Outros vieram e fizeram…


Politicamente, Portugal parece de novo viver um certo tempo em que o diagnóstico estava feito, o consenso era geral sobre o que fazer, mas houve quem não fizesse o que devia.


“Como comprovámos dolorosamente, não recuperamos competitividade por via do empobrecimento coletivo, da precarização do trabalho ou do sacrifício da qualidade e proximidade de serviços públicos. A austeridade não gera crescimento, nem a desvalorização interna prosperidade”.

Este diagnóstico de 2015 não se pode dizer que esteja errado, mas faz supor que a nova terapêutica que aí vinha seria um sucesso. Verdade é que o estado em que se encontra o país em 2019 não mostra menos pobreza nem menos precariedade, nem menos emigração, nem mais qualidade dos serviços públicos, mais crescimento ou mais prosperidade.

“As reformas que temos de fazer são outras e exigem persistência e continuidade no investimento no conhecimento e na inovação, na modernização do tecido empresarial e da administração pública, na valorização do território e dos seus recursos, na promoção da saúde, no reforço da coesão e na redução das desigualdades”.

Uma vez mais, as palavras de 2015 apontavam à correção e entrada num trilho que merecia consenso. Mas a verdade é que, em 2019, Portugal não alterou o perfil do seu aparelho produtivo e o tecido empresarial queixa-se da falta de política económica na ação governativa; a administração pública não mudou nas demoras da justiça ou da burocracia em geral; o território, esse, é diariamente não só ignorado como insultado coletivamente, como no caso recente do privilégio aos passes apenas nas áreas metropolitanas, enquanto subsistem as portagens.

“Só assim será duradouramente sustentável um novo impulso para a convergência com a União Europeia e o objetivo essencial de qualquer boa governação de assegurar finanças públicas equilibradas, que este Governo prosseguirá através da exigente trajetória de redução do défice orçamental e da dívida pública no ciclo desta Legislatura”.

De tudo o que fica transcrito de 2015, onde nos reconhecemos em 2019? No cumprimento do défice orçamental, cumprimento ilusório, embusteiro, falseado com base nas cativações à margem do controlo democrático orçamental, indutor de degradação de serviços, equipamentos e infraestruturas.

O governo tem vindo a celebrar o cumprimento fundamentalista (porque tendo margem de variação, face à situação do Estado, quis ir além dos tratados) do défice orçamental como matriz da sua governação. Tal estratégia só é compreensível por uma visão vaticana da política europeia em campanha eleitoral, na escassez de obra feita, ignorando a perceção geral de que o país que contestava a troika externa é o mesmo país que não percebe as práticas desta troika interna, acantonada na “frente de esquerda”.

As palavras do primeiro-ministro que se transcrevem neste texto, no momento da tomada de posse deste governo, em 2015, são a prova de um absoluto fracasso no quadro da situação geral do país.

Fracasso no que significa de incapacidade perante outros objetivos que ele próprio enunciou, onde era fundamental uma via de reformas e consensos com outros partidos para o futuro do país.

E, aqui chegados, a questão fundamental que o dia-a-dia de um ano eleitoral em curso mostra é a total ausência de uma visão prospetiva para o país, perguntando-se a maioria dos portugueses (maioria porque maior que quem vota) de onde pode vir o impulso que reúna, à volta de outros objetivos que todos enunciam e usam para colorir discursos, o consenso alargado para objetivos para além da legislatura.

Não é possível Portugal alcançar o dobro da média europeia, em vez de este ano não passar de 1,7% de crescimento do PIB? Não é possível dialogar com Bruxelas sobre como atenuar assimetrias e negociar medidas adequadas, crescimento sustentado e maior que a média europeia? Não é possível devolver rendimentos por via fiscal, reestruturando o Estado e colocando o rendimento do trabalho dos portugueses no bolso dos portugueses, e não o afetando ao desperdício do mesmo Estado? Quantos anos os portugueses ainda irão conviver com uma justiça, na sua generalidade, sinónimo de decisões fora de prazo razoável para ser justiça em tempo útil ? Como devolver aos territórios fora das áreas metropolitanas povoamento e atividade económica? Como renovar a confiança na vida política, reformando as instituições e o acesso à política, tornando os agentes políticos representantes uninominais de quem os elege e não dos chefes partidários? Quando se reforma para acabar com os arrivistas e as arrivistas partidárias de anonimato valorizado, pelo mero salto no escuro das circunstâncias e da irresponsabilidade partidária?

As palavras do primeiro-ministro em 2015 e a situação do país hoje, conjugadas com as sondagens que vão saindo, significam que Portugal não se revê na governação, na oposição, no estado do país.

Politicamente, Portugal parece de novo viver um certo tempo em que o diagnóstico estava feito, o consenso era geral sobre o que fazer, mas houve quem não fizesse o que devia.

