O Dia do Trabalhador é normalmente associado a manifestações ou desfiles convocados e organizados pelas duas centrais sindicais do país – a CGTP e a UGT. Este ano não será diferente, com várias iniciativas em várias capitais de distrito, a UGT a concentrar esforços (e atividades lúdicas) em Braga e a CGTP a escolher Lisboa como o palco principal das iniciativas, entre o Largo do Martim Moniz e a Alameda D. Afonso Henriques. Mas quanto valem as centrais sindicais em número de pessoas sindicalizadas? A CGTP tem o maior número – 550 500 – enquanto a UGT regista 458 mil sindicalizados, ou seja, um total de 1 008 500 pessoas, mais de um milhão de cidadãos que acreditam no papel das centrais sindicais.
Estes são dados apurados relativos aos últimos congressos das duas centrais sindicais, em fevereiro de 2016, pela CGTP, e pela UGT, em 2017.
Hoje, o secretário-geral da CGTP, Arménio Carlos, fará o último discurso no 1.º de Maio enquanto líder daquela central sindical. Isto porque em fevereiro de 2020 cederá o seu lugar em nome do “rejuvenescimento e da renovação”.
Na CGTP existe uma norma interna em que os dirigentes principais não renovam o mandato quando estão a atingir a idade de reforma. É o caso de Arménio Carlos, que terá 64 anos no próximo congresso que servirá para eleger novos órgãos para os próximos quatro anos. “Não queremos um movimento sindical de reformados. Queremos um movimento sindical de trabalhadores no ativo”, explicou ao i o dirigente sindical.
O discurso de hoje em Lisboa será virado para a nova legislação laboral que ainda está em debate no Parlamento. Além da tradicional saudação “aos trabalhadores pela resistência que têm oferecido”, a CGTP diz que a luta se “exige e justifica” perante “novas formas de exploração dos trabalhadores decorrentes da nova legislação que está em discussão na Assembleia da República e que foi apresentada pelo PS” , antecipou ao i o líder da CGTP-IN.
A lista de reivindicações voltará a ser a do aumento “geral dos salários, o aumento do Salário Mínimo Nacional”, bem como o “combate muito forte à precariedade, exigindo-se a estabilidade e segurança no emprego como elemento determinante, para a organização da vida pessoal e familiar dos trabalhadores”. Neste quadro incluiu-se ainda a regulação dos horários, a redução do horário de trabalho para as 35 horas, “sem diminuição do salário”.
Do lado da UGT, Carlos Silva diz que o grande tema do seu discurso em Braga será a “valorização dos trabalhadores e dignificar o trabalho. Se é preciso valorizar os trabalhadores é porque sentimos que tem havido uma desvalorização dos mesmos”, começou por explicar o líder da UGT. Depois, o sindicalista concorda com o Presidente da República de que é preciso mais ambição. “Achamos que o Governo, o país deveria ter mais ambição. E uma dessas ambições era dar melhores condições de vida e de trabalho aos portugueses, designadamente, nos salários. E isso não se viu”.
Hoje também será o dia de deixar um desafio aos patrões para o diálogo social. “Com que sindicatos querem dialogar?” é a pergunta que Carlos Silva promete fazer sobretudo numa altura em que se discute o aparecimento de sindicatos fora do alcance ou colaboração das duas centrais sindicais.
