O Sri Lanka foi ontem palco de uma nova explosão, mostrando que a ameaça terrorista continua bem viva no país.
Uma carrinha com três engenhos explosivos detonou nas proximidades da igreja de Saint Anthony, em Colombo, capital do país. Os engenhos explodiram enquanto uma equipa de minas e armadilhas da polícia cingalesa os tentava desarmar e, pouco depois, 87 detonadores foram descobertos na principal estação de autocarros da capital. Entretanto, a caça aos responsáveis por um dos piores atentados terroristas de sempre decorriam por todo o país. “A carrinha explodiu quando a unidade de desarme de bombas do STF [Força Tarefa Especial] e da força aérea tentavam desarmá-la”, contou uma testemunha à Reuters. Segundo a AFP, ninguém ficou ferido.
Também se soube ontem que o número de vítimas mortais subiu para 290, entre os quais dezenas de turistas, com outras 500 a terem ficado feridas nas sete explosões de domingo. Entre os mortos encontra-se um português, Rui Lucas, de 31 anos e natural de Viseu, que estava com a mulher em lua-de-mel. A viúva regressou ontem a Portugal.
Outro dos casos conhecidos foi o de um milionário dinamarquês, Anders Holch Povlsen, que perdeu três dos quatro filhos num dos ataques. Holch Povlsen é dono de 1% do solo total da Escócia, além de ser o maior acionista da empresa de roupa Asos. E dois espanhóis, Alberto Chaves Gómez, de 31 anos, e a sua namorada, María González Vicente, de 32 anos, também perderam a vida quando o hotel Kingsbury, onde estavam alojados, foi atingido por uma das explosões. Vicente tinha ido ter com o namorado para passarem alguns dias juntos.
Hotéis e igrejas, com centenas de fiéis a celebrarem a missa, foram os alvos no domingo de Páscoa. E, segundo uma análise do Guardian, é um dos piores atentados de sempre na história – os atentados de 11 de setembro de 2011, nos Estados Unidos, quando morreram 2977 pessoas, estão no topo da lista.
Com a mortandade registada e a ameaça bem presente, o Governo cingalês decidiu declarar o estado de emergência a partir da meia-noite de ontem, dando à polícia e militares mais poderes para deterem e interrogarem suspeitos. Desde domingo que as autoridades têm estado no terreno numa megaoperação para capturar os responsáveis pelos atentados, tendo já detido 24 pessoas.
Ontem, o porta-voz do Governo, Rajitha Senaratne, revelou que a organização terrorista jihadista National Thowheed Jamath é a responsável pelos atentados, ainda que não os tenha reivindicado. Por ser uma organização terrorista local, o Executivo não acredita que tenha agido sem apoio de organizações congéneres internacionais: “Não acreditamos que estes ataques tenham sido levados a cabo por um grupo de pessoas limitado ao país”, disse Senaratne. O grupo, recente no país, é um forte defensor do movimento jihadista global, destacando-se pelo ódio à população budista, sendo responsável pela vandalização de muitas estátuas dessa religião. Quatro dos seus membros foram detidos em janeiro pelas autoridades e tudo dava a entender que a organização poderia escalar as suas atividades, como veio a acontecer e os serviços secretos sabiam.
Se não agiram sozinhos, as autoridades cingalesas também não atuaram quando foram alertadas para a eventualidade de atentados terroristas poderem acontecer em breve no país. “Catorze dias antes destes incidentes terem ocorrido, fomos informados destes incidentes”, explicou o mesmo porta-voz numa conferência de imprensa. “A 9 de abril, o chefe dos serviços de informações escreveu uma carta e nesta carta estavam escritos muitos dos nomes dos membros da organização terrorista”, acrescentou.
Com esta revelação, o Governo atribui as responsabilidades ao Presidente do Sri Lanka, Maithripala Sirisena, por o primeiro-ministro cingalês, Ranil Wichremesinghe, e os seus ministros não terem estado nas reuniões do conselho nacional de segurança, liderados pelo chefe de Estado. Ao não estar presente, continua o porta-voz, o Governo não pôde tomar as devidas precauções para evitar os atentados. “O primeiro-ministro não foi informado destas cartas e revelações”, disse Senaratne, garantindo que o Executivo “não se está a esquivar das responsabilidades” mas apenas a revelar os “factos”.
O primeiro-ministro e o Presidente estão de costas voltadas desde outubro, quando o segundo tentou afastar o primeiro no que muitos consideraram ser um “golpe”, dando origem a uma crise constitucional. O chefe de Estado afastou o líder do Governo, mas dois meses depois voltou à liderança do Executivo por o aliado do Presidente, Mahinda Rajapaksa, não ter conseguido uma maioria parlamentar para se manter na liderança do novo Governo. Desde aí que os dois líderes estão de costas voltadas e, agora, teme-se que os atentados deem azo a uma luta pelo poder, politizando-os.
No domingo, explica o Guardian, Wickremesinghe procurou convocar o conselho de segurança, mas os militares recusaram-se a comparecer sem a autorização do Presidente, que estava no estrangeiro na altura.