O principal problema nos políticos portugueses é o calculismo. A maior parte das vezes, os nossos políticos abdicam do combate em defesa das suas posições, à espera da melhor oportunidade para alcançar uma vitória fácil. E assim deixam o país adiado, mais parecendo a peça “À Espera de Godot”, em que todos esperam que Godot chegue, mas só se ouve dizer que ele não virá, talvez amanhã.
É graças a isto que o PSD parece neste momento uma peça de teatro do absurdo. Em primeiro lugar, o partido teve há seis meses um congresso electivo onde os vários candidatos que agora se declaram disponíveis para liderar o partido se podiam ter apresentado e demonstrado aos militantes ao que vinham. Nenhum, porém, o fez, deixando que a disputa se fizesse apenas entre Rui Rio e Santana Lopes. Tendo perdido por falta de comparência, talvez devessem neste momento abster-se de pretender substituir um líder que decidiram não enfrentar.
Já Santana Lopes, pelo contrário, apresentou-se como alternativa a Rui Rio e conseguiu congregar os votos de todos os que se lhe opunham. Fê-lo, porém, depois de ter deixado o partido completamente à deriva nas eleições autárquicas, adiando sucessivamente uma decisão sobre a sua candidatura a Lisboa, para depois não avançar, invocando o compromisso com a Santa Casa, compromisso que logo desapareceu quando passou a estar antes em causa disputar a liderança do PSD. Perdidas as eleições, abdicou imediatamente de ser oposição a Rui Rio, apresentando no congresso uma lista conjunta com o mesmo, mas logo a seguir renunciou ao cargo para que foi eleito. Agora, seis meses depois de ter disputado a liderança do PSD, anuncia que vai formar um novo partido para combater o próprio PSD, com o argumento extraordinário de que o partido gostava de o ouvir mas não seguia as suas ideias. Com tantos avanços, recuos e mudanças de estratégia, é de facto difícil alguém seguir o que quer que seja.
Mas a estratégia de Rui Rio também está a pecar por calculismo excessivo. Rui Rio anunciou logo no congresso que estava preocupado era com as autárquicas de 2021, parecendo assim já dar como perdidas todas as eleições de 2019, muito mais importantes para qualquer partido político. E desde então ensaiou uma estratégia de entente cordiale com António Costa, com quem tem uma grande proximidade desde que ambos lideraram as duas maiores autarquias do país. Neste âmbito, recusou mesmo dizer que rejeitará o Orçamento para 2019, ao contrário do que fez com clareza Assunção Cristas. Se esse Orçamento vier a ser aprovado pelo PSD, acontecerá o insólito de a política essencial do governo vir a ser apoiada pelo maior partido da oposição. Ao mesmo tempo, António Costa ficará com uma posição privilegiada nas legislativas, tanto podendo reeditar a geringonça como fazer um governo de bloco central.
A política a sério deve ser feita com combate e assunção de riscos, não com calculismos, adiamentos, desistências ou faltas de comparência. Assim, enquanto a geringonça começa a colapsar, aquilo a que o país assiste é a um teatro do absurdo no maior partido da oposição.
Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa
Escreve à terça-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990