Os sindicatos independentes As duas centrais sindicais consideram que a emergência de novos sindicatos fora da órbita, tanto da CGTP, como da UGT, obriga a um discurso de diálogo e proximidade. Arménio Carlos, por exemplo, começa por considerar que “a criação desses sindicatos não é nova. A esmagadora maioria não se conseguiu impor”, ao longo dos tempos. Contudo, reconhece que é preciso “continuar uma linha de trabalho para unir e não para dividir”. Já Carlos Silva, da UGT, responde às críticas de que as centrais sindicais têm tendências político-partidárias. O dirigente também é membro do PS, tal como o seu antecessor João Proença. “ Onde é que nos inibiu de criticar um Governo? Não temos feito outra coisa [ao longo dos anos]”. E acrescenta: “Nunca fomos controlados por qualquer Governo”, assegura o dirigente sindical para rebater argumentos de falta de independência das centrais sindicais, neste caso, da sua, a UGT. Por fim, Carlos Silva recorda que mesmos os sindicatos afetos à UGT têm a sua autonomia. O enfermeiro Carlos Ramalho, do SINDEPOR, informou Carlos Silva de que pretendia fazer uma greve de fome junto ao Palácio de Belém, e o dirigente sindical desaconselhou-o. Carlos Ramalho manteve, contudo, a iniciativa.
“Vamos fazer o caminho das pedras. É isso que queremos fazer”
Lúcia Leite dirige a Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros (ASPE) e foi um dos rostos das convocatórias das greves dos enfermeiros. O seu sindicato teve os estatutos aprovados a 29 de junho de 2017, ou seja, é muito recente e é apenas mais um dos cerca de 20 novos sindicatos fundados nos últimos dois anos, a maioria sem ligações à UGT ou à CGTP. A dirigente sindical diz que se tratou de uma opção consciente. “Vamos fazer o caminho das pedras. É isso que queremos fazer”, afirmou ao i Lúcia Leite.
O caminho de que fala é o de não ter o apoio e a estrutura de uma central sindical com equipas jurídicas, histórico de respostas, análises de especialistas a trabalhar com o sindicato. “As centrais sindicais têm uma grande utilidade para os sindicatos. Os apoios dados aos jovens sindicatos são muito importantes. Mas pretendemos prescindir dessa ligação porque há uma tendência político-partidária a que as centrais sindicais estão ligadas”, prossegue Lúcia Leite.
A responsável acrescenta que as “centrais sindicais atuam mais ou menos em função da cor política de um determinado Governo num determinado momento. Até parece que os problemas se alteram em função das cores políticas de um Governo. Não queremos que isso aconteça”, acrescenta Lúcia Leite, que não revela quantos associados tem a sua associação sindical. “É segredo de Estado”, afirma.
De facto, desde 2017 foram criados 24 novos sindicatos, segundo avançou o Expresso, mas apenas três são afetos às duas centrais sindicais. O SETAAB (Sindicato Nacional dos Traba-lhadores da Agricultura, Floresta, Pesca, Turismo, Indústria Alimentar, Bebidas e Afins) e o SINDEPOR (Sindicato Democrático dos Enfermeiros de Portugal) aderiram à UGT e a CGTP assinalou ao i o registo da adesão de um novo sindicato: o Sindicato dos Trabalhadores de Arqueologia.
Na lista de novos sindicatos está uma estrutura que acabou por ficar conhecida dos portugueses há duas semanas, a do Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas.
Criado há menos de um ano, o sindicato não tem mais do que 750 associados, mas a greve por melhores salários criou grandes constrangimentos há duas semanas, com bombas de gasolina a esgotarem combustíveis, racionamento no abastecimento de automóveis particulares e uma corrida ao gasóleo e à gasolina. Este sindicato, tal como o de Lúcia Leite, ficou fora da órbita das duas centrais sindicais.
Pedro Pardal Henriques, vice–presidente daquela estrutura, explica ao i que “estes motoristas não se reveem na forma como as centrais sindicais têm lutado pelos seus interesses ao longo destes anos, razão pela qual promoveram a criação deste sindicato”. Mais: boa parte dos motoristas que fizeram greve já estiveram ligados a sindicatos das grandes centrais sindicais, designadamente da FECTRANS, mas não se identificavam com a “ideologia ou a forma como lutam pelos seus interesses”. Questionado pelo i se os motoristas do seu sindicato terão alguma iniciativa hoje para assinalar o 1.o de Maio, o dirigente disse não ter nada previsto, até porque muitos trabalharão neste dia.