A Lisboa de Manuel Salgado


Olhando para a Lisboa de Manuel Salgado, só com muita “partidarite” ou alguma má vontade se pode dizer que o balanço não é positivo


Centro Cultural de Belém (CCB), Expo 98, Estádio do Dragão e respetiva estação de metro, hotéis, hospitais… é impressionante a quantidade de obras marcantes que Manuel Salgado apresenta no seu currículo.

O caso do CCB, que fez em parceria com o italiano Vittorio Gregotti, é dos mais interessantes. Encarado como uma espécie de “ode ao cavaquismo”, o projeto foi alvo das mais violentas críticas: o grande auditório foi comparado a um mausoléu e disse-se que o conjunto tapava a vista dos Jerónimos (esquecendo os críticos que, mesmo que isso fosse verdade, a parte tapada seria a ala menos interessante do monumento). O caso deixou bem claro, acima de tudo, que todas as grandes realizações em Portugal encontram uma enorme resistência por parte da opinião pública. E no CCB, em particular, a associação ao Governo de Cavaco Silva contribuía para tornar essa resistência ainda mais feroz.

Apesar da inércia natural e dessa tendência tão portuguesa para se criticar o que é novo, Manuel Salgado consegue deixar uma obra impressionante, primeiro como arquiteto, depois como vereador do urbanismo da Câmara de Lisboa. Dos grandes projetos que têm nascido na capital nos últimos anos, devem ser muito poucos os que não têm o seu dedo. E não é segredo que acumulou muito poder.

Ora, será isso bom ou mau? A concentração de poder nas mãos de uma pessoa constitui de facto um perigo – mal utilizado pode fazer muitos estragos e prejudicar muita gente. Mas, bem aplicado, pode fazer milagres.

Olhando para a Lisboa de Manuel Salgado, só com muita “partidarite” ou alguma má vontade se pode dizer que o balanço não é positivo. Haverá um ou outro projeto mais questionável, mas no conjunto temos mais arquitetura de qualidade e a cidade melhorou a olhos vistos. E mesmo esses projetos que suscitam dúvidas mostram uma visão arrojada e têm o mérito de promover a discussão. Antigamente, que me recorde, nasciam por todo o lado os famosos edifícios de pato-bravo, e ninguém parecia preocupar-se muito com isso.