Será que ainda conseguimos pensar o futuro?


Se Portugal quer ter futuro, tem de criar justas oportunidades para todos os seus cidadãos. Todavia, discutir o nosso modelo de desenvolvimento e a maneira como ele se coloca ao serviço das pessoas não parece estar na agenda


Mais coisa menos coisa, estamos a menos de 12 meses do arranque da pré-campanha eleitoral para as legislativas de 2019. Como já se percebeu pela discussão do Orçamento do Estado, a estabilidade política está a ser leiloada pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista. Só um português muito crédulo é que ainda se deixa impressionar com os passos da dança do matrimónio orçamental. 

Até outubro, e na tentativa de se autonomizarem face ao PS, BE e PCP vão rasgar as vestes contra o défice zero. Proporão aumentos massivos da despesa. 

Do outro lado, os socialistas dão continuidade à coreografia. Eles são o baluarte da responsabilidade e muralha inexpugnável na defesa do rigor orçamental. 

Crescerá o dramatismo. 

O espetro de eleições antecipadas. 

Coloca-se a pressão do lado do PSD, a quem se exige “responsabilidade” quando a autossuficiência da coligação das esquerdas dá sinais de gripar.

Calma. Quando chegarmos à aprovação do OE no parlamento, Catarina Martins dirá que não concorda com o Orçamento. Jerónimo de Sousa condenará a falta de ambição do governo. Mas ambos votarão a favor. 

E então fica claro que tão grandes, exacerbadas e encenadas diferenças são, afinal, resolúveis com minúsculas cedências. Porque a coligação de esquerdas serve o propósito maior das três forças que a compõem: a crescente estatização da economia e a progressiva dependência dos indivíduos face ao Estado. 

Com uma agenda mediática que caminha de escândalo em escândalo; com um jogo de sombras a dominar a cena política nacional; com a ostensiva ausência de normalidade na nossa vida coletiva, temo que não sobre tempo para discutir nada do que interessa para o futuro de Portugal.

Convinha perceber porque é que o “milagre económico português”, com que tantos bombardeiam a opinião pública, não chega para que o nosso país abandone o grupo dos países europeus que arrastam os pés em matéria de crescimento. Era pertinente discutir as razões pelas quais tantos e tantos milhões de portugueses da classe média estão a ser excluídos desse “milagre económico”, pagando a gasolina mais cara do mundo ou desesperando por uma casa que não são capazes de alugar – muito menos, comprar. Convinha, já agora, saber como é que o governo da coligação das esquerdas antiausteridade fica associado ao colapso do Serviço Nacional de Saúde e à maior carga fiscal de todos os tempos em cima das famílias e empresas.

Ou este milagre não é para todos ou então não é milagre de todo. 

Se Portugal quer ter futuro, tem de criar justas oportunidades para todos os seus cidadãos.

Todavia, discutir o nosso modelo de de-senvolvimento e a maneira como ele se coloca ao serviço das pessoas não parece estar na agenda. 

Há cinco condições para sermos um país mais decente, justo e próspero. 

A primeira condição vem em forma de pergunta: que visão de país? O nosso horizonte coletivo, as metas que nos propomos cumprir na economia, na cultura, na justiça ou na sociedade deveriam ser debatidas e partilhadas para que todas as forças sociais trabalhem no mesmo sentido. Alguém sabe para onde Portugal vai hoje? Não. 

Segunda condição: Portugal precisa de ambição. Queremos continuar a ver o país a ser ultrapassado pelos parceiros europeus, mesmo os que chegaram depois? Ou queremos arrancar para o topo da lista dos mais prósperos? 

Terceira condição: estratégia. A política do desenrasca e do navegar à vista não dá resultados. O país tem de ter uma estratégia, sistematizada e formalizada, que consolide o caminho para a concretização da visão. Descentralização, aposta na economia do mar e das cidades são apenas três ambiciosos vetores estratégicos que servem a visão de um Portugal maior.

Quarta condição: organização. Temos leis a mais, municípios a mais, deputados a mais e burocracia a mais. É necessário repensar a forma como nos organizamos coletivamente para gerar mais recursos do que aqueles que consumimos.

Quinta e última condição: ter vergonha. Ter vergonha de ficar aquém do nosso potencial. Ter vergonha do património que se degrada, do mar que não se explora ou da decência que escasseia. Ter vergonha que censure a indiferença com que lidamos com os assuntos públicos que nos lançam numa espiral de desconfiança coletiva. 

Com mais visão, ambição, estratégia, organização e vergonha, Portugal seria certamente um país melhor. Era bom discutirmos o assunto. Mas, sem grande risco, aposto que o futuro do país serve menos o interesse de alguns do que as danças táticas e as campanhas inflamadas. 

