Município rico, munícipes pobres


A situação na Câmara de Lisboa é um verdadeiro escândalo nacional que tem de ser duramente combatido. Se há combate político que vale a pena travar, é esse


Segundo revelou o jornal “SOL”, a Câmara de Lisboa prepara-se para gastar mais de um milhão de euros por ano em salários para assessores e secretários da sua assembleia municipal. Ficamos a saber que os deputados municipais precisam de assessores e secretários e que os mesmos são regiamente pagos pelo município, recebendo um assessor um salário de 3752,50 euros, enquanto um secretário recebe 2802,50 euros mensais. Sabendo-se que os deputados municipais não têm quaisquer funções executivas e são apenas pagos por senhas de presença quando a assembleia reúne, é espantoso que os seus assessores e secretários ganhem tanto, ultrapassando em muito o salário dos próprios deputados municipais. Não é por isso de estranhar, como revelou José Eduardo Martins, que houvesse deputados municipais que eram simultaneamente assessores de si próprios, naturalmente com o fim de ganhar o salário de assessor. É o espírito bem português do “ou comem todos ou haja moralidade”. E quem pode censurar esses deputados municipais por receberem esse dinheiro quando, seguramente, os mesmos se assessoram muito melhor sozinhos para uma simples reunião na assembleia, em vez de contratarem alguém como assessor?

Mas cabe perguntar como é que a câmara tem tanto dinheiro para distribuir a rodos pelos boys e girls dos partidos representados na assembleia. A resposta é simples: é que a câmara anda há três anos a extorquir aos lisboetas um imposto encapotado a que chamou taxa de protecção civil, cobrando uma remuneração por serviços que não presta. Mais valia, por isso, que a câmara apelidasse esse tributo de “taxa do assessor e do secretário municipal”, que já ficariam a saber os lisboetas para que serve, afinal, o dinheiro com que andam a sustentar o seu município.

Sim, porque a câmara nada faz em defesa da cidade de Lisboa e muito menos do povo de Lisboa. O presidente da câmara aceitou sem abrir a boca que fosse retirada a Lisboa a candidatura à EMA, com os resultados que se conhecem. Não satisfeito, veio dizer a seguir que concordava com a absurda saída do Infarmed da sua cidade, ficando indiferente aos danos causados às famílias de 350 funcionários que aqui vivem e trabalham. Já se vê que a câmara encara os lisboetas como verdadeiros servos da gleba, que são bons para pagar as taxas que abusivamente lhes cobra, mas cujos interesses nunca toma em consideração se estiverem em causa os desígnios nacionais do seu partido.

Há que ser muito claro: a situação na Câmara de Lisboa é um verdadeiro escândalo nacional que tem que ser duramente combatido. Se há combate político que vale a pena travar, é esse. É por isso essencial que os partidos da oposição se demarquem claramente destes esquemas e assumam a efectiva defesa dos cidadãos de Lisboa. Foi para isso e só para isso que foram eleitos.

 

Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Escreve à terça-feira, sem adopção das regras do acordo ortográfico de 1990