1. De Lisboa disseram aos ativistas locais controlados que o dr. R. de Sousa parecia bem e que aceitavam a designação pela adesão ao regime, jovialidade, porte, pela recente formatura e promissória carreira de jurisconsulto.
Acresce que integrava a nata da sociedade local da época: família tradicional de industriais do pano, ademais tentando a modernidade no mister dos investimentos do pronto-a-vestir industrialmente confecionado.
Estaria assim à altura para encabeçar a lista pelo velho distrito.
E o veredicto da ANP chegou decisivo: será o dr. R. de Sousa o nosso candidato à Assembleia Nacional.
O deputado até nem esteve mal e cumpriu o mandato garbosamente.
Fez um discurso sobre o Orçamento Geral do Estado (hoje OE); outro em que elogiou a “primavera” política e quase correu o risco de chegar a membro do governo.
Quanto à representação de pessoas, comunidade, empresas, instituições, aos costumes disse nada.
Lembrei esta personalidade real, perante o método, a forma, o curso e o percurso das designações, por estes dias, dos integrantes das listas de candidatos a deputados à Assembleia da República.
O celofane é diferente na aparência da embalagem: o conteúdo é o mesmo na geração e fonte da deputação nomeada.
Os chefes dos partidos (e não apenas de um partido) e os comités centrais decidem, tiram alguns coelhos e coelhas da cartola, os “novos” Sousas de todos os tempos, e aí temos o bruaá da novidade velha, na mesma matriz do anterior regime.
E, então, daqui decorre o equívoco de representação e a completa ausência de identificação, tal como no passado, entre o que se discute no Parlamento e o que preocupa os portugueses.
Afinal, é aos chefes e aos comités centrais que os nomeados devem a prebenda de chegar a São Bento, e não ao povo todo, mobilizado para a escolha unipessoal do deputado, através de identificada e contratada missão cívica e política de representação livre e sindicada regularmente pelos eleitores.
Ontem como hoje, é aos chefes partidários que ficam a dever obediência temática sobre o que dizem e votam, no alinhamento da política longínqua dos representados.
Tudo então se explica no que acontece neste quadro parlamentar.
E os parlamentares que, apesar de tudo, se vão identificando de forma dinâmica com os problemas da região envolvente, mesmo que saindo do guião do partido, correm o risco de serem vistos como ambiciosos sem regra no jogo interno partidário, e excluídos; os seguidores impenitentes, esses, têm prebenda continuada e assegurada e lá renovam o mandato sem glória numa verdadeira roleta-russa.
E chegamos ao ponto.
2. Olha-se então a atividade do Parlamento e toma-se conhecimento das prioridades e da abordagem daquilo que por ali se consideram, por exemplo, as “emergências” nacionais.
Esta semana foi exemplar, com a resolução sobre a “emergência climática”.
Não sei se a Terra corre hoje mais riscos cíclicos que correu nos milhares de milhões de anos da sua existência. Sei que, nesta matéria, vamos tendo “agendas” tantas vezes usadas como instrumento de conquista do poder ou oportunidade de negócio para mercenários de ocasião.
E mesmo no quadro da participação de Portugal nos fóruns internacionais, perder de vista a nossa realidade económica e a envolvente fáctica do estado da nossa sociedade, bem como as incidências nos custos de produção das empresas e nas imputações do quotidiano do custo de vida das famílias, a adoção de medidas decorrentes da valorização de “emergências ambientais” desligadas do país que somos, só pode revelar um espírito aventureiro em sede de Governo e de Parlamento, intolerável para o comum cidadão.
Acresce que, mesmo entrando no jogo dos poluentes, Portugal não conta a nível global.
Ora, se há coisa que Portugal pode agradecer ao criador, entre tantas, uma delas é a excelência do nosso clima, invariável na riqueza das nossas estações do ano, bem definidas e estanques…
Faz frio, logo chega a primavera; faz calor e breve aí está o outono da folha caída, para logo depois voltar o frio…
A emergência climática no nosso país não passa, assim, de uma coisa chamada treta, apesar da grandiosidade mediática imprimida ao tema, imaginada e impingida por razões ideológicas e de negócio global.
As verdadeiras emergências estão por analisar e tratar com seriedade.
Emergência real é a extorsão fiscal, que desvia rendimentos do bolso de quem os ganha para os cofres do Estado, para este entrar depois no forrobodó da distribuição e favorecimentos venais …
Ou emergência real é a falta de investimento e a questão da liberdade económica comparada, para salvar a urgentíssima fraca expansão da riqueza nacional.
Mas para estes temas não há decisões que valham substantivamente a clarificação dos caminhos urgentes a percorrer.
A pequena parte do povo escolhida pelos chefes partidários, que legisla na Assembleia da República, entende, a contrario, que a prioridade é o que foi aprovado na passada sexta-feira: a declaração de “emergência climática”.
E quando se pergunta sobre o que vai acontecer a seguir, a resolução aprovada entra na verdadeira ficção, exigindo que o Governo “assuma o compromisso de promover a máxima proteção de pessoas, economias, espécies e ecossistemas e de restaurar condições de segurança e justiça climáticas”.
O que é isto da justiça climática mai-lo resto que antecede e como se leva à prática, ninguém sabe e também pouco interessará saber no minuto seguinte à douta decisão, garante de que, assim, o país entrará na modernidade climática parlamentar…
Com esta declaração, Portugal fica no grupo dos 13 países verdadeiramente “avançados” que “declararam”, e esta Assembleia mostra assim como não tem ponta de sentido do ridículo nem faz tangente a um átomo de noção das verdadeiras prioridades nacionais.
No mapa do ranking da fiscalidade mundial, o Estado português está acima da média da OCDE; quanto a liberdade económica, os gráficos mostram a insuficiência; só mesmo este Parlamento para estar preocupado com o clima, ignorando os outros bloqueios de toda a natureza que atingem gerações e forçam migrações.
Genuína representação eleitoral e identificação com as prioridades nacionais, afinal, estão intimamente ligadas.
Jurista
Escreve quinzenalmente