Carlos Costa pode sentir-se mais isolado do que nunca e no meio do olho do furacão, mas a posição de Marcelo Rebelo de Sousa e de António Costa acaba por permitir que o governador respire fundo. Ainda que tenham evitado fazer grandes comentários sobre o desempenho de Carlos Costa à frente do regulador, ambos tentaram pôr água na fervura, em nome da estabilidade do sistema financeiro.
Também o governador tem feito de tudo para conseguir defender-se e defender a própria “instituição”. Carlos Costa pediu para ser ouvido no Parlamento e, ao que tudo indica, é o que vai acontecer. Ao i, fontes ligadas ao processo, garantem que apenas não foi ainda marcada uma audição porque “já existem 23 em agenda”, mas Carlos Costa vai ser ouvido o quanto antes. Também Teresa Leal Coelho, presidente da Comissão Parlamentar de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa, fez saber que “será encontrado um consenso para que, num prazo razoável, e o mais rápido possível, seja encontrada uma data” para ouvir Carlos Costa.
A ideia do governador do Banco de Portugal é poder defender-se do que diz serem “acusações distorcidas”. Para Carlos Costa torna-se ainda imperativo defender também o Banco de Portugal de forma a “promover a confiança” na instituição.
António Costa foi dos primeiros a aprovar a intenção do governador do Banco de Portugal, até porque considera “saudável que haja um acompanhamento por parte da Assembleia da República da atividade de supervisão e, se o governador quer dialogar com a Assembleia, excelente”.
Já Marcelo Rebelo de Sousa, que esteve reunido com Carlos Costa para mediar uma solução no que respeita às nomeações e também às alegadas falhas por causa do caso BES, foi mais comedido. Mas acabou por sublinhar que tudo está a ser feito “no sentido de estabilizar e consolidar o sistema financeiro”.
Carlos Costa e o BES
Ainda assim, Carlos Costa continua a estar a braços com a polémica que se criou em torno do que poderia ter sido feito pelo Banco de Portugal no caso do Banco Espírito Santo. O governador tem sido alvo de críticas e dúvidas sobre a sua continuidade à frente do BdP. E foi exatamente neste contexto que Carlos Costa acabou por ser forçado a tomar uma posição, ao mostrar-se disponível para esclarecer os deputados sobre várias questões que têm vindo a ser levantadas nos últimos dias.
A verdade é que a vida do governador do Banco de Portugal – que foi nomeado, em 2010, pelo governo de José Sócrates e reconduzido, em 2015, pelo executivo de Pedro Passos Coelho – começou a complicar-se depois de surgir a possibilidade de ter sido omitida informação no caso BES.
De acordo com uma investigação levada a cabo pela SIC, há documentos que provam que o BdP conhecia pormenores do que se passava na esfera Espírito Santo. Entre os documentos divulgados, há um que mostra que, nove meses antes da derrocada, os técnicos do BdP defenderam a saída de Ricardo Salgado. Nestes documentos chegou mesmo a ser posta em causa a continuidade dos administradores do Banco Espírito Santo. Segundo a SIC, é assumida, de forma clara, a possibilidade de Ricardo Salgado ser afastado de forma imediata. Ainda assim, na mesma nota informativa, assinada por técnicos do BdP, é reconhecido que o regulador estava a deixar passar o tempo sem que as devidas medidas fossem tomadas.
O trabalho da estação de Carnaxide acabou por fazer com que se multiplicassem posições contra a continuidade de Carlos Costa à frente do Banco de Portugal, ainda que nem todos considerem que deve ser colocada em causa.
Mas afinal pode o governo afastar Carlos Costa? As mãos do executivo de António Costa não podiam estar mais atadas. Não se pode dizer que Carlos Costa seja intocável, mas pode dizer-se que não é um processo tão fácil como muitos possam pensar. Isto porque o governador do BdP tem “um estatuto próprio de inamovibilidade e sujeito à fiscalização própria do sistema de supervisão europeu”, como explicou, desde cedo, o primeiro-ministro.