Depois de muita especulação nos últimos tempos, parece que a Comissão Europeia vai decidir hoje se aplica imediatamente ou se adia por três semanas sanções a Portugal. Esta questão levantou no país uma curiosa unanimidade de posições. O Presidente da República, o governo e todos os partidos, mesmo aqueles que nunca estão de acordo sobre coisa nenhuma, já se pronunciaram em uníssono contra as sanções. O mais radical foi o Bloco de Esquerda, que pela voz de Catarina Martins, na sua convenção, considerou as sanções uma declaração de guerra da Comissão a Portugal. Mas a prometida reação bélica do Bloco limitou-se, afinal, a uma pífia proposta de referendo ao Tratado Orçamental, proposta essa que suscitou a hilaridade geral, incluindo nos partidos da geringonça. Mais realista, o primeiro-ministro limita–se a escrever uma carta a Juncker onde, em lugar de uma declaração de guerra, surge de corda ao pescoço, apelando à misericórdia da Comissão para evitar as sanções.
Há um sério problema em Portugal que é considerar que os compromissos assumidos não são para cumprir e que haverá sempre a possibilidade de os incumprir sem consequências. Quem não se lembra de António Costa ter garantido que iria haver uma “leitura inteligente” do Tratado Orçamental? Foi assim que Portugal aceitou esse tratado, sabendo de antemão que nunca iria ter condições para o cumprir. Na verdade, Portugal nem sequer consegue cumprir as regras do Mecanismo Europeu de Estabilidade, quanto mais as do Tratado Orçamental. Só que, infelizmente, há muita gente na Comissão que insiste em fazer uma leitura estúpida dos tratados, insistindo em que as regras são para cumprir, especialmente se estiverem em causa Portugal e Espanha. Porque se estiver em causa a França, já os tratados passam a ter uma leitura clarividente e não há sequer a sombra de sanções.
A União Europeia começa a parecer-se seriamente com o “Animal Farm”, de George Orwell, onde todos eram iguais, mas havia uns mais iguais que outros. Não admira, por isso, que uns tenham sanções e outros não. Mas talvez Portugal devesse também ter pensado um bocado antes de ratificar tratados que não está em condições de cumprir. Não é a pedinchar facilidades que o país consegue ter boa imagem internacional.
Professor da Faculdade de Direito de Lisboa
Escreve à terça-feira