Em 2019, o ensino superior vai ter mais 16 milhões de euros mas, nem por isso o próximo ano vai ser risonho para as universidades e politécnicos públicos, que dizem não ter verbas suficientes para pagar salários.
As contas avançadas ao i pelos presidentes dos politécnicos e dos reitores apontam que são necessários mais 42,8 milhões de euros para pagar todos os salários a professores, investigadores e pessoal não docente.
Por isso, de acordo com as várias universidades e politécnicos ouvidos pelo i, o aumento da verba prevista no Orçamento do Estado para 2019 fica muito aquém para suportar a despesa do aumento da carga salarial que resulta das várias leis em vigor, desenhadas pelo governo e pelo parlamento.
Em causa estão os salários que resultam da contratação de pessoal docente e de professores e investigadores através do programa de precários da função pública, há ainda o aumento do salário mínimo, o decreto lei que impõe a contratação de investigadores e o descongelamento das carreiras da função pública.
No total, o Estado vai transferir 1105 milhões de euros para as universidades e politécnicos públicos. Deste valor, 774 milhões de euros vão ser transferidos para as 14 universidades públicas, que recebem mais sete milhões face a 2018 e os restantes 331 milhões cabem aos 15 politécnicos (mais nove milhões).
No entanto, as universidades dizem que para cumprir com todas as despesas que resultam das leis em vigor precisavam de cerca de mais 33,8 milhões de euros. Os politécnicos reclamam outros cerca de dez milhões de euros.
A dotação do Orçamento do Estado para 2019 foi comunicada aos reitores e presidentes dos politécnicos na passada sexta-feira depois de várias reuniões de negociações entre a tutela, as Finanças e as instituições de ensino superior. As universidades e politécnicos têm agora até dia 31 de agosto para submeter na plataforma da Direção Geral do Orçamento (DGO) os seus orçamentos.
Contrato de Confiança violado Perante este cenário, ao i, as universidades e politécnicos acusam ainda o governo de violar o Contrato de Confiança assinado em 2016, no início do mandato, pelo primeiro-ministro, pelo ministro das Finanças e pelo ministro da Ciência e do Ensino Superior. É que neste acordo assinado com as instituições de ensino superior, o governo comprometeu-se a transferir as verbas necessárias ao aumento de despesa que resulte de alterações legislativas. É este o caso.
Esta já não é, aliás, a primeira vez que os reitores e presidentes dos politécnicos acusam o governo de violar o Contrato de Confiança, sendo esta uma das bandeiras de António Consta e do ministro Manuel Heitor, que até assumir funções governativas foi investigador e professor do ensino superior.
Já no ano passado, as universidades e politécnicos reclamaram a falta de 8,5 milhões de euros para pagar o descongelamento dos salários que decorre em 2018.
Confrontado pelo i com as contas dos reitores e dos presidentes dos politécnicos, o Ministério da Ciência e do Ensino Superior diz apenas que “só fala do OE depois de ser entregue na Assembleia da República, como é hábito”. O Ministério das Finanças não deu qualquer resposta até à hora de fecho desta edição.
As verbas em falta Segundo as contas apresentadas pelas universidades, para cobrir a despesa com o descongelamento das carreiras dos professores e do pessoal não docente são necessários mais 3,8 milhões de euros, com um valor previsto na ordem dos cerca de onze milhões de euros. A este valor soma-se ainda 30 milhões para contratar os doutorados que não são financiados pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e para cumprir com o programa de regularização de precários, lançado pelo governo em 2017 e que está atrasado.
Na Universidade do Porto, por exemplo, ainda não houve qualquer reunião da comissão que avalia os critérios de integração dos precários. Na Universidade de Lisboa, a maior do país, o processo está a meio.
De acordo com o presidente do Conselho de Reitores (CRUP), Fontainhas Fernandes, apenas a Universidade da Beira Interior (UBI) já terminou o processo.
Por isso, o valor em falta estimado pelas universidades para contratar os precários pode ainda ser maior, alertam os reitores. Só na Universidade de Lisboa, que é a maior do país, para a contratação de precários e de doutorados é necessário um acréscimo de 5,5 milhões de euros anuais.
Também a Universidade do Algarve, uma das instituições com mais dificuldades financeiras, tendo sido necessário recorrer ao Fundo de Coesão (fundo de emergência para as universidades), são necessários mais 440 mil euros para pagar salários que dotação de 759 mil euros que será transferida pelo Estado. No total, para pagar salários depois do descongelamento e contratar precários e bolseiros não financiados pela FCT seriam necessários um total de 1,2 milhões de euros.
O mesmo cenário acontece nos politécnicos. Ao i, o presidente do Conselho Coordenador dos Politécnicos (CCISP), Pedro Dominguinhos, diz que o aumento da dotação de nove milhões de euros cobre apenas o aumento dos salários que resulta do descongelamento, sendo uma despesa estimada em 7,2 milhões de euros a que se soma o aumento do salário mínimo a partir de janeiro de 2019.
Para suportar os custos com os contratos dos precários os politécnicos necessitam de mais 3,8 milhões de euros.
Além disso, para fazer os acertos salariais de todos os professores que foram obrigados a tirar doutoramento são necessários outros sete milhões de euros.
Isto porque, em 2009, o ex-ministro do Ensino Superior, Mariano Gago, do qual Manuel Heitor era secretário de Estado, desenhou uma lei que estabelecia que todos os docentes do ensino superior tinham de ter um grau de doutorado. A regra afetou sobretudo os politécnicos e foi dado um prazo de cinco anos para que os docentes terminassem o doutoramento. O prazo foi sendo prorrogado e termina este ano a 31 de agosto. Sem o doutoramento os docentes perdem o vinculo ao politécnico.
Apesar de ser um cenário que se repete, tanto o presidente do Conselho de Reitores como o presidente do Conselho dos Politécnicos acreditam ainda ser possível um reforço de verbas no Orçamento do Estado, lembrando que esta é a regra estabelecida no Contrato de Confiança.