Parlamento. Corrida às recomendações obriga Ferro a impor regras

Parlamento. Corrida às recomendações obriga Ferro a impor regras


Textos dos partidos que funcionam como pedidos ao governo superam as leis. Foram aprovaram 243 resoluções contra 44 decretos na última sessão


Um projeto de resolução no parlamento funciona como um pedido ao governo, uma pressão, um sinal político com a força de um voto, mas não tem o caráter de lei vinculativo. Os partidos – e também o governo – usaram esta figura legislativa em abundância na última sessão legislativa que terminou a 18 de julho, de tal maneira que o número de recomendações aprovadas é superior aos das leis: 243 contra 44 decretos aprovados. A proliferação de textos levou o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, a pedir uma reflexão sobre o recurso a esta figura legal para colocar regras mais apertadas na apresentação deste tipo de iniciativas. Contactado pelo i, o secretário da mesa da Assembleia da República Duarte Pacheco (PSD) disse que já “existe um consenso muito grande entre PS, PSD, PCP e PEV para disciplinar as regras” de procedimento no parlamento.

Por exemplo, a construção de um novo hospital no Algarve mereceu projetos de resolução do PS, PSD, Bloco de Esquerda e PCP. A versão final aprovada resultou dos projetos do PCP e do Bloco de Esquerda no final de junho. O texto socialista recomendava um calendário ao governo para a construção do hospital, os demais projetos pediam uma solução para avançar com a nova unidade.

Neste caso, as propostas foram a votos e o parlamento garantiu um texto único a partir das propostas do PCP e do BE. Mas nem todas serão assim. Alguns textos ficaram pelo caminho. A Constituição diz que “as resoluções são publicadas independentemente de promulgação”.

Os dados oficiais de balanço do parlamento são elucidativos da proliferação de projetos de resolução: “A Constituição define, no artigo 166.º, a Resolução como o ato da Assembleia da República que não revista a forma de lei ou moção. Até ao dia 18 de julho de 2018, foram apresentados 742 Projetos e Propostas de Resolução, que deram origem a 243 Resoluções da Assembleia da República, um número superior ao número de Projetos e Propostas de Lei entradas (417), que deram origem a 44 Leis”.

No período em que a Assembleia da República foi presidida por Almeida Santos (PS) a ordem passava por admitir resoluções, apenas, em casos excecionais. No parlamento as resoluções serviam para acompanhar tratados internacionais ou assentimentos para visitas oficiais do Presidente da República. A partir do consulado de Jaime Gama, como presidente do parlamento, a situação mudou. Chegaram a ser entregues resoluções similares para a requalificação da mesma escola, confidencia ao i um deputado. Isto apesar de ter sido no mandato de Jaime Gama que as resoluções ganharam força para derrubar um governo. Em 2011, o primeiro-ministro José Sócrates pediu a demissão porque as recomendações aprovadas pelos partidos sobre o pacote de medidas do PEC-IV funcionaram como um sinal político de rejeição ao documento.

Na próxima sessão legislativa, a conferência de líderes vai avaliar soluções para travar o ímpeto dos projetos de resolução. Uma das hipóteses em cima da mesa é a de obrigar os partidos a fazerem a sua própria triagem ao impor a regra de que todos os textos têm de ser apreciados – e votados – em plenário. Em média, um partido agenda duas iniciativas por quinzena no hemiciclo. O consenso existe, mas não é extensível a todos os partidos. Segundo apurou o i tanto o BE como o CDS levantaram reservas a qualquer travão à entrega de projetos de resolução.