uma oportunidade para a SIC (do mesmo grupo empresarial do Expresso) recuperar o primeiro lugar nas audiências (como veio, de facto, a acontecer…). Portugal, infelizmente, está dominado por este socialismo corrupto e perverso: no topo, António Costa facilita e controla as negociatas, feitas à medida do PS e da manutenção do seu poder; na base, António Costa vai dando umas pequenas migalhas ao povo português para evitar que ele se revolte contra o poder corrupto instituído.
4. Para se perceber este modo de atuar de António Costa, convém ler o recente livro de Inês Serra Lopes sobre a geringonça: nele é contado que o líder socialista geringonçado disse a Cavaco Silva que teria inevitavelmente de formar a geringonça para… salvar o PS. Isso mesmo: para salvar o PS. Não foi para salvar Portugal, salvar o povo português, salvá-lo a si, à sua família e o seu futuro, caríssimo(a) leitor(a): António Costa reconheceu que só construiu a geringonça para salvar o… PS. O PS de António Costa – ou seja, o PS dominado pelos interesses especiais. Eis, pois, o grande dilema que teremos de solucionar no próximo dia 6 de outubro: reforçar o PS corrupto de António Costa, alimentando os interesses especiais que tão bem têm feito à elite do PS Socrático/Costista e tanto sofrimento têm infligido ao povo português; ou enfraquecer o PS e a corrupção a ela associada, permitindo que um novo futuro possa começar a ser construído o quanto antes. É que, recorrendo aqui ao título do magnífico livro de Joaquim Silva Pinto (muito próximo de Mário Soares), deste pântano costista não sairemos a nado…
P.S: Sobre o conteúdo da entrevista de Verão de Costa, escreverei amanhã, quarta-feira, no SOL online.
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Escreve à terça-feira