Embora não sendo jurista, parece-me bastante elementar compreender o que se entende por personalidade jurídica e, por consequência, a aptidão para se adquirir direitos e deveres.
E no nosso ordenamento interno está claro: as pessoas, ao nascerem, ganham personalidade jurídica. Tudo o resto é pura ficção ou, com boa vontade, desejo de alargamento da personalidade jurídica a outros seres vivos.
Esta é, para o bem e para o mal, a única conclusão que podemos tirar enquanto Estado de direito.
Outra coisa completamente diferente mas naturalmente aceitável, legítima e meritória é a defesa dos animais. E pelo simples facto de não se enquadrarem na definição jurídica de pessoas e, consequentemente, não terem direitos, porventura ainda mais se justificam ações de defesa dos mesmos contra maus-tratos, abandonos ou qualquer outro quadro lesivo que ponha em causa a sua integridade e bem-estar. Agora, falar em direitos dos animais é, juridicamente, um absurdo.
Posto isto, resta-nos uma abordagem: como se deve defender os animais?
Já existem vários quadros legais que na defesa dos animais penalizam legalmente as pessoas. Não poderia estar mais de acordo e subscrever que, infelizmente, nem todas as pessoas têm a capacidade de ter um animal de estimação e, por essa razão, acho adequado que existam penalizações legais sempre que maltratarem, abandonarem ou desconsiderarem o bem-estar de um animal.
Agora, elevar esta visão para a criação de uma espécie de milícia ou braço armado dos defensores dos animais? Não poderia estar mais em desacordo.
Há umas semanas fomos surpreendidos com a existência de uma tal associação denominada Intervenção e Resgate Animal (IRA). Não sei se os seus criadores, impulsionadores e, aparentemente, horda de seguidores e apoiantes têm noção do que a sigla IRA representa?
Eu explico: IRA, ou Irish Republican Army, foi um grupo paramilitar católico que pretendia separar a Irlanda do Norte do Reino Unido para a reintegrar na República da Irlanda. Criado em 1919, durante quase um século (até 2005, altura em que anunciou o seu fim) perseguiu e aterrorizou, através de atos terroristas (ataques bombistas e ações de guerrilha), protestantes, políticos unionistas e representantes do governo britânico, matando milhares de pessoas.
Ora, criar uma associação para defender os animais e apelidá-la de IRA, das duas uma, ou é ignorância ou é, objetivamente, com intenção de criar um movimento violento e terrorista.
A julgar pelas imagens e vídeos divulgados, e atendendo à indumentária e acessórios dos protagonistas, a conclusão é óbvia: não têm credibilidade e a forma como se dispõem a defender os animais só pode ter, da parte dos partidos políticos e das diferentes instituições do Estado, uma única posição: reprovação total!
A começar pelo PAN, cuja posição deixa muito a desejar, e cito: “O PAN não tem qualquer ligação ou relação com esta entidade que seja diferente de todas as outras.” Acrescenta desconhecer “as alegadas formas de atuação à margem da lei”.
A primeira posição é compreensível e só peca por colocar este IRA ao nível de “todas as outras”. A segunda, do ponto de vista jurídico, é lógica. Contudo, o que gostaria de ter visto era uma total reprovação da forma folclórica e de extremo mau gosto como os supostos membros deste grupo se fazem apresentar – um grupo de hooligans, de cara tapada, de postura agressiva, intimidatória, exibindo armas e fazendo saudações nazis.
Não acho de todo aceitável que tal não seja alvo de reprovação imediata e inequívoca. É tão reprovável a pessoa que maltrata um animal como um marginal que se esconde atrás de uma máscara!
Os animais não têm personalidade jurídica e, por essa razão, devemos unir esforços na defesa do seu bem-estar. Não reprovar movimentos como o IRA é um retrocesso enorme na defesa do que alguns consideram os direitos dos animais.
Escreve à quinta-feira