Sócrates prepara regresso, Costa afasta-se

Sócrates prepara regresso, Costa afasta-se


Sócrates desdobra-se em iniciativas e há socialistas que, em surdina, o apoiam cada vez mais. Mas a direção do PS evita a colagem ao ex-primeiro-ministro ao mesmo tempo que tenta desdramatizar as suas intervenções públicas.


Ontem, a ausência de notáveis na conferência dada por Sócrates foi um sinal de que a direção do PS quer evitar colagens a Sócrates. Mas o ex-primeiro-ministro não deixou que o tema que lhe deram – política externa – o impedisse de fazer uma crítica à lei do Governo de António Costa que pretende permitir ao Fisco o acesso a dados de contas superiores a 50 mil euros, alertando para a tentação de devassa que pode estar associada a essa medida.

A conferência sobre Política Externa e Globalização que Sócrates deu ontem na FAUL não é, porém, um evento isolado. Esta semana, o i avançou que o ex-primeiro-ministro reuniu os mais próximos para definir estratégias para voltar aos palcos políticos. 

A convocatória para o jantar desta semana vincava que se tratava de uma reunião restrita (foram convidados menos de 20 pessoas) e que a ideia era trocar opiniões sobre as próximas iniciativas públicas do ex-primeiro-ministro. 

No PS, Sócrates continua, porém, a ser um ativo tóxico. Para evitar leituras, o Departamento das Mulheres Socialistas da Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) e a JS Lisboa não convidou sequer António Costa para a Universidade de Verão onde Sócrates falou ontem.

A demarcação é clara e na Concelhia de Lisboa caiu mal até a forma como a notícia da participação do ex-primeiro-ministro no evento da JS Lisboa ficou colado à estrutura local. Nem a concelhia nem a Federação da Área Urbana de Lisboa, liderada por Marcos Perestrello, desejavam ficar associadas a um convite para o regresso de Sócrates às atividades regulares do Partido Socialista.

Oficialmente, o PS defende que é normal que quem já foi um dos atores políticos mais ativos do país regresse ao palco mediático, mas sem que isso possa ser lido como uma aproximação da direção do partido a José Sócrates. 

O assunto é tratado com pinças e tornou-se ainda mais delicado depois de o Ministério Público pedir um novo prolongamento do prazo para proferir uma acusação. Se até agora já havia alguns indefectíveis que reclamavam a necessidade de demonstrar apoio a Sócrates, o arrastar do processo sem acusação formada veio fazer com que mais socialistas sentissem que está na altura de uma reaproximação ao ex-primeiro-ministro. 

«Há muita gente que, em surdina, acha que se deve apoiar José Sócrates. São cada vez mais no PS. Muitos deles autarcas do interior, onde Sócrates é muito popular pelas obras que fez», comenta uma fonte próxima do ex-primeiro-ministro.

Ana Gomes, a única socialista que veio a público atacar o convite a Sócrates, acredita, aliás, que há neste acontecimento um sinal claro de que alguns socialistas querem recuperar José Sócrates politicamente. «Vejo o convite com preocupação, porque vem de setores que acham que a imagem de José Sócrates é recuperável. E eu acho que ela é extremamente danosa para o PS e para o país, e tem de ser o PS o primeiro a reconhecê-lo e não o contrário», disse a eurodeputada à TSF.

PS desdramatiza

Depois de ser público que António Costa não iria ao evento das Mulheres Socialistas, o dirigente do PS Porfírio Silva veio, em declarações à Lusa, tentar tirar gás à polémica sobre aquilo que é, para todos os efeitos, o regresso de Sócrates aos eventos do partido. «Acho isso perfeitamente normal e irei se puder», comentou o socialista, recusando classificar a participação de Sócrates como um regresso «oficial» às atividades do PS.

A mesma tentativa de despolitização do evento foi feita por Susana Amador, a presidente do Departamento Federativo das Mulheres Socialistas da Federação de Lisboa do PS, responsável pela ideia de convidar o antigo líder do PS. «Não é um convite político», frisou ao DN, notando que a estrutura que dirige «tem autonomia»  e afastando, assim, a direção do partido da decisão de ter José Sócrates como conferencista. «Lamento que tenha gerado esta polémica», dizia em reação à notícia do i sobre a participação do ex-primeiro-ministro.

Desde que Sócrates foi preso que António Costa quis separar o PS da Operação Marquês e afastou-se do ex-primeiro-ministro, que não perdoou a falta de defesa que encontrou na direção do PS e sempre sustentou a teoria da cabala: a justiça ‘persegue-o’ por motivos políticos.

Sócrates anda por aí

Apesar de todas as iniciativas, uma fonte próxima de José Sócrates descarta a ideia de que possa estar em preparação uma candidatura às autárquicas de 2017. «Sócrates quer mostrar que está cá e que, como ele diz, tem todos os direitos políticos intactos. Isso não quer dizer que esteja a pensar numa candidatura a um cargo qualquer. A política não é só isso», afirma a mesma fonte.

Certo é que Sócrates vai mesmo andar por aí. Depois da conferência de ontem, tem hoje um almoço na Expo com apoiantes, para o qual foram convidados muitos socialistas. É a segunda vez que reúne num almoço os seus apoiantes, depois de ter juntado cerca de 400 pessoas num almoço na FIL.

Nos últimos meses têm sido, de resto, várias as iniciativas deste tipo. José Sócrates tem  andado pelo país em almoços e jantares, muitos deles no interior, onde tem sentido apoio suficiente para alimentar a ideia de que pode voltar à política, mesmo que não esteja definido como.