O Brexit e o BExit


Europopulismo, eurofobia, eurocídio. Chamem-lhe o que quiserem. Catarina Martins e o seu BE estão no mesmo saco de Marine Le Pen, Geert Wilders e Nigel Farage


Esta semana houve dois “exits” da cena Europeia. Um do Reino Unido. Outro do Bloco de Esquerda. O primeiro está por confirmar. O segundo revelou-se no Pavilhão do Casal Vistoso. Mais duas ou três notas sobre os factos internacional e nacional da semana: o Brexit e o BExit.

O Brexit. A eurocracia está a pagar na mesma moeda a bravata dos “leavers” contra Bruxelas. O Parlamento Europeu exigiu ontem a aplicação imediata dos mecanismos de saída. Jean-Claude Juncker também quer um divórcio rápido e a maioria dos líderes políticos carregaram excessivamente nas tintas. É um revanchismo inútil e muito prejudicial à Europa. Essencialmente por duas razões. Primeiro, porque não é a separação entre Londres e Bruxelas que vai extirpar o Reino Unido da sua natureza europeia. Londres continua a ser um pilar da civilização e da ordem europeia. Escolheu um caminho diferente, é verdade, mas um caminho que não é contra a Europa, só não é com a Europa. Por não concordarmos, não significa que tenhamos, daqui para a frente, de tratar de todos os assuntos com acrimónia e azedume. O referendo da semana passada ficará registado como um dia triste para a Europa e para os europeus. É triste ver partir os amigos, mas há que respeitar essa opção e, sobretudo, mantê-los o mais perto possível. Segundo, não é sequer líquido que os britânicos venham mesmo a confirmar a separação acionando o famoso artigo 50.o do Tratado de Lisboa. As ondas de choque do referendo deixaram conservadores e trabalhistas feitos num oito e ninguém, especialmente do lado dos “brexiters”, sabe qual é o passo seguinte a dar. Boris Johnson, o putativo candidato ao n.o 10 de Downing Street e figura de proa da campanha do “leave”, já disse que não há pressa para nada. As lideranças políticas estão de cabeça perdida, a libra afunda, as agências de notação sacaram o dourado AAA a Londres, as forças centrífugas ameaçam a integridade do Reino Unido e as ruas pedem um segundo referendo. E a tradição europeia mostra que isso não é uma impossibilidade. Como sublinhava Gideon Rachman na edição de ontem do “FT”, olhando para a experiência de choques referendários na União, a história do Brexit está longe de estar escrita. “Em 1992, os dinamarqueses rejeitaram o Tratado de Maastricht, em 2001 e 2008, os irlandeses chumbaram, respetivamente, o Tratado de Nice e o de Lisboa.” Depois de algumas concessões de Bruxelas, o que aconteceu? “Houve um segundo referendo.” Veremos o que nos reservam as cenas dos próximos episódios.

O BExit. A convenção bloquista foi um tratado sobre a soberba da extrema–esquerda portuguesa. Em quase todas as intervenções, sobretudo nas de Catarina, ouvimos falar das conquistas do BE na governação, num plural majestático que nunca incluiu os parceiros da esquerda, PS e PCP. Catarina teve a virtude de ser muito explícita no partido que mais define o rumo dos acontecimentos. Esse partido não é obviamente o do manietado António Costa, nem o do fragilizado Jerónimo de Sousa. Quem põe e dispõe do governo é o Bloco de Esquerda. Catarina, a fazedora de reis à esquerda, tem-se na conta de czarina do regime. Francisco Louçã, farol ideológico da esquerda radical por essa Europa fora e cérebro da coligação doméstica, colocou a questão ainda mais em perspetiva: é o PSD o “adversário imediato da grande disputa do BE”. Claro que é! Com o PS no papo, faz todo o sentido apontar o maior partido da oposição como alvo. “Tenham cuidado que o melhor ainda está para vir”, prosseguiu Louçã, como que pedindo aos socialistas portugueses que olhem para os destroços do PASOK e, em certa medida, do PSOE. Para além da tática, a principal nota ideológica que sai da convenção é a declaração de guerra à União Europeia.    

Europopulismo, eurofobia, eurocídio. Chamem-lhe o que quiserem. Catarina Martins e o seu BE estão no mesmo saco de Marine Le Pen, Geert Wilders e Nigel Farage. Quando o assunto é Europa, os extremos tocam-se: eles convergem no objetivo de derrubar o maior espaço de liberdade, paz e prosperidade alguma vez criado pelas nações. Enquanto uns querem erguer fronteiras de arame farpado, outros esperam que por entre os escombros emerja uma nova Albânia.

O BE quer arrastar Portugal para experimentalismos suicidas. Está-se marimbando para os credores, tanto quanto se marimba para os portugueses. Naquelas cabecinhas, a única coisa que importa é a implementação dogmática e científica da sua ideologia. Mesmo que não haja um país ou um povo para as testar. Felizmente, os eleitores já não caem no logro daqueles que dizem falar em seu nome. Em Espanha, o Podemos não pode. Na Grécia, o Syriza pode cada vez menos. Também em Portugal está para chegar o dia em que os eleitores remetem o BE à irrelevância que o seu projeto político merece. 