Outros vieram e fizeram…

 

Jurista, Escreve quinzenalmente


Outros vieram e fizeram…


Politicamente, Portugal parece de novo viver um certo tempo em que o diagnóstico estava feito, o consenso era geral sobre o que fazer, mas houve quem não fizesse o que devia.


“Como comprovámos dolorosamente, não recuperamos competitividade por via do empobrecimento coletivo, da precarização do trabalho ou do sacrifício da qualidade e proximidade de serviços públicos. A austeridade não gera crescimento, nem a desvalorização interna prosperidade”.

Este diagnóstico de 2015 não se pode dizer que esteja errado, mas faz supor que a nova terapêutica que aí vinha seria um sucesso. Verdade é que o estado em que se encontra o país em 2019 não mostra menos pobreza nem menos precariedade, nem menos emigração, nem mais qualidade dos serviços públicos, mais crescimento ou mais prosperidade.

“As reformas que temos de fazer são outras e exigem persistência e continuidade no investimento no conhecimento e na inovação, na modernização do tecido empresarial e da administração pública, na valorização do território e dos seus recursos, na promoção da saúde, no reforço da coesão e na redução das desigualdades”.

Uma vez mais, as palavras de 2015 apontavam à correção e entrada num trilho que merecia consenso. Mas a verdade é que, em 2019, Portugal não alterou o perfil do seu aparelho produtivo e o tecido empresarial queixa-se da falta de política económica na ação governativa; a administração pública não mudou nas demoras da justiça ou da burocracia em geral; o território, esse, é diariamente não só ignorado como insultado coletivamente, como no caso recente do privilégio aos passes apenas nas áreas metropolitanas, enquanto subsistem as portagens.

“Só assim será duradouramente sustentável um novo impulso para a convergência com a União Europeia e o objetivo essencial de qualquer boa governação de assegurar finanças públicas equilibradas, que este Governo prosseguirá através da exigente trajetória de redução do défice orçamental e da dívida pública no ciclo desta Legislatura”.

De tudo o que fica transcrito de 2015, onde nos reconhecemos em 2019? No cumprimento do défice orçamental, cumprimento ilusório, embusteiro, falseado com base nas cativações à margem do controlo democrático orçamental, indutor de degradação de serviços, equipamentos e infraestruturas.

O governo tem vindo a celebrar o cumprimento fundamentalista (porque tendo margem de variação, face à situação do Estado, quis ir além dos tratados) do défice orçamental como matriz da sua governação. Tal estratégia só é compreensível por uma visão vaticana da política europeia em campanha eleitoral, na escassez de obra feita, ignorando a perceção geral de que o país que contestava a troika externa é o mesmo país que não percebe as práticas desta troika interna, acantonada na “frente de esquerda”.

As palavras do primeiro-ministro que se transcrevem neste texto, no momento da tomada de posse deste governo, em 2015, são a prova de um absoluto fracasso no quadro da situação geral do país.

Fracasso no que significa de incapacidade perante outros objetivos que ele próprio enunciou, onde era fundamental uma via de reformas e consensos com outros partidos para o futuro do país.

E, aqui chegados, a questão fundamental que o dia-a-dia de um ano eleitoral em curso mostra é a total ausência de uma visão prospetiva para o país, perguntando-se a maioria dos portugueses (maioria porque maior que quem vota) de onde pode vir o impulso que reúna, à volta de outros objetivos que todos enunciam e usam para colorir discursos, o consenso alargado para objetivos para além da legislatura.

Não é possível Portugal alcançar o dobro da média europeia, em vez de este ano não passar de 1,7% de crescimento do PIB? Não é possível dialogar com Bruxelas sobre como atenuar assimetrias e negociar medidas adequadas, crescimento sustentado e maior que a média europeia? Não é possível devolver rendimentos por via fiscal, reestruturando o Estado e colocando o rendimento do trabalho dos portugueses no bolso dos portugueses, e não o afetando ao desperdício do mesmo Estado? Quantos anos os portugueses ainda irão conviver com uma justiça, na sua generalidade, sinónimo de decisões fora de prazo razoável para ser justiça em tempo útil ? Como devolver aos territórios fora das áreas metropolitanas povoamento e atividade económica? Como renovar a confiança na vida política, reformando as instituições e o acesso à política, tornando os agentes políticos representantes uninominais de quem os elege e não dos chefes partidários? Quando se reforma para acabar com os arrivistas e as arrivistas partidárias de anonimato valorizado, pelo mero salto no escuro das circunstâncias e da irresponsabilidade partidária?

As palavras do primeiro-ministro em 2015 e a situação do país hoje, conjugadas com as sondagens que vão saindo, significam que Portugal não se revê na governação, na oposição, no estado do país.

Politicamente, Portugal parece de novo viver um certo tempo em que o diagnóstico estava feito, o consenso era geral sobre o que fazer, mas houve quem não fizesse o que devia.

Outros vieram e fizeram…

 

Jurista, Escreve quinzenalmente