A diferença que fazem cinco anos. Em Maio de 2014, com a troika recém-despedida, as eleições para o Parlamento Europeu cumpriram o papel tradicional de aliviar o fígado político dos portugueses. PSD e CDS, coligados, obtiveram um nadinha menos do que 30% dos votos (sete deputados) e o PS capitalizou o descontentamento normal com os partidos no governo e chegou aos 34% (e oito deputados), o “poucochinho” que haveria de perseguir António Costa depois de ter servido para perseguir Seguro.
O alívio de fígado dos portugueses alimentou os partidos que à época se encontravam fora do arco da governação, com a CDU a obter 13,7% (e três deputados) e o Bloco 4,93% (e uma só deputada).
Um terceiro capítulo do alívio hepático passou pelo voto de protesto em torno de novos partidos, o fracassado Livre (com 2,35% e nenhum deputado) e a barriga de aluguer de Marinho Pinto, o MPT (que começara como Movimento o Partido da Terra), com 7,72% e dois deputados.
Significativo, face às eleições para a Assembleia da República e também dentro do alívio hepático, foi o voto noutros partidos para além dos referidos e que totalizou 7,33%.
Em 2014, os portugueses soltaram a bílis política sem assumirem as consequências governativas que tal liberdade teria se exercida nas eleições para a Assembleia da República. Puniram os partidos do governo e deram voz ao único movimento populista da iii República, o one-man show de Marinho Pinto, actuando sob o franchise do MPT (curiosamente, e a título premonitório, o MPT elegeu, nas listas do PSD, dois deputados à AR, em 2005, com Pedro Santana Lopes como líder…).
No entretanto, o Brexit permitiu redistribuir os deputados britânicos pelos restantes 27 Estados-membros e manter a quota de 21 eurodeputados atribuída a Portugal.
Agora que faltam menos de dez meses para as eleições para o Parlamento Europeu, que será de esperar do acumular da bílis eleitoral? PSD e CDS irão concorrer separados, o que porá à prova as ambições dos centristas e poderá permitir o voto punitivo da liderança social-democrata por parte dos simpatizantes mais críticos. No Largo do Caldas há sonhos húmidos inspirados pelos resultados das autárquicas em Lisboa. Dois deputados mantêm o resultado de 2014, negociado habilmente por Portas na lista da coligação. Três deputados serão uma vitória. Mais do que isso, um triunfo.
Mas a principal ameaça ao PSD vem do derrotado no último congresso partidário. O partido santanista, de acordo com as sondagens, cativa 5% dos eleitores, o que pode chegar para eleger dois deputados ao PE. Admitindo que um é retirado ao PSD, Rui Rio arrisca-se a ter já a 25 de Maio de 2019 uma noite das facas longas.
As ameaças ao PS não devem vir da esquerda, sendo provável que os quatro deputados da soma CDU-Bloco se mantenham, com uma repartição 2-2.
Admito que Marinho Pinto possa perder o mandato, fruto do empenho que tem colocado em conseguir tal resultado. Como o segundo deputado do MPT é já dado como perdido, o voto de protesto em 2019 poderá acabar por não castigar PS e PSD, verificando-se uma troca entre o MPT e o partido santanista.
Tal permitirá ao santanismo, poucos meses depois, chegar às eleições legislativas com uma imagem vencedora, obtida com baixíssimos custos e num tempo recorde. Esta recomposição do sistema partidário alarga o leque das peças disponíveis para a construção de geringonças, à direita mas também à esquerda. Não é certo que o partido santanista vá roubar votos apenas ao PSD. A homonímia no grito “PS! PS! PS!” é enganadora.
Escreve à sexta-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990