Pois é. Os amigos do sistema, os democratas das liberdades, dos direitos humanos, do politicamente correto e os mentirosos ao seu serviço em todo o mundo assistiram impávidos e serenos à ação de Barack Obama durante os seus oito anos de mandato. Entre 2009 e 2015, o seu governo deportou mais de 2,5 milhões de imigrantes ilegais. Foi mesmo o presidente que fez mais deportações na história dos Estados Unidos. Alguns grupos de ativistas ligados aos imigrantes chegaram a chamar-lhe o “chefe da deportação”. Nesses anos não se ouviram gritinhos indignados, discursos eloquentes sobre os perigos que tais atos representavam para a democracia e para os valores americanos, não se viram manifestações histéricas nos aeroportos e muito menos campanhas na comunicação social contra um presidente que estava a expulsar cidadãos que viviam e trabalhavam ilegalmente nos EUA.
Pois não. E a verdade é que fizeram muito bem em estar caladinhos. Um país civilizado, um Estado de direito, uma democracia a sério não pode permitir que tal aconteça em nenhuma circunstância. Expulsar ilegais é um dever. Não é nenhum crime.
Também em 2011, o mesmo Obama baniu os refugiados iraquianos por seis meses. A justificação dada na altura teve a ver com a descoberta pelo FBI de terroristas da Al-Qaeda no Kentucky. E baniu muito bem. A segurança de um país e dos seus cidadãos exige medidas duras e, muitas vezes, radicais. Também dessa vez não se ouviram procuradores a contestar a medida, grupinhos aos saltos nos aeroportos, reportagens lancinantes das televisões sobre os dramas de muitas famílias iraquianas que sonhavam com os EUA, protestos de dirigentes europeus e dúvidas sérias sobre os princípios e os valores de Obama.
Muito menos se disse que o então presidente era xenófobo por estar a atacar os cidadãos de um país maioritariamente muçulmano. Pois é.
Agora falemos de Trump e da sua decisão de suspender por 90 dias o visto de entrada nos EUA a cidadãos de sete países, a saber, Afeganistão, Síria, Somália, Líbia, Iémen, Iraque e Irão, e por 120 dias a entrada de refugiados. O espetáculo montado nos EUA e na Europa mostra bem que esta gente, desesperada com a derrota dos democratas, de Obama e de Clinton no 8 de novembro de 2016, despreza a democracia, despreza o povo e a sua vontade e não olha a meios para tentar atingir os seus fins. Os países afetados pela decisão de Trump, com exceção do Irão, que representa uma ameaça para o mundo e para Israel em particular, não são Estados, são territórios em guerra civil há anos e anos. Líbia, Síria e Iémen foram destruídos pela Primavera Árabe tão cantada no Ocidente e tão apoiada por Obama. A Somália é terra de piratas e terroristas e o Afeganistão e o Iraque, fruto de muitos erros cometidos no passado pelos EUA, Europa e NATO, têm governos fracos, sem capacidade de tomarem conta das fronteiras e de vastas zonas do seu território.
A algazarra nos EUA e na Europa não tem nada a ver com direitos humanos, defesa dos imigrantes, luta contra a xenofobia ou a favor de outros valores tão gritados nestes dias. Tem a ver unicamente com a recusa desses grupos em aceitarem a democracia e o resultado das eleições. A grande maioria dos países muçulmanos não foi afetada nem consta da lista que Trump herdou de Obama. Para os mentirosos e também para os ignorantes, basta recordar que o Paquistão, Indonésia, Arábia Saudita, Turquia, Marrocos, Tunísia, Egito, Jordânia, Malásia e tantos outros não foram visados pela suspensão de vistos durante 90 dias.
As mentiras visam apenas esconder o que vai na alma desta gentinha. Por cá, nesta paróquia tacanha de mentirosos e indignados de pacotilha, houve uma alma que soube explicar de forma cristalina o que está na origem desta histeria coletiva. Chama-se Miguel Sousa Tavares, não é populista, não consta que seja estúpido e costuma dizer o que lhe vai na alma. Agora parem, escutem e vejam o que é esta gentinha: “Quando a vontade do povo é qualquer coisa que vai contra aquilo que nós temos como o bem comum e as melhores ideias, não é preciso ceder à vontade do povo, é preciso resistir à vontade do povo.” É isso. O comentador da SIC disse alto o que esta gentinha pensa ou diz muito baixinho. Esta gentinha anda a tentar resistir à vontade de um povo. Mais do que isso: anda a tentar mentir ao povo, aqui, na Europa e nos EUA.
E como é preciso resistir ao povo, o melhor é mentir-lhe as vezes necessárias e suficientes, esconder-lhe informação e, se for preciso, proibir-lhe o voto, tirar-lhe a democracia e a liberdade até meterem na cabeça as tais melhores ideias desta gentinha que se julga iluminada e se imagina a vanguarda sabe-se lá do quê. São estes os democratas que temos. É por isso que o povo está a resistir a esta gentinha, a este sistema, a estes imbecis e aos lacaios mentirosos que só aceitam a democracia e o voto popular quando ganham as eleições com as tais melhores ideias. Foi assim no Brexit, está a ser assim nos EUA e poderá ser assim na Holanda, França e Alemanha. Mas como estão a perder em toda a linha, o desespero da derrota está a estalar o verniz democrático de uma gentinha que só gosta da democracia quando ganha nas urnas.