O Brexit e o BExit


Europopulismo, eurofobia, eurocídio. Chamem-lhe o que quiserem. Catarina Martins e o seu BE estão no mesmo saco de Marine Le Pen, Geert Wilders e Nigel Farage


Esta semana houve dois “exits” da cena Europeia. Um do Reino Unido. Outro do Bloco de Esquerda. O primeiro está por confirmar. O segundo revelou-se no Pavilhão do Casal Vistoso. Mais duas ou três notas sobre os factos internacional e nacional da semana: o Brexit e o BExit.

O Brexit. A eurocracia está a pagar na mesma moeda a bravata dos “leavers” contra Bruxelas. O Parlamento Europeu exigiu ontem a aplicação imediata dos mecanismos de saída. Jean-Claude Juncker também quer um divórcio rápido e a maioria dos líderes políticos carregaram excessivamente nas tintas. É um revanchismo inútil e muito prejudicial à Europa. Essencialmente por duas razões. Primeiro, porque não é a separação entre Londres e Bruxelas que vai extirpar o Reino Unido da sua natureza europeia. Londres continua a ser um pilar da civilização e da ordem europeia. Escolheu um caminho diferente, é verdade, mas um caminho que não é contra a Europa, só não é com a Europa. Por não concordarmos, não significa que tenhamos, daqui para a frente, de tratar de todos os assuntos com acrimónia e azedume. O referendo da semana passada ficará registado como um dia triste para a Europa e para os europeus. É triste ver partir os amigos, mas há que respeitar essa opção e, sobretudo, mantê-los o mais perto possível. Segundo, não é sequer líquido que os britânicos venham mesmo a confirmar a separação acionando o famoso artigo 50.o do Tratado de Lisboa. As ondas de choque do referendo deixaram conservadores e trabalhistas feitos num oito e ninguém, especialmente do lado dos “brexiters”, sabe qual é o passo seguinte a dar. Boris Johnson, o putativo candidato ao n.o 10 de Downing Street e figura de proa da campanha do “leave”, já disse que não há pressa para nada. As lideranças políticas estão de cabeça perdida, a libra afunda, as agências de notação sacaram o dourado AAA a Londres, as forças centrífugas ameaçam a integridade do Reino Unido e as ruas pedem um segundo referendo. E a tradição europeia mostra que isso não é uma impossibilidade. Como sublinhava Gideon Rachman na edição de ontem do “FT”, olhando para a experiência de choques referendários na União, a história do Brexit está longe de estar escrita. “Em 1992, os dinamarqueses rejeitaram o Tratado de Maastricht, em 2001 e 2008, os irlandeses chumbaram, respetivamente, o Tratado de Nice e o de Lisboa.” Depois de algumas concessões de Bruxelas, o que aconteceu? “Houve um segundo referendo.” Veremos o que nos reservam as cenas dos próximos episódios.

O BExit. A convenção bloquista foi um tratado sobre a soberba da extrema–esquerda portuguesa. Em quase todas as intervenções, sobretudo nas de Catarina, ouvimos falar das conquistas do BE na governação, num plural majestático que nunca incluiu os parceiros da esquerda, PS e PCP. Catarina teve a virtude de ser muito explícita no partido que mais define o rumo dos acontecimentos. Esse partido não é obviamente o do manietado António Costa, nem o do fragilizado Jerónimo de Sousa. Quem põe e dispõe do governo é o Bloco de Esquerda. Catarina, a fazedora de reis à esquerda, tem-se na conta de czarina do regime. Francisco Louçã, farol ideológico da esquerda radical por essa Europa fora e cérebro da coligação doméstica, colocou a questão ainda mais em perspetiva: é o PSD o “adversário imediato da grande disputa do BE”. Claro que é! Com o PS no papo, faz todo o sentido apontar o maior partido da oposição como alvo. “Tenham cuidado que o melhor ainda está para vir”, prosseguiu Louçã, como que pedindo aos socialistas portugueses que olhem para os destroços do PASOK e, em certa medida, do PSOE. Para além da tática, a principal nota ideológica que sai da convenção é a declaração de guerra à União Europeia.    

Europopulismo, eurofobia, eurocídio. Chamem-lhe o que quiserem. Catarina Martins e o seu BE estão no mesmo saco de Marine Le Pen, Geert Wilders e Nigel Farage. Quando o assunto é Europa, os extremos tocam-se: eles convergem no objetivo de derrubar o maior espaço de liberdade, paz e prosperidade alguma vez criado pelas nações. Enquanto uns querem erguer fronteiras de arame farpado, outros esperam que por entre os escombros emerja uma nova Albânia.

O BE quer arrastar Portugal para experimentalismos suicidas. Está-se marimbando para os credores, tanto quanto se marimba para os portugueses. Naquelas cabecinhas, a única coisa que importa é a implementação dogmática e científica da sua ideologia. Mesmo que não haja um país ou um povo para as testar. Felizmente, os eleitores já não caem no logro daqueles que dizem falar em seu nome. Em Espanha, o Podemos não pode. Na Grécia, o Syriza pode cada vez menos. Também em Portugal está para chegar o dia em que os eleitores remetem o BE à irrelevância que o seu projeto político merece.