Decidiu separar-se do seu companheiro. As discussões eram muitas, a falta de paciência foi acumulando e o tempo a sós era mais valioso do que aquele passado com a pessoa com quem antes partilhava tudo. Acha que um curso de uma hora poderia mudar tudo isto? Na Dinamarca acham que sim. Será que esta ideia teria futuro em Portugal?
A Dinamarca tem uma das taxas mais altas de divórcios da Europa Ocidental – em 2017, quase metade dos casamentos acabaram em divórcio. Por isso, desde o passado dia 1 de abril, os casais dinamarqueses que têm filhos são obrigados por lei a frequentar um curso antes de oficializarem a separação. Naquele país, é possível dar entrada de um pedido através da Internet, o que faz do divórcio um processo muito simples e rápido. Perante este mecanismo tão fácil, o Governo quis criar uma ferramenta que fosse igualmente acessível e permitisse aos casais pensarem mais um pouco antes de tomarem uma decisão drástica.
Assim, a Universidade de Copenhaga ajudou a criar este curso, que está disponível através da plataforma online ‘Cooperação após o divórcio’. Em declarações à agência France-Presse, o ministro da Infância e Assuntos Sociais explicou que “o curso digital responde a algumas das questões mais essenciais que surgem durante o divórcio” – trata-se de um programa com 17 módulos, que oferecem soluções para situações mais delicadas, como a organização de festas de aniversário dos filhos. O objetivo é ajudar as partes a refletirem sobre como serão as suas vidas se optarem por um futuro separados. Os pais que não sejam casados também podem aceder a este programa gratuitamente mediante solicitação.
De acordo com Gert Martin Hald, um dos investigadores daquela universidade dinamarquesa que ajudou a desenvolver o curso, este pode ter a duração de uma ou 15 horas, dependendo das necessidades do casal. “Alguns divórcios são prematuros. Agora terão um período de reflexão. O objetivo é contrariar os efeitos adversos da separação e não desencorajar o divórcio em si”, explicou Martin Hald à Euronews.
O especialista explica que os investigadores estudaram o comportamento de 2500 divorciados que usaram este programa e registaram resultados muito positivos: “Quisemos perceber se [o programa] ajudava a diminuir os níveis de depressão e ajudava a melhorar a saúde física das pessoas. Ficou claro que, num período de um ano, este programa tem um efeito positivo”, disse à Euronews.
Uma boa ideia para Portugal? O psicólogo Quintino Aires acredita que aplicar uma ferramenta destas em Portugal seria “uma excelente ideia”. “Não nascemos ensinados, o mundo tem de nos ser mostrado. Temos uma história de 40 anos de divórcio, por isso não temos tempo suficiente para podermos orientar-nos por aquilo que os nossos pais e avós fizeram”, explicou ao i.
O psicólogo diz que ferramentas como estas podem ajudar os casais a perceberem o que implica esta decisão. Para alguns, pode até funcionar como fator dissuasor, mas para outros pode ajudar a perceber que o mundo não acaba com um divórcio: “Se perguntarmos a alguém que está na dúvida se deve divorciar-se ou não, aquilo que a preocupa é o dinheiro. Este é um fator que influencia muito a decisão. Um segundo aspeto é como é que irá lidar com os filhos a partir dali. Ponho a minha mão no fogo como uma percentagem enorme de pré-divorciados não parou para pensar como será a gestão dos filhos”, afirmou Quintino Aires, explicando que programas como estes podem não ser suficientes para acabar com os problemas, mas são “passos de ouro” para ajudar cada vez mais pessoas a tomarem as decisões acertadas.
Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), entre os anos 2013 e 2017 houve 113235 divórcios – em 2017, houve menos 854 do que em 2013. Quintino Aires diz que, há 10 anos, a maioria dos casais que apareciam no seu consultório para falarem sobre divórcio tinham entre 25 e 35 anos. Hoje, as idades andam entre os 45 e os 60. Quanto às principais causas, o psicólogo aponta a falta de comunicação e à vontade para se dizer o que se gosta e não se gosta são duas das principais causas de divórcios em Portugal.
“Além disso, ainda não aprendemos a ver se queremos casar ou não. As pessoas ainda se casam muito ‘porque sim’, sem avaliarem se são ou não compatíveis com o outro. Acho incrível que tenhamos chegado ao século XXI e ainda se diga que os opostos se atraem. Quando antigamente não era preciso conviver, bastava fazer com que o dinheiro chegasse a casa, não havia problema. Numa fase mais evoluída, em que é suposto convivermos, se as pessoas forem muito diferentes não o conseguem fazer”, acrescenta.