O primeiro-ministro garantiu ontem, na Golegã, que existe uma margem orçamental de 50 milhões de euros para os aumentos salariais na Função Pública, em 2019, mas o anúncio acabou por irritar os sindicatos da administração pública. Os três sindicatos do setor exigem mais verbas e a presidente do Sindicato dos Quatros Técnicos (STE), Helena Rodrigues, assumiu que “se fosse governante tinha vergonha de dizer que tinha disponível para os trabalhadores meia dúzia de tostões”.
Em declarações ao i a dirigente sindical contextualizou a crítica, contrapondo com a distribuição de 700 a 900 milhões de euros para injetar, por exemplo, no Novo Banco, em 2018. “Os trabalhadores não são um custo”, defendeu a sindicalista. Também Ana Avoila, da Frente Comum, defendeu que não existem aumentos salariais desde 2009 no setor público e “50 milhões de euros não dá para nada”. “Somos 700 mil trabalhadores e a perda que tivemos foi enorme”, justificou a dirigente sindical, afeta à CGTP, contestando ainda que o governo – primeiro-ministro e ministro das Finanças – incluem os valores de descongelamento salarial e os aumentos no mesmo pacote orçamental.
A Frente Comum acrescentou que “o aumento dos salários é de negociação obrigatória e é para todos os trabalhadores”, sendo que o sindicato propõe uma subida de 60 euros para quem ganha até 1500 euros e 4% por para quem ganha acima de 1500 euros”.
O dirigente da FESAP e socialista José Abraão, não é menos brando na crítica. “Não vale a pena tentar abanar com milhões para depois nos darem tostões. Se governar é optar, é altura de optar por aumentar os trabalhadores da Administração Pública, chegando a todos, com qualquer coisa que possa ser razoável e minimamente aceitável”, explicou ao i José Abraão para quem o governo, sobretudo o ministro das Finanças, tem de fazer uma escolha histórica: “Nós gostaríamos de ver o nome do atual ministro [das Finanças] inscrito como o ministro que põe termo ao congelamento dos salários da Administração Pública no período mais longo no pós-democracia, do que ter inscrito o seu nome no ranking abaixo de zero, que só aconteceu uma vez no anterior regime [Estado Novo], em 1969”.
O primeiro-ministro introduziu ainda mais um número na lista de hipóteses de aumentos. “Se dermos o mesmo a todos, é pouco para cada um, sobretudo para aqueles onde se justificaria haver um aumento. Temos outros cenários onde há aumentos diferenciados, reforçando mais quem tem um vencimento inferior. É por isso que se tem falado de aumento de 50 euros, para quem tem hoje a ganhar o salário mínimo nacional. Ainda são umas largas dezenas de milhares de funcionários”, disse o governante, citado pela TSF. As palavras de António Costa tiveram uma leitura pouco animadora para José Abraão. Acenar com uma subida de 50 euros nos salários mais baixos pode ser sinónimo “provavelmente de” de garantir que os rendimentos mais baixos na Função Pública incorporem já a atualização do salário mínimo nacional. “Trata-se cada vez mais de fazer do salário mínimo o salário médio”, atirou o sindicalista. Apesar das críticas, José Abraão admite “que o governo vai acomodar as condições para que possa aumentar os trabalhadores de uma forma mais digna”. Para a FESAP as regras são simples: negociar aumentos salariais em percentagens ou valores fixos para todos os funcionários e assumir que o défice possa ser de 0,2 ou 0,3%, em vez de zero, como ambiciona o ministro das Finanças, Mário Centeno.
Os sindicatos reuniram com o governo no dia 4 e regressam ao ministério das Finanças no próximo dia 10, com a promessa de uma proposta concreta de aumentos salariais.
Estas reuniões decorrem ao mesmo tempo que o executivo encerra o processo negocial com os parceiros de esquerda para fechar a proposta de Orçamento para 2019. Tanto o ministro das Finanças – numa entrevista ao Público – como António Costa defenderam que o descongelamento de carreiras na Função Pública representa um custo de 750 milhões de euros. Por isso, para o primeiro-ministro “a margem não é muita” para superar os 50 milhões destinados exclusivamente a aumentos salariais. Ainda assim, é um primeiro passo “para repor a normalidade” de aumentos salariais.
Na reta final das negociações à esquerda, também o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, deu ontem uma entrevista ao DN/ TSF, onde defendeu que “a proposta de lei do Orçamento do Estado será a proposta do Governo e não da maioria parlamentar”.