Barões ou xerifes?


A maioria dos ditos barões não entram numa sede do PSD há anos. Não se fazem eleger para um congresso há décadas, não têm base de apoio real no partido e muitos deles acabaram impiedosamente escorraçados pelos militantes comuns


Se pesquisar no Google a expressão “barões contra Passos” verá que a expressão tem sido recorrentemente usada pelos diversos órgãos de comunicação social desde o já longínquo ano de 2009 – nessa altura, por ocasião da candidatura de Passos Coelho à liderança do PSD.

Se fizermos o exercício de nos abstrairmos dos amores ou desamores que Passos Coelho possa causar-nos, facilmente chegamos à conclusão de que a ascensão deste “plebeu” na vida pública foi sempre esporeada por um conjunto de homens e mulheres bem instalados na vida que dominam, com uma certa conivência da imprensa, o espaço mediático nacional e que insistentemente nos fazem crer que Passos é um incapaz ou, como há dias ficámos a saber, um cata-vento.

Na verdade, todos temos uma certa culpa e responsabilidade nisso. A comunicação social, porque se alimenta do imediato e, em certa medida, da inverdade. Denzel Washington, ator e ativista norte- -americano, dizia há dias, e com muita razão, sobre noticias que davam conta de uma alegada alteração de apoio entre Clinton e Trump, mais ou menos o seguinte: “Se não lermos noticias, não estamos informados; se as lermos, estamos mal informados. Qual é o efeito a longo prazo de demasiada informação? Um dos efeitos é ser-se o primeiro. Já nem é ser-se verdadeiro. Qual é a vossa (OCS) responsabilidade então? Dizer a verdade! Vivemos numa sociedade em que apenas interessa ser-se primeiro. Não importa quem se magoa, nem quem se destrói, nem se se é verdadeiro. Apenas digam. Vendam.”

Quem não se lembra das recentes notícias sobre a recolha de assinaturas para um congresso extraordinário do PSD, noticiado com grande euforia e expectativa, sem sequer perceberem, ou até lerem os estatutos do partido, que o líder do PSD já não é eleito em congresso e que, para se depor Passos Coelho, só era possível uma de duas vias: ou ele demitir-se ou perder em eleição direta, em março de 2018.

E nós, políticos e atores sociais, também somos responsáveis. Porque compramos, acreditamos e alimentamos este círculo vicioso de informação e contrainformação a troco de vaidades pessoais e ganhos políticos efémeros que em nada se compaginam com a verdade real e com as motivações que deviam nortear a nossa ação.

Mas, afinal, o que é ser-se barão? É defender intransigentemente o legado dos fundadores da matriz ideológica do PSD? É ter uma proximidade e exercer uma magistratura de influência junto do eleitorado e dos militantes do PSD como se de verdadeiros guardiães dos anseios do povo social-democrata se tratassem?

Deveria ser, mas não é. A maioria dos ditos barões não entra numa sede do PSD há anos. Não se fazem eleger para um congresso há décadas, não têm base de apoio real no partido (muitos deles acabaram impiedosamente escorraçados pelos militantes comuns), não estão disponíveis para se conotar publicamente com o PSD, nem em desafios eleitorais nem tão-pouco no apoio público aos sucessivos governos do PSD, em especial este último, que retirou Portugal da bancarrota.

Passos será sempre preso por ter cão e preso por não ter. Reduziu o défice, em quatro anos, de 11% para 4%, mas não fez o que era preciso. Pôs o país a crescer 1,6% em 2015 (hoje cresce menos), mas para os barões era insuficiente. Não dá a mão ao governo geringonceiro na TSU porque entende que a divergência e as fraquezas devem ser expostas para que se perceba a fragilidade de tudo isto, mas é um cata–vento e trai a matriz social-democrata.

Mas, no fundo, há uma coisa que Passos não é nem faz. Não pertence a um grande escritório de advogados, deambulando pelos corredores das negociatas do centrão onde ganham e perdem sempre os mesmos; não é pago para falar mal de tudo e de todos na comunicação social; não troca o mandato que o povo lhe conferiu para ir servir os interesses da banca e das consultoras do regime; e não contribui para que se deponham líderes da oposição para lhes dificultarem o trabalho e arredarem–nos do poder, para que tudo volte a ser como era. É isto que os barões têm feito.

No sistema de títulos britânico, ser barão provém de uma distinção de lealdade ao monarca (ou ao reino), geralmente sob a forma de serviço militar. Pela definição nobiliárquica, logo se percebe que barões não são. Quando muito, serão xerifes, de Nottingham, por certo.