Escreve à quarta-feira


Será que ainda conseguimos pensar o futuro?


Se Portugal quer ter futuro, tem de criar justas oportunidades para todos os seus cidadãos. Todavia, discutir o nosso modelo de desenvolvimento e a maneira como ele se coloca ao serviço das pessoas não parece estar na agenda


Mais coisa menos coisa, estamos a menos de 12 meses do arranque da pré-campanha eleitoral para as legislativas de 2019. Como já se percebeu pela discussão do Orçamento do Estado, a estabilidade política está a ser leiloada pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista. Só um português muito crédulo é que ainda se deixa impressionar com os passos da dança do matrimónio orçamental. 

Até outubro, e na tentativa de se autonomizarem face ao PS, BE e PCP vão rasgar as vestes contra o défice zero. Proporão aumentos massivos da despesa. 

Do outro lado, os socialistas dão continuidade à coreografia. Eles são o baluarte da responsabilidade e muralha inexpugnável na defesa do rigor orçamental. 

Crescerá o dramatismo. 

O espetro de eleições antecipadas. 

Coloca-se a pressão do lado do PSD, a quem se exige “responsabilidade” quando a autossuficiência da coligação das esquerdas dá sinais de gripar.

Calma. Quando chegarmos à aprovação do OE no parlamento, Catarina Martins dirá que não concorda com o Orçamento. Jerónimo de Sousa condenará a falta de ambição do governo. Mas ambos votarão a favor. 

E então fica claro que tão grandes, exacerbadas e encenadas diferenças são, afinal, resolúveis com minúsculas cedências. Porque a coligação de esquerdas serve o propósito maior das três forças que a compõem: a crescente estatização da economia e a progressiva dependência dos indivíduos face ao Estado. 

Com uma agenda mediática que caminha de escândalo em escândalo; com um jogo de sombras a dominar a cena política nacional; com a ostensiva ausência de normalidade na nossa vida coletiva, temo que não sobre tempo para discutir nada do que interessa para o futuro de Portugal.

Convinha perceber porque é que o “milagre económico português”, com que tantos bombardeiam a opinião pública, não chega para que o nosso país abandone o grupo dos países europeus que arrastam os pés em matéria de crescimento. Era pertinente discutir as razões pelas quais tantos e tantos milhões de portugueses da classe média estão a ser excluídos desse “milagre económico”, pagando a gasolina mais cara do mundo ou desesperando por uma casa que não são capazes de alugar – muito menos, comprar. Convinha, já agora, saber como é que o governo da coligação das esquerdas antiausteridade fica associado ao colapso do Serviço Nacional de Saúde e à maior carga fiscal de todos os tempos em cima das famílias e empresas.

Ou este milagre não é para todos ou então não é milagre de todo. 

Se Portugal quer ter futuro, tem de criar justas oportunidades para todos os seus cidadãos.

Todavia, discutir o nosso modelo de de-senvolvimento e a maneira como ele se coloca ao serviço das pessoas não parece estar na agenda. 

Há cinco condições para sermos um país mais decente, justo e próspero. 

A primeira condição vem em forma de pergunta: que visão de país? O nosso horizonte coletivo, as metas que nos propomos cumprir na economia, na cultura, na justiça ou na sociedade deveriam ser debatidas e partilhadas para que todas as forças sociais trabalhem no mesmo sentido. Alguém sabe para onde Portugal vai hoje? Não. 

Segunda condição: Portugal precisa de ambição. Queremos continuar a ver o país a ser ultrapassado pelos parceiros europeus, mesmo os que chegaram depois? Ou queremos arrancar para o topo da lista dos mais prósperos? 

Terceira condição: estratégia. A política do desenrasca e do navegar à vista não dá resultados. O país tem de ter uma estratégia, sistematizada e formalizada, que consolide o caminho para a concretização da visão. Descentralização, aposta na economia do mar e das cidades são apenas três ambiciosos vetores estratégicos que servem a visão de um Portugal maior.

Quarta condição: organização. Temos leis a mais, municípios a mais, deputados a mais e burocracia a mais. É necessário repensar a forma como nos organizamos coletivamente para gerar mais recursos do que aqueles que consumimos.

Quinta e última condição: ter vergonha. Ter vergonha de ficar aquém do nosso potencial. Ter vergonha do património que se degrada, do mar que não se explora ou da decência que escasseia. Ter vergonha que censure a indiferença com que lidamos com os assuntos públicos que nos lançam numa espiral de desconfiança coletiva. 

Com mais visão, ambição, estratégia, organização e vergonha, Portugal seria certamente um país melhor. Era bom discutirmos o assunto. Mas, sem grande risco, aposto que o futuro do país serve menos o interesse de alguns do que as danças táticas e as campanhas inflamadas. 

Escreve à quarta-feira