O negócio do arrendamento local (AL) parece estar na moda e é apresentado por muitos como a galinha de ovos de ouro. E os números falam por si. De acordo com os últimos dados divulgados pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), Portugal foi o segundo país que mais viu o seu turismo contribuir para o produto interno bruto (PIB), cerca de 9%. Mas apesar de parecer uma ideia tentadora, é uma atividade que não compensa para todos.
A “Proteste” fez as contas para saber se é um negócio que compensa ou não. Calculou a taxa de rentabilidade para projetos em Lisboa e no Porto por um período de 15 anos – no final desse prazo, o imóvel seria vendido pelo mesmo preço da compra – e o ano em que se atingiria o lucro para o investimento, e os resultados a que chegou não foram animadores. “A média do rendimento anual obtido em todos os cenários que construímos resultou em 6051 euros anuais, ou seja, 504 euros por mês, o que é claramente insuficiente”, salienta.
Ainda assim, mesmo para quem pretenda avançar com o investimento apesar do cenário desanimador, a revista conclui que só se verá lucro ao fim de 18 anos. “Isso no mínimo, porque o cenário pode ser ainda mais catastrófico e não se recuperar o capital investido”, alerta.
Mas o que deve fazer? Em primeiro lugar deve analisar as vantagens aparentes deste negócio, isto é, a potencial maximização da ocupação a preços elevados, enquanto reduz, por outro lado, a hipótese que exista de litígios com os moradores em comparação com o arrendamento tradicional. A partir daí deverá questionar-se se “está disposto a dedicar-se de corpo e alma a este negócio”, salienta a revista.
E a explicação é simples: esta atividade implica uma elevada disponibilidade de tempo, uma vez que tem de receber os turistas, encaminhá-los e gerir os imóveis. Ao mesmo tempo, obriga a estudar a concorrência e a adaptar o preço à procura, além de ter de cumprir os requisitos legais para não ter de pagar coimas.
“Em média, no período de 2013 a 2015, o número de registos de alojamento locais cresceu 76% – como tal, há muita concorrência. E mesmo que transfira a gestão do arrendamento do seu imóvel a terceiros, deve sempre fazer contas para ter uma ideia concreta dos custos e das receitas que terá ao longo do ano”, lembra a “Proteste”.
A par destes fatores, e para tomar uma decisão a longo prazo, tem de contar ainda com a incerteza fiscal. É o caso, por exemplo, da alteração da tributação sobre as receitas, que passou de 15 para 35%, assim como a instabilidade judicial. “É o caso da recente deliberação (maio de 2016) do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que deu razão a uma assembleia de condóminos proibindo a prática de alojamento local numa fração, e que será um revés neste tipo de negócios, gerando incerteza na altura de investir”, alerta a publicação.
Cenários
Mas vamos a números. A revista criou três cenários. No otimista teve em conta uma taxa de ocupação de 50%, um preço médio por dia entre os 108 e os 138 euros para dois hóspedes em Lisboa e 79 e 105 para dois a quatro hóspedes no Porto, acrescido de investimento para a compra de imóveis, assim como para obras e mobília, e chegou à conclusão de que só era rentável investir em Lisboa. Ainda assim, é preciso esperar 18 anos para obter lucro, pois, a par destes gastos, há que contar com outros extras, nomeadamente o imposto municipal sobre imóveis e proteção civil, além dos gastos diários, como luz, água e seguro multirriscos, entre outros.
Mas o cenário é mais desanimador quando a “Proteste” faz uma simulação para as mesmas cidades, mas tendo em conta uma taxa de ocupação na ordem dos 40%, para o mesmo número de hospedes mas com um preço por noite mais baixo, com os valores a variarem entre os 68 e os 110 euros para dois e quatro hóspedes em Lisboa e entre 63 e 98 euros no Porto. Neste caso, a revista aconselha a não investir, face ao investimento que é exigido na compra do imóvel, nas obras e na mobília.
Já tem imóvel?
A verdade é que o cenário poderá mudar se já tiver um imóvel e, neste caso, não necessita de fazer um investimento na aquisição. E também aqui a “Proteste” fez as contas. Considerando um imóvel de 100 mil euros e a necessidade de investimento de 7500 euros em obras e mobiliário, assumindo custos correntes anuais de 3400 euros, uma taxa de ocupação na ordem dos 30%, um preço médio de 60 euros por cada dia arrendado e recorrendo a uma plataforma para colocar o anúncio, terá ao final do quarto ano um lucro de 3030 euros. “A taxa de rentabilidade ficaria em 2,2%. Este valor fica abaixo dos 5% que são considerados como rentabilidade mínima exigida para investir em arrendamento”, afirma.
E a revista deixa um recado: “Não deverá investir em alojamento local tendo em conta os baixos retornos obtidos e o elevado investimento. Não recorra a crédito bancário para entrar neste negócio”, conclui.
Mudanças à vista
Apesar de ser um negócio atrativo para muitos – até outubro deste ano, Portugal tinha 34 mil unidades de alojamento local, das quais apenas 23% estavam concentradas nos centros urbanos de Lisboa e Porto –, o governo está a fazer um levantamento das questões que existem sobre o alojamento local junto das autarquias e associações, e já prometeu para este ano alterações ao atual regime.
Recorde-se que os condomínios têm pedido que seja solicitada a sua autorização para que possa ser instalada no imóvel uma unidade de alojamento local. Embora o tema não seja consensual, isso poderá vir a criar entraves ao alojamento.
A Associação Nacional de Proprietários tem vindo a chamar a atenção para o facto de o alojamento local não ser habitação, mas sim uma forma de hotelaria. Como tal, deve ser visto “como uma atividade económica e, portanto, deve ser classificado como tal”.