Delação premiada. JSD força PSD a debater proposta que divide o partido

Delação premiada. JSD força PSD a debater proposta que divide o partido


Presidente da jota avisou Rui Rio que iria agendar proposta, mas vice social-democrata diz que ela gera “distorções”


A JSD vai apresentar em “meados de janeiro” a sua proposta de delação premiada no parlamento, obrigando o PSD a pronunciar-se sobre a iniciativa que divide o partido. A medida consta do pacote de propostas sobre o reforço do combate à corrupção, divulgado em agosto, pela JSD, mas a líder da estrutura só irá entregar, para já, a proposta que mais debate e polémica provocam, porque “os pacotes [legislativos] completos não dão em nada”.

Ao i, a presidente da JSD, Margarida Balseiro Lopes, lembrou que apresentou as suas propostas ao líder do partido, Rui Rio, e ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, em agosto. Na altura, avisou Rio de que tencionava agendá-las no parlamento e assim será no arranque do ano novo, o último da legislatura.

A medida, que a JSD designou de “acordos premiados de colaboração com a justiça”, prevê contrapartidas para quem infringe a lei, mas queira colaborar. Este ponto é controverso e tem na vice-presidente do PSD e ex–bastonária dos advogados, Elina Fraga, uma das maiores críticas da medida. A título pessoal, Elina Fraga considera que “no nosso ordenamento jurídico já estão previstas formas de levar em consideração, na determinação da medida da pena, o que é um ato voluntário de colaboração com a justiça”. Qualquer alteração à legislação para dar corpo à “delação premiada que, existe, por exemplo, no Brasil, leva a distorções que não são próprias de um Estado de direito democrático como o nosso”, defendeu a dirigente 

Elina Fraga entende, contudo, que “todas as matérias submetidas à Assembleia da República por qualquer deputado devem merecer a devida reflexão. Nesse sentido, se é submetida, deve ser discutida”. A proposta de delação premiada da JSD, que tem o apoio da ex-ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, prevê que a colaboração deve ter um “registo de audiovisual”, além de “datilografada”. Acresce que terá de ser feita perante o advogado do infrator e o Ministério Público, e o acordo deve ser “validado por um juiz de instrução”. Esta é, pelo menos, a versão que consta no documento de 51 páginas de propostas para o combate à corrupção, entregue ao líder do PSD e a Belém. Margarida Balseiro Lopes assegurou ao i que o documento ainda está a ser fechado, mas responde às críticas antecipadas à proposta, designadamente do constitucionalista Vital Moreira. “Diria que é precipitado estar a fazer essas avaliações”, afirmou a deputada ao i. 

Vital Moreira considerou, no blogue Causa Nossa, que “embora o acordo tenha de ser homologado pelo juiz e a denúncia tenha de ser corroborada por outras provas, em geral fornecidas pelo próprio denunciante, a verdade é que não se vê como é que um tal mecanismo, pelo menos na sua versão brasileira, possa ser considerado compatível com a Constituição processual penal em Portugal”. O antigo eurodeputado, eleito pelo PS, acrescenta que “a vaga de populismo emergente (…) não poupa os jovens políticos, mesmo nos moderados partidos tradicionais de governo em Portugal”. No PS, a ideia também não tem muitos adeptos. “Transferir para o Ministério Público essa avaliação, através da colaboração de delatores, seria inconstitucional”, defendeu Filipe Neto Brandão, vice-presidente da bancada do PS, citado pelo “DN”, o que significa que muito dificilmente a proposta terá algum sucesso na atual legislatura.

Mendes irrita Rio As propostas para a justiça têm sido um dos pontos mais polémicos da direção de Rui Rio e o comentador televisivo Marques Mendes lançou domingo, na SIC, a frase que irritou o presidente social-democrata: “Em Portugal há dois políticos iguais na vontade de controlar a justiça e a comunicação social: José Sócrates e Rui Rio. Nessa matéria, eles são verdadeiros irmãos siameses.” O antigo líder do PSD referia-se ao pacote da justiça, mais ou menos secreto, da direção social-democrata, que altera a composição do Conselho Superior de Magistratura, e dá mais peso à sociedade civil e à escolha de figuras pela classe política. “Podem até ser diferentes nas intenções e no caráter, mas nas ideias são iguais. Um e outro gostavam de poder dizer o que se investiga, como se investiga e quando se investiga”, atirou Mendes, comparando Rui Rio e José Sócrates, o antigo primeiro-ministro socialista. 

Ora, Rui Rio respondeu no Twitter que “andam por aí a agitar que quero controlar o Ministério Público, porque defendo que haja uma maioria de personalidades da sociedade civil no seu Conselho Superior. Como no Conselho Superior da Magistratura já assim é, para essas mentes, se calhar, eu já controlo hoje a Magistratura Judicial”.

Horas antes, o vice-presidente do PSD Salvador Malheiro também já tinha atacado Mendes nas redes sociais: “Ao comparar Rui Rio a Sócrates, Luís Marques Mendes foi longe demais! Que vergonha! Luís Marques Mendes perdeu toda a credibilidade junto dos portugueses!” Também Álvaro Amaro, presidente dos Autarcas Sociais–Democratas (ASD), citado pela Lusa, quis afastar qualquer comparação de Rio com Sócrates para argumentar que o líder do PSD é uma pessoa “idónea” e de “caráter”.