As movimentações políticas para a cimeira europeia de final de junho, numa Europa que parece estar mais dividida que nunca, não param. Hoje, a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente francês, Emmanuel Macron, encontraram-se em Meseberg, perto de Berlim, para consensualizarem posições sobre o futuro europeu. Merkel esteve mais focada numa solução europeia para a crise dos refugiados, enquanto Macron pressionou para se avançar com a reforma da zona euro, uma das suas principais bandeiras. No final do encontro surgiram indícios de que o eixo franco-alemão poderá ter ressuscitado – ainda que momentaneamente – dos mortos, com os dois líderes a saírem satisfeitos.
Macron saiu do encontro com a promessa alemã de apoiar um “verdadeiro orçamento para a convergência entre economias da zona euro e investimento”, mas corre contra o tempo se quiser ver essa promessa cumprida. A agenda europeia foi tomada de assalto pela migração e consequentes divisões entre os Estados-membros, relegando a reforma do euro para segundo ou terceiro plano. Se, na cimeira deste mês, não conseguir algo de concreto, Macron poderá ter perdido a oportunidade de reformar a moeda única. No próximo ano haverá eleições regionais na Alemanha – com a CSU, partido gémeo da CDU de Merkel, a ter de disputar o campo político anti-imigração com o Alternativa para a Alemanha -, a saída do Reino Unido da UE em março e, depois, eleições europeias. Entre tantos temas e disputas políticas, a ideia de se reformar a zona euro corre sério risco de se dissipar nos corredores europeus.
Por seu lado, Merkel garantiu o apoio francês para se desenvolver uma estratégia europeia global para se lidar com a imigração. Entre as propostas defendidas pelos dois líderes encontram-se o fortalecimento das fronteiras europeias, com o reforço da Frontex, e a redação de critérios comuns para se determinar quem deverá obter o estatuto de asilo na Europa.
Enquanto Macron e Merkel discutiam o futuro da União Europeia, e como resposta ao ultimato do ministro do Interior alemão, Horst Seehofer, foi tornado público o rascunho das conclusões da cimeira europeia da próxima semana.
Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, propõe que a União Europeia crie “plataformas regionais de desembarque” de migrantes, onde se poderá facilmente diferenciar quem é refugiado e quem é migrante económico, com estes últimos a serem deportados para os seus países de origem. “Estas plataformas devem permitir um processamento rápido para se distinguir entre migrantes económicos e aqueles que precisam de proteção internacional, reduzindo o incentivo para embarcarem em jornadas perigosas”, pode ler-se no documento.
Entretanto, Tusk irá tentar convencer os vários líderes europeus, entre os quais Giuseppe Conte, primeiro-ministro italiano de um governo com um parceiro de coligação de extrema–direita e anti-imigração, a Liga, dos méritos da proposta de rascunho.
No documento destaca-se a omissão do pacote legislativo para a migração, nomeadamente o Regulamento de Dublin, que tem sobrecarregado Itália e Grécia com o processamento dos pedidos de asilo e acolhimento de refugiados e migrantes. O documento refere-se apenas ao acordo de Dublin entre parênteses retos, deixando a entender que esse ponto será preenchido no futuro.
A ideia de se criarem “plataformas regionais de desembarque” não é nova. Surgiu pela primeira vez em 2016 pela boca do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, conhecido pela sua forte oposição à imigração por vê-la como ameaça à identidade nacional húngara. Ignorada desde então pelos líderes europeus, a ideia parece ter ganhado força com a crescente divisão na Europa entre os que querem uma linha dura contra a imigração, em que se inclui Orbán, e os que defendem que a Europa deve ter uma abordagem de acolhimento dos refugiados que respeite o direito internacional. A proposta é sobretudo de compromisso para evitar o aprofundamento das divisões europeias.
Entre os possíveis países que poderão albergar estas “plataformas” encontram-se a Albânia e a Tunísia mas, segundo afirmam fontes da União Europeia ao “Politico”, ainda é muito cedo para se especular sobre a possível localização.
Além destas plataformas, a proposta pede que se dê “mais um passo para melhorar a guarda costeira líbia para que impeça partidas da Líbia”. A guarda costeira líbia tem sido acusada de violar os direitos humanos dos refugiados e migrantes detidos no país. Num relatório redigido pela Amnistia Internacional em 2017 são relatados, pela voz das vítimas, casos de abusos, tortura, trabalhos forçados, extorsão e até mortes causadas tanto pelas autoridades líbias como por traficantes e grupos armados.
Resposta a Trump A chanceler alemã não se esqueceu de responder às mais recentes críticas de Donald Trump. “A minha resposta é que o ministro do Interior apresentou as estatísticas da criminalidade há pouco tempo e elas falam por si mesmas”, disse Merkel, contrariando o tweet em que Trump afirma que a taxa de criminalidade na Alemanha subiu 10% desde que a chanceler abriu as portas do país aos refugiados e migrantes.