NBA. A primeira final em território “desconhecido”

NBA. A primeira final em território “desconhecido”


À 73.ª edição, a maior liga de basquetebol do mundo terá a decisão a começar fora dos Estados Unidos. Mérito dos Toronto Raptors, que desafiaram todas as previsões iniciais e asseguraram uma inédita presença na finalíssima contra os todo-poderosos Golden State Warriors


Os amantes da NBA, aqueles acérrimos, que não se importam de ficar acordados noite dentro para ver os grandes (e os mais ou menos grandes) jogos, têm esta madrugada a melhor das razões para mais uma noitada. Trata-se apenas e só do jogo 1 da final, numa decisão absolutamente inédita: de um lado, os Golden State Warriors, dominadores totais do jogo nos últimos anos (bicampeões em título e campeões três vezes nas últimas quatro temporadas); do outro, os Toronto Raptors, que chegam pela primeira vez na sua história a este patamar.

Esta será, aliás, a primeira final em 73 anos de liga norte-americana que será realizada, em parte, fora dos Estados Unidos. A tradição de equipas canadianas a atuar na NBA não é longa – apesar de a primeira, os Toronto Huskies, ter surgido logo no primeiro ano de vida da liga, em 1946, ainda sob o nome de Basketball Association of America (BAA). Os Huskies, porém, viriam a durar apenas essa temporada, e só na década de 90 voltou a haver uma aposta mais declarada da NBA no mercado canadiano.

Foi assim que, em 1995, se formaram os Toronto Raptors e os Vancouver Grizzlies. A franquia Grizzlies acabou por não se firmar no Canadá e seria deslocada para a cidade norte-americana de Memphis em 2001. Os Raptors, pelo contrário, sobreviveram do outro lado da fronteira, fruto do maior apoio financeiro, que permitiu criar equipas mais competitivas e até contar com alguns nomes grandes do jogo, como Vince Carter ou Chris Bosh.

Nenhum deles conseguiu, porém, o que Kawhi Leonard viria a alcançar este ano. Chegado dos San Antonio Spurs, onde havia vencido a prova em 2014 (sendo o MVP da final), o extremo de 27 anos tinha nos ombros o peso de ter servido de moeda de troca para a saída de DeMar DeRozan, estrela dos Raptors durante nove temporadas – e o único jogador que alguma vez expressou o desejo de passar toda a carreira na equipa de Toronto.

O melhor do mundo? Não importa

Foi um risco, tanto para a franquia como para Leonard, mas que viria a revelar- -se totalmente acertado. Os Raptors foram a segunda melhor equipa da Conferência Este na fase regular, só atrás dos Milwaukee Bucks, e conseguiram também superar os sucessivos obstáculos nos playoffs: primeiro, os Orlando Magic (4-1), depois os Philadelphia 76ers (4-3), onde aconteceu o primeiro jogo 7 da história dos playoffs a ser decidido por um cesto no último segundo – apontado, claro está, por Leonard. E, por último, precisamente os Bucks, numa final de conferência incrível – o conjunto de Milwaukee venceu os dois primeiros jogos, mas a partir daí só deu Raptors: quatro vitórias consecutivas e o bilhete carimbado para a finalíssima.

Muitas das responsabilidades nesse apuramento couberam a Kawhi Leonard, principalmente nos dois últimos jogos em casa dos Bucks. No primeiro, aquele que permitiu aos Raptors ficar pela primeira vez em vantagem na eliminatória, Leonard fez 35 pontos e nove assistências (o maior total da carreira); no segundo, que confirmou a presença na finalíssima, foram 27 pontos e 17 ressaltos, destacando-se o icónico afundanço sobre Giannis Antetokounmpo – quase um símbolo da ultrapassagem ao grego na candidatura ao troféu de MVP (melhor jogador) das finais.

“Kawhi é o melhor jogador do mundo e estamos felizes por ele estar em Toronto”, dizia no último sábado Masai Ujiri, presidente dos Raptors, na cerimónia de entrega do troféu de campeões a Este. Menos retumbante, Kawhi retorquia: “Não me importa ser o melhor jogador. Quero é estar na melhor equipa”.

NBA já ganha à NHL e basebol

Que os Toronto Raptors sejam a melhor equipa da NBA, já é bastante mais discutível. É que do outro lado há aqueles bichos-papões de Oakland, senhores do jogo na história mais recente. Um dado que poderá jogar a favor dos menos favoritos é o facto de Kevin Durant ficar de fora do jogo 1 e poder também falhar o 2: o extremo, que já foi MVP em duas edições das finais (2017 e 2018), não joga desde o quinto jogo com os Houston Rockets, da primeira eliminatória do playoff da Conferência Oeste, devido a uma lesão no gémeo da perna direita.

Durant, ainda assim, viajou com a equipa para Toronto, pelo que a participação no segundo jogo ainda não está totalmente descartada. O técnico Steve Kerr deixou também em aberto a possibilidade de DeMarcus Cousins, lesionado desde 16 de abril, conseguir recuperar já para o primeiro jogo.

Mas, e até porque os dois primeiros jogos da finalíssima se realizam em Toronto, é inevitável apontar para aí o foco. O basquetebol nunca foi um desporto especialmente acompanhado no Canadá, mas esse é um cenário que tem vindo a mudar nos últimos anos. Atualmente são 13 os jogadores canadianos a atuar na NBA, o que faz deste o país com mais representantes a seguir aos Estados Unidos – os canadianos Anthony Bennet, em 2013, e Andrew Wiggins, em 2014, foram as primeiras escolhas do draft.

“Eu estava aqui há 25 anos, quando nos expandimos para o Canadá. E acredito que atingimos as nossas maiores esperanças e projeções para o basquetebol no Canadá”, declarou recentemente Adam Silver, o CEO da NBA, abrindo ainda as portas à introdução de nova franquia no país a longo prazo.

Os sucessivos falhanços das equipas canadianas na NHL (liga norte-americana de hóquei no gelo, o desporto preferencial no Canadá) e no basebol contribuíram também para uma maior aproximação do país aos Raptors, que com o desempenho nesta edição da NBA se tornaram finalmente uma paixão nacional. Nas próximas duas semanas, a equipa orientada por Nick Nurse e liderada dentro da quadra por Kawhi Leonard – que tem fator-casa em caso de empate na eliminatória após o jogo 6 – irá tentar capitalizar esse novo interesse: “apenas” quatro vitórias a separam da glória eterna.