Ralis. Porque ganham os finlandeses?

Ralis. Porque ganham os finlandeses?


A escola finlandesa continua a lançar pilotos fora-de-série. São feitos da mesma matéria que todos os outros, só que ganham muito mais. Qual o segredo desta superioridade?


Ao segundo rali, Jari-Matti Latvala acabou com o suspense na Toyota. Os responsáveis da marca tinham programado começar a vencer… em 2018, mas, na Suécia, o Yaris WRC chegou em primeiro! Surpresa? Nem por isso, era Latvala quem estava ao volante.

Para conseguir a 17ª vitória no campeonato do mundo, o finlandês voou nas estradas cobertas de neve, e ladeadas por árvores de belo porte, fazendo médias superiores a 130 km/h! É assustador…, mas só para quem está de fora a assistir.

Estreou-se no campeonato do mundo com 17 anos, e aos 22 anos tornou-se o mais jovem piloto a vencer um rali. É digno sucessor da casta dos “flying finnis”, ou seja dos finlandeses voadores que, na neve, terra, asfalto, de dia ou noite, demonstram um domínio do carro, uma capacidade de improvisação, um sentido de ataque e gosto pelo risco superior a todos os outros.

As estatísticas não deixam dúvidas. Até ao momento, venceram 177 ralis e contam com sete campeões do mundo, que valem14 títulos absolutos. A França é o país que mais se aproxima com três campeões do mundo…

Timo Mäkinen foi a primeira estrela finlandesa. Foi ele que, nos anos 60, introduziu a técnica do pêndulo na condução em rali, que lhe valeu quatro vitórias. Seguiram-se outros campeões como Markku Alen, Ari Vatanen, Hannu Mikkola, Timo Salonen, Juha Kankkunen, Tommi Mäkinen e Marcus Grönholm. Claro que falta um, talvez o mais virtuoso de todos: Henri Toivonen. Não teve tempo para ser campeão do mundo, morreu jovem, numa época em que os carros de ralis eram medonhos e perigosos.

Um dos pilotos mais espectaculares, e muito querido dos portugueses foi Markku Alen. Esteve 15 anos no grupo Fiat e venceu 19 ralis com os Fiat 124 e 131 Abarth e Lancia Stratos, Rally 037 e Delta. Era impressionante o domínio que tinha sobre os “monstros” do Grupo B e a forma determinada como entrava para as curvas. Aliava a rapidez dos finlandeses com a paixão dos italianos. Quando dizia que era o “maximum attack”, os adversários já sabiam que vinha aí um tempo-canhão. «Conduzir um carro de rali só faz sentido se for em máximo ataque. Para andar a 90 por cento mais vale ficar em casa. Tens que andar a 110 por cento, ou capotas ou ganhas, mas serás sempre lembrado» dizia o grande Markku. Foi com essa mentalidade latina que ganhou um número estratosférico de classificativas: 821, ainda hoje é o segundo melhor registo. A Taça FIA em 1978 ficou-lhe muito bem.

Figura emblemática dos ralis, Ari Vatanen andava sempre sobre o fio da navalha. Em resultado disso, ganhava de forma convincente ou desistia com o carro muito maltratado. A sua extrema rapidez e gosto pelo risco estiveram na base de grandes feitos desportivos, que ficaram na história dos ralis. Quando a estrada não lhe faltava, era muito difícil derrota-lo. Fez “miséria” com o Ford Escort RS, Peugeot 205 T16 e Opel Ascona 400. Ganhou 10 ralis, foi o mais rápido em 542 classificativas e sagrou-se campeão do mundo em 1981. Após grave acidente em 1985, regressou para se tornar o senhor Dakar, prova que venceu quatro vezes com a Peugeot.

Hannu Mikkola fez parte do “dream team” da Ford que deu espectáculo nos anos 70 com o Escort RS, mas foi com o inovador Audi Quattro que se sagrou campeão do mundo em 1983. Venceu 18 ralis e 654 classificativas, o que mostra bem a sua rapidez. Era dos pilotos mais talentosos da sua geração, não precisava de andar de lado para obter resultados. Por essa razão, foi escolhido pela Audi para fazer o desenvolvimento da tecnologia “quattro”, que revolucionou os ralis no início dos anos 80. Ganhou provas com o Toyota Corolla e, pasme-se, Mercedes 450 SLC. A longevidade de Mikkola é notável, esteve a competir ao mais alto nível durante 31 anos.

Ao mesmo tempo que estes pilotos passeavam a sua classe pelas estradas do mundo inteiro, uma nova geração de finlandeses voadores despontava.

Juha Kankkunen é o melhor exemplo. Obteve 23 vitórias e venceu 700 classificativas ao volante do Toyota Celica Turbo, Peugeot 205 T16, Lancia Delta Integrale e Subaru Impreza WRC. Foi o primeiro tetra campeão do mundo de ralis (1986/87/91/93).

Foi o mais polivalente da sua geração, sentava-se ao volante e tirava o máximo dos carros. Esse enorme talento explica a facilidade com que passou dos brutais Grupo B para os modestos Grupo A, com quase metade da potência, e continuou a vencer. Era também obcecado em ganhar. Na primeira época completa no mundial de ralis foi campeão. Não era fácil derrota-lo, quando isso acontecia, saía do carro tranquilamente, acendia um cigarro e sorria. Um estilo único.

Outro tetra campeão dá pelo nome de Tommi Mäkinen (1996 a 1999). A sua carreira foi relativamente curta, mesmo assim ganhou 24 ralis e foi o melhor em 362 especiais. O início de carreira foi modesto, mas quando teve um carro ganhador “limpou” quatro campeonatos consecutivos com diferentes evoluções do Mitsubishi Lancer.

Marcus Grönholm foi o agricultor mais rápido que passou pelo mundial de ralis. Quando não estava a conduzir o tractor na sua quinta, estava a ganhar ralis e títulos mundiais com o Peugeot 206 WRC (2000 e 2002). Como piloto da Toyota, Peugeot e Ford era extremamente rápido em pisos de terra e neve. Ganhou 19 ralis e foi o mais rápido em 542 especiais de classificação.

Não contentes em brilhar nos ralis, os “flying finns” também dão cartas na Fórmula 1. Contam com três campeões do mundo, mais do que a Itália, pátria da Ferrari, França e a Espanha. Este facto é ainda mais invulgar se tivermos em conta que nunca tiveram um grande prémio de Fórmula 1.