Externato Educação Popular viola lei com ajuste direto para obras

Externato Educação Popular viola lei com ajuste direto para obras


Em 2017, a instituição fez uma adjudicação direta à Carrilobras com um valor acima de 35 mil euros para a reconstrução da antiga residência das Irmãs que geriam o externato. Estatuto das IPSS impede ajustes diretos acima dos 25 mil euros


O externato Educação Popular está a ser investigado pelo alegado pagamento de salários encapotados e pelas “ligações perigosas” – prestação de serviços de pessoas e de empresas em simultâneo na junta de freguesia de Campolide e na escola -, mas as suspeitas de irregularidades não se ficam por aqui.

De acordo com os documentos e faturas – a que o i teve acesso – o externato terá violado a lei quando realizou um ajuste direto para a realização de uma obra cujo valor ficou acima dos 25 mil euros.

Além disso, as ligações entre o presidente da junta de freguesia de Campolide, André Couto (PS), que até junho foi vice-presidente do externato, com Nuno Rocha (PS) – que tem uma empresa que presta serviços de contabilidade ao externato – também se estendem a outras empresas.

Violação da lei O dossier de documentos que faz parte da queixa entregue no Ministério Público (que deu origem a uma investigação) e que levou a uma auditoria financeira do Instituto de Segurança Social revela que entre agosto e novembro de 2017 foram passadas seis faturas à empresa de construção Carrilobras – um total de 35.597,85 euros, incluindo IVA. 

Este foi o custo da obra de reconstrução do edifício que funcionava como antiga residência das Irmãs da Congregação Amor de Deus sendo que a denúncia refere que não se percebe “porque foram executadas estas obras e qual a sua finalidade”. 

Os documentos dizem ainda que a obra foi adjudicada à Carrilobras através de “ajuste direto”, violando a lei por ultrapassar o valor limite que permite este processo sem recorrer a concurso público.       

O Estatuto das Instituições Particulares de Solidariedade Social (decreto-lei 172-A/2014) estipula que “a empreitada de obras de construção ou grande reparação pertencentes às instituições, devem observar o estabelecido no Código dos Contratos Públicos, com exceção das obras realizadas por administração direta até ao montante máximo de 25 mil euros”, lê-se no artigo 23.º da lei. E o mesmo artigo acrescenta ainda que “o disposto no número anterior não se aplica às instituições que não recebam apoios financeiros públicos”. O que não é o caso da Educação Popular, que recebeu mais de 1,4 milhões de euros entre 2017 e 2018 da Segurança Social, a que se somam 360 mil euros do Ministério da Educação, diz o relatório de contas do externato a que o i teve acesso.

Os documentos incluídos na queixa entregue no MP e no Instituto de Segurança Social revelam ainda que a Carrilobras realizou outras obras no externato, como é o caso da substituição do pavimento do ginásio ou da reparação do muro da escola do 2.º e 3.º ciclo.   

outras “ligações perigosas” A queixa entregue no MP revela ainda que as ligações entre André Couto (PS) e Nuno Rocha (PS) não se esgotam na contratação dos serviços da empresa de contabilidade Localgest, da qual Nuno Rocha é sócio-gerente – e que foi revelada no i de ontem. 

Os documentos referem que “depois de a Educação Popular ter celebrado um contrato com a Localgest”, através de uma avença mensal de 615 euros mensais, incluindo IVA, “André Couto [foi] convidado a trabalhar na ValorSul, onde Nuno Rocha é vogal no conselho de administração”.  

Contactado anteriormente pelo i, André Couto confirmou que exerce funções na ValorSul, sendo um dos membros da comissão de administração da empresa que serve 19 autarquias da Grande Lisboa e Oeste para o tratamento de resíduos sólidos.

E uma ata de 4 de maio de 2018 da junta de freguesia de Campolide aprova a alteração do estatuto da André Couto como presidente da junta, deixando de exercer o cargo a tempo inteiro e em regime de exclusividade para exercer funções a tempo parcial. Desta forma, André Couto conseguiu assumir funções na ValorSul sem violar a lei. 

Mas além destas duas ligações entre André Couto e Nuno Rocha há mais elos profissionais entre ambos. 

De acordo com os documentos entregues no MP, Nuno Rocha, presta serviços de contabilidade na Fundação António Luís Oliveira, criada em outubro de 2015 e presidida por André Couto desde então. 

Trata-se de uma Instituição Particular de Solidariedade Social, que funciona em Campolide, como um lar que recebe crianças e jovens entre os 6 e os 21 anos que foram retiradas aos pais por ordem do tribunal.

O último relatório de contas da Fundação António Luís Oliveira diz que chegou à instituição um total de mais de 630 mil euros em apoios e donativos de várias entidades, entre 2016 e 2017 – só a Segurança Social transferiu mais de 575 mil euros no mesmo período. 

O relatório de contas revela ainda que em 2017 André Couto recebeu uma remuneração enquanto colaborador da Fundação que preside no valor de 4.956,11 euros, a que se somam 1.771,34 euros que foram pagos em 2016. O i tentou ontem sem sucesso contactar  André Couto. 

Nuno Rocha, que é ainda tesoureiro ma junta de freguesia da Mina de Água (Amadora), cujo presidente é o seu pai, Joaquim Rocha, do PS, também já exerceu funções na junta de Campolide.