A Sociedade Nacional de Belas-Artes acolhe a partir de hoje, e até dia 18 deste mês, a 1.ª edição da Feira de Arte e Antiguidades da Associação Portuguesa de Antiquários (APA). Os organizadores descrevem-na como uma feira mais “intimista” à qual os 15 participantes levam apenas as suas melhores peças. Nas vésperas de o evento abrir portas colocámos algumas questões a Isabel Lopes da Silva, também antiquária e vice-presidente da APA.
O que distingue esta feira da APA de outras que já se têm realizado, nomeadamente na Cordoaria e no Beato?
Esta feira procurou responder a uma nova realidade do mundo das antiguidades e de Portugal. A Cordoaria começou por ser Bienal num panorama onde aconteciam muitas feiras – cinco ou seis – em Lisboa. Passou a ser anual quando as outras desapareceram e agora lançámos este modelo no centro da cidade, uma feira mais pequena onde os antiquários terão de escolher as suas melhores peças. É também uma feira que procura estar mais acessível a todo o género de públicos, quer pelo horário escolhido, quer pela localização. Procurámos fazer uma feira de alta qualidade, com comissões de peritagem que tiveram acesso aos objetos, os quais só com o aval dos peritos puderam ser expostos. Desta forma o comprador tem uma dupla segurança, a do antiquário e o facto de saber que um perito independente também verificou a autenticidade da peça. Houve ainda uma sensibilização dos associados para terem uma conduta ética e mais ligada ao conhecimento das peças, tanto a nível histórico como estilístico, para deste modo estarem mais capazes de informar o comprador do que tem em mãos e qual a sua importância.
Gostaria que me falasse um pouco sobre o processo da peritagem das peças. Por vezes têm surpresas? É frequente apanharem cópias e falsificações?
A peritagem é feita por um conjunto de pessoas especializadas nas diferentes áreas representadas. As peças estão expostas e catalogadas (descritas) e os peritos analisam-nas para saber se, primeiramente, a peça corresponde à descrição apresentada pelo antiquário (época, pais de origem, técnicas de fabrico, etc.) mas também para determinar se as peças têm o grau de qualidade exigido pelos critérios da APA. Peças de má qualidade, feitas em série, cópias ou contrafações não têm lugar nas nossas feiras. A peritagem é útil tanto para o antiquário, que tem a oportunidade de ter uma opinião externa sobre as suas peças, como para o público, que sabe que a autenticidade das peças expostas foi também verificada por uma equipa de peritos independente. O processo da peritagem propriamente dito é feito com descrição e atenção a todas as partes envolvidas. No caso ser detetada alguma peça que não obedeça aos critérios de exposição das feiras da APA o antiquário é informado e a decisão dos peritos é sempre respeitada. Já houve surpresas, claro que sim, mas faz parte de um processo de aprendizagem. Estamos todos no mesmo barco e queremos todos o melhor para o mundo das antiguidades.
Esta feira conta com o apoio do Museu de Etnologia e do Museu Nacional de Arte Antiga. Que tipo de apoio é esse? Cederam peças para serem expostas, ajudaram com o seu conhecimento?
A APA acredita num diálogo alargado entre o antiquariato e o universo museológico, já que ambos possuem valências únicas para a promoção do conhecimento do património artístico mundial. Com o MNAA temos, há muitos anos, uma parceria que passa por palestras, visitas guiadas, exposição de peças do museu na feira e até já contribuímos para o restauro de uma peça do museu. Também nesse sentido, esta 1.ª edição da Feira da APA iniciou uma parceria com o Museu de Etnologia que cedeu a imagem de uma peça sua para a imagem de apresentação da feira.
Qual é o papel da APA, quais as suas competências?
A APA é uma associação sem fins lucrativos que se propõe a divulgar e valorizar o mercado das antiguidades em Portugal. Além da organização de feiras e eventos, ao longo dos últimos três anos participámos ativamente na alteração de leis que nos incapacitavam. Ainda há muito trabalho a fazer nesse sentido mas algum já foi feito e com o nosso contributo. Os antiquários são apaixonados pelas peças que compram e vendem, pois também as estudam, as restauram, as discutem e as mostram a outros colegas.
Nos últimos anos temos assistido a um maior protagonismo das leiloeiras. Estas têm ganho terreno aos antiquários? Existe algum tipo de rivalidade?
Bom… sim e não. Somos parceiros mas também concorrentes. Os leiloeiros abastecem-se nos antiquários e vice-versa, mas não só. O problema advirá da marcada diferença do ponto de vista sobre o que é, e quanto vale ou pode valer, uma antiguidade. A questão é mais complexa do que possa parecer e não quero parecer injusta para os leiloeiros mas, no meu entender, e simplificando um pouco, funcionaria assim: uma leiloeira coloca uma peça à venda por X. Se é vendida por X+1, no próximo leilão é posta à venda por X+1, mas se for vendida por X-1 no próximo leilão será posta à venda por X-1. Ou seja, baseia-se na resposta imediata que o mercado dá para a avaliação. Isto faz algum sentido mas não faz todo o sentido pois o mercado nem sempre responde corretamente, até porque nem sempre está informado sobre o que tem ali à sua frente. Não é por uma peça fantástica ser vendida por 500 euros que passa a valer 500 euros, tal como não é por uma peça péssima ser vendida por uma fortuna que ela vale uma fortuna. Os preços dos leilões oscilam e criam um valor de mercado mas é só mais um fator num sistema complexo, que os antiquários têm de ter em conta e para o qual também contribuem. Assim, o antiquário procura ser uma força de maior estabilidade no valor das peças, até porque, na maior parte dos casos, as peças são suas e conhece-as como ninguém. A rivalidade é, portanto, uma… espero que saudável concorrência onde, apesar de trabalharmos com a mesma matéria prima, temos perspetivas diferentes sobre o que temos à nossa frente.